O Psicólogo Responde é uma rubrica sobre saúde mental para ler todas as semanas. Tem comentários ou sugestões? Escreva para opsicologoresponde@cnnportugal.pt
Passávamos uma semana (pelo menos) a arejar, limpar, esfregar, lavar, arear, varrer, polir, dar brilho e ... finalmente embelezar, cozinhar, servir, comer e, novamente, lavar, secar e arrumar.
A Páscoa era o tempo da primavera, das ruas secas e mais limpas, das flores nos jardins e do compasso que entrava em casa e nos benzia a todos.
Lembro-me da reverência, de estar bem-vestida com a roupa da Páscoa, de tudo cheirar bem. Lembro-me que à minha volta, na minha família, no meu bairro, na minha cidade, era mais ou menos assim para todos.
Hoje, o tempo de Páscoa já não será assim tão uniforme.
E já não será só uma diferença entre Norte e Sul e entre cidades de litoral ou interior. Hoje, dentro da mesma família o tempo de Páscoa será vivido de formas muito distintas. Pode ser uma semana na neve, ou no Algarve, ou mais longe a apanhar sol (a sério), ou ainda o Compasso e a celebração religiosa, ou mais um motivo para juntar (alguma) família e comer cabrito e folar. Talvez ainda por aí haja algumas pessoas a fazer “limpezas a fundo” e haverá outras a comprar “roupa nova”.
A Páscoa não é o Natal. Não tem essa agregação, essa unidade que nos leva a todos fazer quase o mesmo. Mas é um tempo que, com estas discrepâncias, pode ser difícil de gerir, primeiro porque cada um terá uma expectativa diferente da dos outros, e depois porque pode trazer ambivalência.
A capacidade de imaginarmos um cenário está tão embrenhada no nosso funcionamento, que muitas vezes nem a consideramos como imaginação ou expectativa. Pensamos para a frente e consideramos intuitivamente que é um plano ou uma tarefa a realizar.
Acontece que quando esse “plano” ou “tarefa” envolve outra(s) pessoas(s), que por acaso até nos esquecemos de incluir nas nossas cogitações, então isso é na verdade uma expectativa, porque é apenas “o que pensamos que vai acontecer”.
O que depois acontece na realidade é muitas vezes bem diferente, e é essa disparidade que pode trazer sentimentos de desânimo, ansiedade, irritação, de tristeza ou culpa.
Já a ambivalência é a experiência, simultânea, de sentimentos positivos e negativos em relação a um mesmo acontecimento. Pode acontecer quando, por exemplo, pensamos “gosto tanto de ter a família toda reunida, mas fico tão cansada a cozinhar e a arrumar tudo”, ou “estes dias de férias vão saber tão bem, mas vou gastar tanto dinheiro”.
Manter esta ambivalência durante muito tempo pode trazer desconforto e até sofrimento, sobretudo quando adiamos a sua resolução ou evitamos o confronto com a tomada de decisão. Porque não é completamente má mantemos a situação e porque não é completamente boa sentimo-nos mal.
Ainda que não pareça, é mais fácil gerir expectativas e resolver ambivalência do que gerir irritação ou culpa. É mais fácil, e também mais saudável para si e para as suas relações. Deixamos por isso algumas ideias:
Sugestões
- Comunique o mais cedo possível aquilo que está a pensar. E mais cedo, significa mesmo mais cedo. Não espere por “quando estiver com ela, porque isto não se diz ao telefone”; ou não se desculpe com “não vale a pena dizer já porque já sei que vai ficar chateado”; ou “ainda não tenho a certeza se vou conseguir tirar uns dias de férias, quando tiver digo”. Envolva as pessoas que estão direta ou indiretamente implicadas nesse plano logo desde o início.
- Seja realista. Não! Não vai conseguir estar em dois lados ao mesmo tempo. Negoceie com tempo e com clareza os dias e horas a que chega, a que vai embora e que pode ficar com os outros.
- Negoceie. E a negociação implica uma decisão. Negoceie consigo mesmo/a, ou com ou outros envolvidos. “Este ano é assim, no próximo é de outra forma”. “Não vamos estar no domingo de Páscoa, estamos antes ou depois”. “Preciso destas férias e por isso vou gastar menos dinheiro em...”. Decida e feche o assunto.
- Planeie. De preferência em conjunto e com a maior antecedência possível. Por isso, se este ano não pensou bem no tempo de Páscoa, pode aproveitar para pensar já no próximo ano. Para o ano vai ser no dia 20 de abril. É provável que esteja mais calor e até dê para fazer praia no Algarve.
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