O Psicólogo Responde: Como identificar que as crianças têm uma baixa autoestima?
Crianças

O Psicólogo Responde: Como identificar que as crianças têm uma baixa autoestima?

O Psicólogo Responde é uma rubrica sobre saúde mental para ler todas as semanas. Tem comentários ou sugestões? Escreva para opsicologoresponde@cnnportugal.pt

Isabel Lage
Psicóloga e membro da direção da Ordem dos Psicólogos Portugueses

“Não tem autoestima!” ou “Tem uma autoestima muito fraquinha” são frases que ouço a pais ou professores quando falam, com preocupação, acerca dos seus filhos ou alunos.

Falam com preocupação, pois associam essa baixa autoestima a comportamentos inseguros, a sentimentos de ansiedade e a pensamentos demasiado críticos acerca de si e do que conseguem ou não conseguem fazer. Não arriscam. Receiam mais do que confiam. Hesitam e, talvez por isso, falham mais e sofrem mais.

E este será o motivo para,  além de saber como identificar as crianças que têm baixa autoestima, interessar também perceber porque é importante fazê-lo.  

O que é autoestima?

A autoestima, como aliás a palavra indica, é a estima que se tem acerca de si próprio/a. É por isso uma perceção, uma subjetividade construída com os pensamentos e sentimentos referentes ao que somos (ou não somos).

Diz-se que é baixa quando é mais negativa, ou indecisa, do que serão as reais características ou competências dessa pessoa.

Mas afinal de onde vem essa perceção?

Essa perceção de si é construída (sublinhemos CONSTRUÍDA) no contexto que resulta da complexidade de interações com o mundo que nos rodeia: por exemplo,  da qualidade das relações com os outros, das experiências individuais e no grupo, da cultura e dos padrões de comportamento, da linguagem e dos modelos que são usados como referência.

Ora, o “si”, ou self, ou identidade, não é um conceito unitário. Não é uma imagem monocromática. É antes um ramalhete composto pelas flores que vamos colhendo no caminho que vamos percorrendo.

Muitas dessas flores serão até oferecidas ou “colocadas” pelas pessoas que nos rodeiam, quando começam a dar um nome a alguns dos nossos comportamentos, gestos ou características mais ou menos salientes.

Por exemplo, passamos a ser simpáticos, ou alegres, ou distraídas, ou carinhosas, ou estudiosas, ou trapalhonas, ou audazes, ou irritantes, ou inseguros ... ou “sem autoestima”.

Estão a ver?!

Passamos assim, muitas vezes, a ser antes de conseguir saber ou perceber realmente o que somos.

E como é que algumas pessoas têm alta e outras, baixa autoestima?

Sendo uma construção, não é necessariamente ajustada ao que de facto são as capacidades ou características pessoais.

Esse viés (ou distorção) pode acontecer no sentido positivo – “Eu consigo fazer tudo” – ou no sentido negativo – “Eu não consigo fazer nada”.

Quando o viés é negativo, pode influenciar o nível de investimento e compromisso (“nem vale a pena tentar, porque já sei que não vai correr bem”); o bem-estar (a ansiedade pode aumentar para níveis difíceis de gerir); e o desempenho (é comum haver bloqueios durante os testes, por exemplo).

Há alguma predisposição de temperamento ou personalidade que pode contribuir para essa leitura distorcida de alguns acontecimentos. Assim, um erro ou um reparo de alguém, pode ser para algumas crianças uma coisa menor e para outras será a confirmação que não são capazes e que não valem nada.

O resultado pode ser mesmo abaixo do que seria esperado ou desejado, reforçando ainda mais a ideia que “Eu não consigo fazer nada”. E esta espiral negativa pode ser muito difícil de interromper pela própria criança.

O que sabemos é que a forma como os adultos reagem nesses momentos pode ser essencial para que essa espiral se quebre. O que dizemos, como reagimos, como recebemos as preocupações das crianças pode ajudar a corrigir essa distorção. 

Sugestões

  • Ouça primeiro e responda depois

Isto pode ser mais fácil de dizer do que fazer, mas se conseguir vai ter um impacto muito importante.

Dê tempo para que a criança fale sobre o que a aflige e dê-lhe espaço para que sinta que essa preocupação é legítima, válida e importante. Se começamos logo com “E isso é um problema?!” ou “Isso resolve-se facilmente!” estamos, de forma contraproducente, a reforçar-lhe a ideia que não foi de facto capaz pois nem pensou naquela forma de resolver.

  • Fale das características positivas

Fale muito, muitas vezes e de preferência em momentos não associados às dúvidas. Assim, em vez de tentar refutar as hesitações com “claro que és capaz... tu és tão esperta!”, privilegie os momentos de conversa solta. As viagens de carro podem ser ótimas para lembrar esses momentos como “Estava aqui a lembrar-me daquela vez em que entraste na piscina e duas semanas depois já estavas quase a nadar! Estavas sempre tão atenta aos exercícios”.

  • Incentive e reforce os momentos de autonomia

Desde vestir, apertar os atacadores, andar de bicicleta, fazer os TPC, preparar a mochila, pôr a mesa, arrumar o quarto. Vá dando exemplos de como ao longo do tempo a criança foi sendo capaz de fazer cada vez mais tarefas e como estas se foram tornando mais fáceis.

  • Use uma linguagem positiva e evolutiva

Não apenas para se referir à criança, mas também a si e às outras pessoas. Prefira salientar os traços e os comportamentos positivos nas outras pessoas, mostrando como as pessoas podem mudar e conseguem fazer o que antes não conseguiam. “Eu antes não era capaz de fazer bolos, e agora até já saem muito bem. Até já me apetece fazer uma coisa mais complicada!”. Incentive a curiosidade e a vontade de experimentar.

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