O Psicólogo Responde: “Durmo mal. Pode ser sinal de depressão e ansiedade?”
Dormir, ansiedade, depressão. Ilustração: Adobe Stock. O Psicólogo Responde

O Psicólogo Responde: “Durmo mal. Pode ser sinal de depressão e ansiedade?”

O Psicólogo Responde é uma rubrica sobre saúde mental para ler todas as semanas. Tem comentários ou sugestões? Escreva para opsicologoresponde@cnnportugal.pt

Alexandra Antunes
Psicóloga e membro da direção da Ordem dos Psicólogos Portugueses

Dormir mal, ou mais especificamente, a insónia, é um dos sintomas que está, frequentemente, presente nas perturbações depressivas ou ansiosas e pode ser uma das causas para o surgimento de uma destas patologias. Não é raro recorrerem a consultas de psicologia indivíduos com sintomas depressivos e/ou ansiosos que, quando explorada a história clínica, encontram-se alterações do padrão do sono com meses e, às vezes, anos de evolução. Contudo, um problema de sono – “dormir mal” – não significa que estejamos perante uma perturbação, mas deve ser um sinal de alarme sempre que se prolonga no tempo ou vem acompanhado por outros sinais ou sintomas.

A promoção de hábitos de vida saudáveis é hoje uma preocupação nacional e internacional para a prevenção das mais variadas doenças, que não apenas as mentais, e “uma boa noite de sono” é sempre referido como essencial. Esta preocupação com o sono deve-se ao facto de ser durante este período que ocorrem processos cruciais ao adequado funcionamento do organismo. Destacam-se, por exemplo, a regulação hormonal e metabólica e a regeneração dos tecidos que são primordiais para que o despertar seja acompanhado por uma sensação de vitalidade e vigor. Na área dos processos cognitivos, sabe-se hoje que durante o sono ocorre a consolidação da memória.

Uma questão relevante é quantas horas por noite se deve dormir? A resposta varia de pessoa para pessoa e de acordo com a faixa etária (as crianças necessitam de mais horas de sono). Não há um número fixo, mas há orientações que apontam para um mínimo de 7/8 horas. Porém, esta não parece ser a realidade portuguesa e, arriscaria a afirmar, do mundo. Dados de 2019, pré-pandemia, da Sociedade Portuguesa de Pneumologia, indicavam que 32% dos portugueses tinham um mau sono, 40% sentiam dificuldade em estar despertos durante o dia e cerca de 46%, com idade superior a 25 anos, dormiam menos de 6 horas por dia (aquém do que seria desejado para um adulto). A estes dados devemos somar o consumo excessivo de fármacos para dormir pela população portuguesa e afirmar que os problemas de sono são uma dificuldade da nossa sociedade, com impacto direto na saúde das pessoas. É por isso determinante que se alerte, informe e oriente, promovendo um diagnóstico e intervenção precoces.

A que se deve estar atento quando surge um problema de sono? Há quatros questões a ter em conta e que contribuem para esclarecer a necessidade de obter ajuda especializada.

Primeiro, a duração do problema. Se ocorre há mais de um mês e três ou mais dias por semana já deve ser alvo de atenção. Segundo, a quantidade, qualidade e higiene do sono, isto é, o número de horas que dorme em média, de acordo com a idade, se o sono é reparador e quais as rotinas associadas à hora de dormir. Há situações em que a pessoa dorme o número de horas necessárias, mas acorda cansada e como se tivesse estado desperta. Se o número de horas é insuficiente, é importante perceber de que tipo de insónia se trata, ou seja, se é inicial (dificuldade em adormecer), intermédia (vários despertares) ou terminal (acordar muito cedo). Os hábitos no momento de ir para a cama e todas as condições associadas também devem ser tidas em atenção. Terceiro, a identificação da causa, sempre que possível, para os problemas de sono. Estas podem estar relacionadas com condições de vida (ex. trabalho por turnos, ter filhos bebés), com factores emocionais, mais ou menos traumáticos (ex. divórcio, problema relacional, a perda de um ente querido, acidente) e patologias físicas e psíquicas, que podem ou não estar diagnosticadas (ex. depressão, demência, roncopatia, doenças musculoesqueléticas).

Quarto e último, os sinais e sintomas associados à dificuldade em dormir (ex. cansaço durante o dia, tristeza, labilidade, irritabilidade fácil, problemas de atenção, concentração e memória, perda de motivação para as tarefas do dia a dia, diminuição dos contactos sociais, ansiedade elevada e muitas vezes sem razão, entre muitos outros).

Depois de esclarecidos todos estes factores será mais simples responder à questão que se coloca “Durmo mal. Pode ser sinal de depressão e ansiedade?”. Pode, efectivamente, ser sinal de umas destas perturbações, mas não necessariamente. Há muitas outras circunstâncias e patologias que têm como sintoma alterações do padrão do sono. Não restam dúvidas de que este é um problema de hoje e a que todos nós devemos não só estar atentos como cuidar. 

Sugestões

1. Siga o seu ritmo circadiano porque dessa forma está a respeitar as variações fisiológicas que ocorrem no organismo durante as 24 horas de um dia e que são essenciais para o seu funcionamento. Uma delas é a produção de melatonina, uma hormona essencial para dormir, e que ocorre quando o dia começa a escurecer.

2. Promova estilos de vida saudáveis e o autocuidado: procure ter uma alimentação saudável, pratique exercício físico de forma regular, reduza o consumo de bebidas alcoólicas e do tabaco, minimize o stress do dia a dia, fomente momentos de relaxamento e prazerosos diariamente, quebre a rotina.

3. Esteja atento à sua higiene de sono, ou seja, aos seus comportamentos e rotinas antes de dormir. O nosso organismo é como um motor que demora a arrefecer e por isso é essencial que o vá desligando nas horas anteriores ao momento de se deitar. Assim, é importante que:

  • mantenha um horário de sono regular;
  • não durma durante o dia (exceto no caso de crianças pequenas);
  • elimine estímulos visuais (uso de ecrãs) ou auditivos que interfiram com o sono, reduza o consumo de álcool e outras bebidas estimulantes;
  • utilize a cama para o momento de dormir;
  • evite praticar exercício físico à noite;
  • recorra à leitura que é um bom “medicamento para adormecer”;
  • procure não levar problemas para a cama (na almofada todos ficam maiores);
  • procure técnicas de relaxamento para induzir o sono.

Se as noites mal dormidas se prolongam no tempo, surgem vários dias na semana e estão acompanhadas por perda de energia, irritabilidade, ansiedade, tristeza, desmotivação, procure um profissional de saúde que ajudará a esclarecer o diagnóstico e a orientar para uma intervenção especializada.

 

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