O Psicólogo Responde é uma rubrica sobre saúde mental para ler todas as semanas. Tem comentários ou sugestões? Escreva para opsicologoresponde@cnnportugal.pt
Todos os dias tomamos decisões. O que vestimos, as atividades que realizamos ao longo do dia e o que comemos são alguns exemplos. As emoções desempenham um papel central na forma como decidimos, nomeadamente os alimentos que consumimos. Esta escolha ou tomada de decisão é, frequentemente, impulsionada por uma tentativa de compensação ou regulação emocional. Por exemplo, muitas pessoas tendem a consumir alimentos reconfortantes em resposta ao stress, ansiedade ou tristeza. Este tipo de consumo alimentar é por vezes designado por “fome emocional”, que é distinta da fome fisiológica. Ou seja, a necessidade surge como resposta a um estado emocional, muitas vezes desagradável (ansiedade, stress, tristeza, angustia), embora surja também associada a momentos prazerosos (satisfação, felicidade), como eventos sociais e celebrações (o Natal é um excelente exemplo).
Do ponto de vista neuropsicológico, a alimentação e as emoções estão interligadas através de vias neurais. Os alimentos podem afetar a libertação de neurotransmissores como a serotonina e a dopamina, que são fundamentais para a regulação do humor e da sensação de prazer e motivação. O cérebro possui, então, circuitos de recompensa que são ativados por estímulos agradáveis, incluindo, por exemplo, comida, sexo e drogas.
Quando comemos, especialmente alimentos ricos em açúcar, gordura ou sal, o cérebro liberta dopamina, que produz sensações de prazer. Este mecanismo é semelhante ao observado nas dependências, onde a substância ou comportamento viciante causa um aumento na libertação de dopamina. Com o tempo, assim como nas dependências, o corpo pode adaptar-se a essa elevação de dopamina, e tem como consequência a diminuição na sensação de recompensa e prazer. Isso pode resultar numa necessidade de consumir mais alimentos para alcançar o mesmo nível de satisfação, um padrão similar ao aumento da tolerância observado nas dependências.
Algumas pesquisas científicas sugerem que tanto fatores genéticos quanto ambientais influenciam a sensibilidade dos circuitos de recompensa do cérebro. Isto é, indivíduos com maior sensibilidade podem estar mais propensos a esta “fome emocional” e à compulsão alimentar. A ativação repetida desses circuitos de recompensa tem implicações para a saúde física e mental. Por exemplo, pode contribuir para o desenvolvimento de perturbações alimentares (anorexia e bulimia), perturbações de ansiedade, perturbações depressivas, obesidade, doenças cardio-vasculares, entre muitas outras relacionadas com o controlo de impulsos e a regulação emocional. Compreender estes mecanismos neurobiológicos é essencial para a identificação do problema e para o desenvolvimento de tratamentos mais eficazes da “fome emocional”.
Há que relembrar que nem sempre esta recompensa emocional evoluiu para um problema. Ela está presente em quase todas as pessoas. Ao longo de todo o ciclo de vida e na grande maioria das vezes é devidamente identificada e o próprio é capaz de agir através da modificação comportamental e de auto-controlo. Contudo, quando tal não acontece é muito importante recorrer a ajuda profissional e muitas vezes multidisciplinar, por exemplo, psicólogo e nutricionista.
Estratégias de intervenção psicológica, como a terapia cognitivo-comportamental e programas de mindfulness, são muitas vezes usadas para ajudar indivíduos a desenvolver uma relação mais saudável com a comida e a reconhecer e gerir as emoções de forma mais eficaz. É crucial a conscientização das conexões entre emoções e hábitos alimentares.
Em conclusão, a relação entre emoção e alimentação existe e é um campo de estudo vital, pois afeta profundamente a saúde mental e o bem-estar. O entendimento desta relação é essencial para abordar uma variedade de questões psicológicas e para a promoção da saúde e prevenção de doenças físicas e psíquicas.
Sugestões
- Conheça-se e identifique os seus gatilhos emocionais. Aprenda a conhecer-se e aos seus hábitos alimentares. Faça um diário onde regista o que comeu e como se sentiu. Identificar o comportamento alimentar, os alimentos que o confortam e associá-los a um estado emocional é fundamental para a mudança.
- Aprenda a desviar a atenção nos momentos de “fome emocional”. Quando surgir aquela sensação de urgência para comer faça por focar a sua atenção numa outra coisa, por exemplo, sair de casa, telefonar a um amigo, fazer um jogo, ouvir a sua música preferida, etc. Grande parte das vezes, ao desviar a atenção por cinco minutos faz com que o cérebro “se esqueça” daquela necessidade.
- Cuide de si todos os dias. O auto-cuidado é essencial para a promoção do bem estar físico e psicológico. Identifique atividades prazerosas, fomente relações sociais saudáveis, pratique exercício físico, faça escolhas alimentares equilibradas, mas que o satisfaçam, partilhe o que sente, ajuda a reduzir as emoções negativas.
- Procure ajuda profissional. Sempre que sentir que não tem controlo alimentar e/ou que apresenta sintomas físicos e/ou psíquicos descritos acima procure a ajuda de um profissional de saúde. Faça-o o mais precocemente possível para que o sucesso seja mais rápido e eficaz.
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