O Psicólogo Responde: Como decifrar o burnout?
Burnout

O Psicólogo Responde: Como decifrar o burnout?

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Cristina Pereira
Psicóloga e membro da direção da Ordem dos Psicólogos Portugueses

O burnout é um estado de exaustão emocional, mental e muitas vezes física provocado por stress prolongado ou repetido. Embora seja mais frequentemente causado por problemas no trabalho, também pode surgir em outras áreas da vida, como vida familiar, cuidado ou relacionamentos amorosos.

É a sensação persistente de continuar a realizar uma tarefa, mesmo quando se torna difícil ou exige esforço excessivo. Esta compulsão leva muitas vezes a estados prejudiciais para saúde, independentemente da esfera da vida em questão.

O burnout tem consequências negativas não só na nossa vida profissional (pode provocar absentismo, perda de produtividade ou diminuição do compromisso com o trabalho), mas também na nossa vida pessoal (pode influenciar o nosso bem-estar, as relações sociais e a vida familiar).

Atualmente, as condições de vida e o bem-estar no ambiente de trabalho são impactados não apenas por questões de segurança e saúde, mas também por fatores psicossociais, como as relações interpessoais e a estrutura organizacional.

Enquanto os riscos para a saúde física associados a más condições de trabalho estão mais controlados, observa-se uma crescente pressão psicológica no ambiente profissional, resultando em perturbações da saúde mental, sobretudo, pela exaustão emocional e pela diminuição do envolvimento pessoal no trabalho.

Quando motivado pelo trabalho, o burnout, deve-se sobretudo à natureza habitualmente exigente da atividade. A pessoa não escolhe trabalhar apenas por vontade própria, mas sim por necessidade de obter compensações, frequentemente de natureza económica e, muitas vezes, insuficientes. Está por isso associado a problemas alimentares e de sono, doenças cardiovasculares, músculo-esqueléticas e auto-imunes, bem como a problemas de saúde psicológica (como ansiedade, depressão, consumos ou mesmo suicídio).  

Quanto mais desfavoráveis forem as condições laborais, maior será a probabilidade de ocorrer uma interação entre fatores pessoais e organizacionais com consequências significativas, tanto para o indivíduo quanto para as organizações. É por isso essencial realizar mudanças para melhorar o bem-estar no contexto de trabalho promovendo a saúde das organizações e das pessoas. Todos temos um papel a desempenhar para construir locais de trabalho saudáveis.

Um ambiente de trabalho pouco saudável desencadeia níveis significativos de stress e desconforto, exacerbando ou desencadeando problemas de saúde psicológica. Em 2022, a Organização Mundial da Saúde (OMS) informou que aproximadamente 15% da população adulta em idade laboral enfrenta desafios relacionados com a saúde psicológica em algum momento da sua vida. Em Portugal, problemas comuns de saúde psicológica, como stress, depressão e ansiedade, afetaram quase dois em cada cinco trabalhadores (33%) no último ano devido ao trabalho, uma prevalência superior à média da União Europeia (27%) (Eurobarómetro, 2022).

A maioria dos riscos psicossociais, que representam ameaças e têm impactos na saúde psicológica, está diretamente ligada ao tipo de tarefas desempenhadas e à intensidade do trabalho. Em Portugal, estima-se que o stresse e o burnout acarretem um custo anual de 3,2 mil milhões de euros para as empresas.

A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico – OCDE (2019) sugere a promoção e, em certos casos, a obrigatoriedade da avaliação dos riscos psicossociais, acompanhada de medidas preventivas nos ambientes de trabalho. Adicionalmente, são aconselhadas intervenções para abordar questões de saúde psicológica no contexto profissional, com o objetivo de promover a saúde e o bem-estar no trabalho.

Como sei se estou numa situação de burnout?

  • Exaustão emocional (esvaziamento emocional, desgaste da nossa empatia e diminuição da compaixão pelo outro);
     
  • Menor realização profissional (avaliamo-nos de forma mais negativa, tal como avaliamos como mais negativa a nossa situação no trabalho e a forma como o estamos a realizar);
     
  • Menor motivação, propósito e envolvimento/dedicação ao nosso trabalho;
     
  • Sintomas físicos (como maior fadiga, dores musculares e/ou enxaquecas, alterações ao sono ou nos níveis de tensão arterial, entre outros);
     
  • Menor bem-estar e satisfação com a vida em geral;
     
  • Deterioração das relações sociais e familiares.

Que fatores contribuem para o desenvolvimento de burnout?

  • Carga de trabalho superior à capacidade do profissional;
     
  • Falta de autonomia e controlo sobre as tarefas e a organização do trabalho;
     
  • Baixo propósito ou significado das tarefas realizadas;
     
  • Realização de tarefas perigosas ou de grande exigência emocional;
     
  • Horários de trabalho contínuos e excessivos (superiores a 8h diárias) e/ou horários por turnos;
     
  • Existência de poucas ou nenhumas pausas para descanso (mais de cinco horas de trabalho consecutivo);
     
  • Conflitos e má relação entre colegas e superiores hierárquicos;
     
  • Dificuldades de equilíbrio entre a vida pessoal e profissional;
     
  • Incapacidade de resolução de problemas pessoais que impactam no trabalho.

Como posso evitar entrar numa situação de burnout?

  • Aproveitar pequenos momentos para estabelecer uma conexão consigo mesmo. Oportunidade para cultivar a consciência e o regular das emoções, focar na respiração, no corpo e nos sentimentos, tentando visualizar a tranquilidade e empatia que desejamos levar para o próximo momento;
     
  • Reconhecer e nomear as emoções que experimentamos. Quando algo nos afeta, é útil fazer uma pausa para identificar e nomear o que sentimos. Dar nome às emoções e desenvolver a consciência sobre como nos sentimos contribui para uma melhor gestão emocional;
     
  • Praticar o exercício das "Três Coisas Positivas": refletir, registar ou compartilhar com alguém três acontecimentos positivos do dia, pelos quais somos gratos ou que nos proporcionaram bem-estar;
     
  • Pedir ajuda. Se está constantemente ansioso, se se sente exausto e não consegue manter o seu funcionamento habitual, na sua vida pessoal ou profissional, procure a ajuda de um psicólogo.

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