O Psicólogo Responde: Qual o melhor desporto para combater a ansiedade e o stress?
Desporto ilustração

O Psicólogo Responde: Qual o melhor desporto para combater a ansiedade e o stress?

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Gaspar Ferreira
Psicólogo e membro do Conselho de Especialidade de Psicologia do Trabalho, Social e das Organizações

A ansiedade e o stress têm um papel adaptativo na resposta a contextos e desafios internos e externos, mas se não forem devidamente abordados, podem tornar-se problemas de saúde psicológica. Felizmente, existem várias estratégias eficazes para enfrentar esses desafios, e a prática do desporto é uma delas. Neste artigo, iremos explorar como a escolha do desporto adequado pode ser uma ferramenta valiosa na luta contra a ansiedade e o stress.

O papel do exercício físico na saúde mental

A prática regular de desporto é frequentemente recomendada como uma estratégia eficaz para combater a ansiedade e o stress. O exercício físico não só promove a saúde física, como também tem um impacto positivo significativo na saúde mental, oferecendo uma maneira natural de reduzir os sintomas de ansiedade e stress.

Não existe uma resposta única ou definitiva para a pergunta sobre qual é o melhor desporto para combater a ansiedade e o stress. Vamos, por isso, analisar algumas evidências que possam suportar decisões mais informadas.

Grupos vulneráveis, escolha do desporto e diferenças de género

A condição sócioeconómica e as influências sociais e culturais desempenham um papel importante nas preferências de exercício de homens e mulheres. As expetativas e os estereótipos de género também podem influenciar as escolhas de atividades físicas.

Há estudos que sugerem diferenças de preferência entre homens e mulheres em relação aos tipos de exercícios que escolhem. Por exemplo, as mulheres tendem a interessar-se mais por exercícios como ioga, pilates e dança, enquanto os homens podem preferir atividades como musculação e modalidades coletivas.

Na União Europeia a pesquisa mais recente da Eurobarómetro (2022) revela que o género, a idade, a educação e o estatuto económico estão relacionados com a prática da atividade física e num outro estudo do Eurobarómetro (2023), os portugueses aparecem no último lugar na União Europeia, apresentando 73% de pessoas que declaram nunca praticar qualquer forma de desporto ou exercício físico.

As mulheres e as pessoas mais velhas têm menos probabilidade de participar regularmente em algum tipo de desporto ou exercício, assim como pessoas de grupos socioeconómicos mais desfavorecidos.

Os homens são mais propensos do que as mulheres a exercitar-se ou praticar desporto com alguma regularidade: 40% deles dizem que ‘nunca’ se exercitam ou praticam desporto, comparado com 49% das mulheres.

Pessoas entre 15 e 24 anos são as mais propensas a exercitar-se ou praticar desportos com alguma regularidade (54%). Esta proporção diminui com a idade, de 42% entre os que têm entre 25 e 39 anos para 32% no grupo de 40 a 54 anos e 21% entre aqueles com 55 anos ou mais.

Num estudo de Emily Galvin e colegas (2022) concluiu-se que a atividade física pode ser importante para um sono e saúde emocional ótimos, e que o género deve ser considerado ao criar prescrições de exercício para problemas de sono. Nos homens, uma maior frequência de exercício está associada a melhorias no sono e a um menor humor depressivo. Nas mulheres, uma maior frequência de exercício está associada a um horário de dormir mais cedo, melhor qualidade do sono, aumento do afeto positivo, menos humor depressivo e menos sentimentos de raiva.

Personalidade e motivação para a prática de exercício e participação desportiva

De acordo com o Eurobarómetro (2022) mais de metade dos europeus (54%) dizem que praticam desporto ou atividade física para melhorar a saúde, muito à frente de qualquer outra razão. Cerca de quatro em cada 10 participam em algum desporto ou outras atividades físicas para melhorar a forma física (43%) ou para relaxar (39%).

Pelo menos um quarto dos inquiridos disse que a sua motivação era para se divertir (27%), melhorar o desempenho físico (27%) ou controlar o peso (25%).

A personalidade e as motivações intrínsecas podem influenciar a escolha do desporto, bem como a consistência da prática.

Indivíduos extrovertidos podem ser mais propensos a envolver-se em atividades físicas sociais, como dança em grupo ou desportos coletivos, que oferecem interações sociais e estimulação social.

Pessoas com traços altos de ordem e perfecionismo podem preferir exercícios que possam ser incorporados numa rotina consistente, como a corrida diária ou treinos de força programados.

Pessoas com menor necessidade de tranquilidade e maior abertura a novas experiências estarão mais disponíveis para uma maior variedade nas atividades físicas e podem sentir-se atraídas por exercícios mais arriscados ou não convencionais.

Indivíduos com níveis mais elevados de neuroticismo podem ser motivados por exercícios que ajudem a aliviar o stress e a ansiedade, como os encontrados na ioga ou na meditação.

Exercícios aeróbicos e anaeróbicos na saúde psicológica

É importante compreender as diferenças entre a prática de exercícios aeróbicos e anaeróbicos pois cada abordagem pode ter impactos distintos na ansiedade e no stress.

Os exercícios aeróbicos, também conhecidos como de resistência ou cardio, envolvem atividades de longa duração onde os músculos usam oxigénio para produzir energia. Como exemplo, temos as caminhadas, o ciclismo, a corrida e a natação.

Um estudo publicado na revista "Psychosomatic Medicine" em 2020 revelou que a prática consistente de exercícios aeróbicos estava associada à geração de endorfinas e a uma redução significativa dos sintomas de ansiedade e depressão em adultos. A pesquisa também sugeriu que a melhoria da função cardiovascular e o aumento da capacidade pulmonar resultantes dos exercícios aeróbicos podem desempenhar um papel fundamental na redução do cortisol no organismo.

Por outro lado, os exercícios anaeróbicos caracterizam-se pela sua alta intensidade e curta duração, gerando energia sem usar oxigénio. Estes exercícios incluem corrida de velocidade, musculação, ioga ou pilates. No caso da ioga e do pilates, estas podem ser excelentes opções para quem procura uma atividade menos intensa, mas que ainda oferece benefícios significativos para a saúde mental. Ambos se focam na respiração, flexibilidade e força, promovendo uma sensação de calma e reduzindo também os níveis de cortisol, uma das hormonas ligadas ao stress (Ross & Thomas, 2010).

Quer os exercícios aeróbicos quer os anaeróbicos, tendo efeitos diferentes, são importantes para a saúde. A inclusão de ambos os tipos de exercício na rotina semanal é recomendada pela OMS.

Artes marciais: escolher a disciplina e o autocontrolo

As artes marciais, como o judo, o karaté ou o taekwondo, oferecem um equilíbrio único de atividade física e disciplina mental. A prática regular de artes marciais reduz a ansiedade e o stress, e melhora a autoconfiança, o autocontrolo e a concentração.

Conclusão

Não existe um melhor desporto que sirva a todos para combater a ansiedade e o stress. A escolha dependerá da situação sócioeconómica, preferências individuais, idade, género, condição física e objetivos de saúde.

É fundamental escolher uma atividade que se goste e manter a regularidade na prática. Para isso deve-se encontrar uma modalidade que proporcione prazer e que se encaixe no estilo de vida do indivíduo, contribuindo assim para uma melhor saúde psicológica e física.

Ao iniciar qualquer novo desporto ou programa de exercícios, é fundamental consultar um profissional de saúde para garantir que seja seguro e adequado às suas necessidades individuais. A criação de um novo hábito também apresenta alguns requisitos. Deve escolher-se locais próximos para a prática de atividade física, devem definir-se objetivos realistas e acessíveis, e há evidência que assumir e renovar um compromisso público, aumenta a probabilidade de sucesso na permanência da prática.

O reforço de políticas públicas que invistam na melhoria da acessibilidade aos equipamentos para realização de atividade física, a melhoria dos rendimentos das famílias e da conciliação e maior equilíbrio entre trabalho e vida pessoal, bem como a criação de horários e condições de prática física e desportiva nos locais de trabalho, poderão ajudar significativamente na escolha, se não do  melhor desporto, pelo menos de uma prática física que previna a doença e promova uma existência com mais bem-estar e saúde psicológica.

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