Covid-19: Especialistas defendem alívio das medidas já este mês

2 fev 2022, 07:12

Numa altura em que há países a levantar as restrições e a ter uma vida mais normal, especialistas acreditam que está a chegar o momento de Portugal acabar com algumas medidas de mitigação da propagação do vírus. E explicam o que pode suceder com os certificados, as máscaras e os testes

A Direção-Geral da Saúde está a estudar o alívio das restrições de combate à pandemia, apurou a CNN Portugal. A alteração da estratégia e o levantamento de medidas, que já está a ser feito em países como a Dinamarca, poderá mesmo estar para breve. Aliás, à CNN Portugal vários  especialistas mostram-se unânimes em considerar que está a chegar a hora de avançar com uma mudança.

Embora esta seja uma das fases com menores medidas em vigor desde o início da pandemia, a tomada de posse de um novo Executivo pode ser o gatilho para avançar com mudanças, como sugeriu à CNN Portugal o pneumologista Filipe Froes. E fevereiro é considerado o mês da mudança, com Filipe Froes a apontar para a segunda quinzena de fevereiro.

Há condições para haver otimismo, vamos ter cada vez mais o efeito tanto da vacinação como da infeção, que acaba por conferir maior imunização. Portanto, tal como acontece noutros países, e a Dinamarca é um exemplo, em que houve uma quebra muito acentuada nos cuidados intensivos, o aliviar das medidas é natural”, refere Óscar Felgueiras, matemático especialista em epidemiologia da Universidade do Porto.

Alívio das medidas pode acontecer ainda este mês

Não há uma data oficial, mas olhando para o panorama atual da pandemia em Portugal e para as estimativas que apontam o pico de infeções para estas duas primeiras semanas de fevereiro, espera-se que haja um alívio das medidas ainda este mês ou, o mais tardar, em março - fase em que se deve começar a pensar no pós-covid, como defendem os peritos do Instituto Superior Técnico.

Em princípio, a partir do fim desta onda de Ómicron, no final de fevereiro, poderá ser a altura em que vamos consideravelmente levantar as medidas, passaremos para uma vigilância não tão apertada da covid”, explica à CNN Portugal Gustavo Tato Borges, presidente da Associação de Médicos de Saúde Pública. 

Também Bernardo Gomes, médico especialista em saúde pública, olha para o mês de fevereiro como potencial data para o alívio e ajuste de algumas medidas.

Nesta altura, temos um prazo temporal de menos de três semanas para fazer ajustes”, adianta, avisando: “Deve evitar de forma absoluta declarações como ‘libertação total’, ‘a pandemia acabou’ e ‘endemia’. Não é a realidade, [a covid-19] é um fenómeno mundial, mesmo que fechássemos o país, o vírus vai propagar-se noutras zonas”.

Embora veja com “otimismo” o futuro próximo da pandemia em Portugal, Luís Tavares, médico e coordenador da Unidade de Infecciologia do Hospital Lusíadas em Lisboa, diz que “é difícil” apontar uma data, mas assume esperar que o alívio das medidas esteja “para breve”, sobretudo olhando para o comportamento atual da variante Ómicron e para a proteção que esta variante, para já, parece conferir.

As medidas que faz sentido deixar cair

Para o infeciologista Luís Tavares “é inevitável” que haja mudanças, mas defende que devem ser “por etapas”. “O próprio EDCD [Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças] fez recomendações aos países nos sentido de modificar um bocado a abordagem a vigilância dos doentes infetados, mas vai ser um processo gradual”, adianta.

Segundo Gustavo Tato Borges, e olhando para outros países ou até para a Madeira, que impunha um teste semanal aos habitantes, “Portugal não tem assim tantas medidas que seja necessário aliviar”, no entanto, defende que, em breve, “deixaremos de usar máscara nos espaços interiores”, por exemplo. E num cenário não muito distante “os contatos de risco e positivos não serão isolados”, isto, claro, depois de se passar o pico da pandemia e com uma carga controlada nos serviços de saúde.

Também Bernardo Gomes diz que “há a possibilidade de preparar um desmame progressivo das medidas”. Apesar de considerar que não se deve ignorar o facto de Portugal ainda não ter “um cenário hospitalar que nos deixe tranquilos” e de termos “uma mortalidade mais expressiva do que a Dinamarca”, além de estarmos “atrasados” no que diz respeito à vacinação de reforço em comparação com este país. Uma das medidas que considera que faz sentido mudar é o certificado digital.  

É possível que exista um alívio adicional de medidas em duas ou três semanas e das primeiras coisas que tem de sair é o uso regular do certificado no quotidiano, não faz sentido tantos atos burocráticos no dia-a-dia”, adianta.

Outra mudança a ser feita, defende Bernardo Gomes, é no método de testagem . “Uma das coisas que tem de mudar é deixarmos de usar de forma expressiva e de forma tão generalizada o teste PCR, devemos usar para dúvidas ou para colheitas diferenciadas e circunstâncias excecionais”, diz, dando um exemplo: “48h para marcar um PCR e 72h para receber resultado é a definição de loucura”, embora esta seja a realidade de muitas pessoas.

Máscara por solidariedade

À CNN Portugal, Filipe Froes diz que, nos próximos meses, Portugal terá “de ir aliviando estas medidas, sobretudo com mais prudência nas pessoas mais vulneráveis”,. Essas “provavelmente vão ter mais cuidados sobretudo em situações de maiores aglomerados populacionais”, considera,  alertando que, por isso, haverá sempre pessoas que “continuarão a usar máscara”, como pode acontecer em visitas a hospitais ou lares de idosos, em que “a imunidade decai” consideravelmente.

Embora possa haver um alívio no uso das máscaras, como sugere Tato Borges, há quem defenda que é preciso olhar para as pessoas mais vulneráveis, particularmente os imunossuprimidos. É o caso do médico Bernardo Gomes  que considera a máscara como uma das medidas que, à partida, continuará a ser usada, mais não seja por “solidariedade”.

As pessoas imunossuprimidas não terão liberdade total na circulação de espaços públicos, transportes e serviços de saúde se não houver solidariedade do uso de máscara”, diz o especialista em saúde pública.

E a questão da máscara e dos espaços fechados traz outra questão: a ventilação. O médico Bernardo Gomes garante mesmo que a falta de aposta na melhoria da ventilação foi um dos aspetos que poderia ter feito a diferença. “Temos um aumento de infeções pediátricas generalizadas porque mandamos as crianças para as escolas sem assegurarmos condições de ventilação”, frisa o especialista. 

Faço um apelo desesperado: isto não acabou aqui e precisamos de fazer um investimento em ventilação, se os espaços fechados não forem bem ventilados vamos ficar a mercê de medidas mais restritivas caso chegue uma nova variante”, atira Bernardo Gomes.

Há riscos em aliviar medidas?

Sim, até porque, defendem os especialistas entrevistados pela CNN Portugal, a pandemia não acabou e há sempre o fator incerteza que leva os médicos a apelar por ponderação e bom senso. Mas o certo é que o cenário agora é diferente e permite algum otimismo.

Sobre os riscos do alívio de medidas, Filipe Froes está otimista. “Quando abrirmos, grande parte da população ou está vacinada ou teve a infeção” e, por isso, “não é previsível que tenhamos um aumento dos casos graves graves”.

Se aguentamos os números de casos graves agora, certamente teremos condições para aguentar com eles no futuro”, garante o pneumologista.

Para além da importância de medir os riscos olhando para “a situação” que o país atravessa e não “importando” o que se faz lá fora, o médico Bernardo Gomes adianta que é importante “preparar cenários futuros”.

A verdade é que é possível que tenhamos de encaixar um modelo sazonal de gestão, termos períodos de circulação basal mínima do vírus”, que levará apenas a alguma “cautela para que tudo possa fluir de forma natural”, a períodos “em que temos de conter a transmissão por medidas adicionais, sempre na medida do proporcional”.

O que estão a fazer os outros países

A Dinamarca decidiu deixar cair todas as medidas restritivas até agora impostas para o combate à pandemia - o que inclui deixar de usar máscara e o certificado digital, por exemplo. Já Finlândia, a Suécia e a Noruega seguem caminhos semelhantes no alívio, embora não o façam de uma só vez: as medidas vão sendo retiradas de forma gradual.

Os países nórdicos estão a dar os primeiros passos para o regresso à normalidade e muito à boleia da ação da variante Ómicron, que tem aumentado muito o número de contágios, mas com impacto na saúde e na mortalidade inferior às variantes anteriores. Na prática, deixam de considerar a pandemia da covid-19 uma doença crítica e estão a evoluir para uma fase mais endémica, mais normal.

Ao olhar para aquilo que os países do norte da Europa estão a fazer, Gustavo Tato Borges explica que “é preciso ter em conta que têm uma forma de socializar e viver muito diferente da nossa. ". Ou seja, "eles têm mais distância e o respeito individual, o que faz com que haja menos contacto”.

O que a mim me parece é que estes países disseram que não têm forma de atuar. E como [a Ómicron] não mata tanta gente... É um desistir quando ainda havia vantagem em ter cautela, faltou meio termo”, lamenta o especialista.

A Bélgica deixou cair as restrições por considerar a pandemia controlada, assim como a França (que decretou o fim do teletrabalho obrigatório e a lotação limitada de espaços fechados) e o Reino Unido (fim do uso de máscara até em transportes públicos, por exemplo), ao passo que a Áustria decide tornar a vacinação contra a covid-19 obrigatória.

Medidas atualmente em vigor em Portugal 

De momento, e olhando para as medidas com caráter restritivo, Portugal tem como medidas de controlo da pandemia a limitação de uma pessoa por cada cinco metros quadrados em espaços comerciais, o uso obrigatório de certificado digital para acesso a restaurantes, estabelecimentos turísticos e alojamento local, espetáculos culturais, eventos com lugares marcados e ginásios.

Há ainda a obrigatoriedade de teste negativo para visitas a lares, visitas a pacientes internados em estabelecimentos de saúde, grandes eventos e eventos sem lugares marcados ou em recintos improvisados e recintos desportivos (salvo decisão da DGS), proibição de consumo de bebidas alcoólicas na via pública, com exceção das esplanadas e medidas especiais em matéria de testagem para efeitos de voos internacionais (até 9 de fevereiro de 2022).

O isolamento passou agora a ser de apenas sete dias para isolados e coabitantes, mas ficam dispensados todos os não infetados que tenham o esquema vacinal primário e a dose de reforço.

Os bares e discotecas estão abertos e o teletrabalho deixou de ser obrigatório desde dia 14 de janeiro.

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