A nova frente de batalha da Rússia: "Objetivo não é conquistar terreno, é dizimar soldados ucranianos"

28 mai, 23:07

Moscovo prepara-se para enviar até 300 mil militares russos para a fronteira norte com a Ucrânia, bem perto de onde começou a guerra em fevereiro de 2022, segundo a Defesa de Kiev. A dimensão da operação surpreende os analistas militares, que só veem um objetivo na mesma

O Kremlin está a preparar-se para enviar entre 200 a 300 mil homens para a fronteira norte com a Ucrânia com o objetivo de criar uma nova frente de batalha. Estranhamente, o anúncio foi feito pelo ministro da Defesa da Ucrânia, numa entrevista à Reuters, em que Rustem Umerov realçou também a iminente chegada dos caças F-16 ocidentais e os atrasos nas entregas de armamento. As afirmações do governante ucraniano levantam dúvidas sobre a oportunidade do anúncio: é um aviso real ou uma tentativa de apressar as doações de armas ocidentais? Os analistas dividem-se.

"Se forem entre 200 a 300 mil homens bem preparados, vai ser muito difícil a Ucrânia pará-los", considera o major-general Isidro de Morais Pereira, que considera o anúncio "surpreendente, uma novidade e algo que os analistas não estavam à espera do ponto de vista estratégico".

Isidro de Morais Pereira diz mesmo que "não parece algo realístico perante os dados que temos até ao momento", explicando que "a Ucrânia está a tentar a todo o custo regressar à centralidade do plano diplomático mundial" e que esta poderá ser apenas mais uma tentativa, numa altura em que Kiev "tem pedido essencialmente duas coisas: defesa aérea, como mísseis Patriot ou PAC-3, e a autorização para utilizar armamento ocidental em território russo".

"Não me parece que a Rússia tenha 200 mil homens disponíveis, até porque, neste momento, já tem mais de meio milhão de homens na Ucrânia, quando a invasão começou eram apenas cerca de 150 mil. Não é credível que tenha capacidade de alavancar mais uma ofensiva com 300 mil homens. A Rússia também já não está bem, não é só a Ucrânia a ter dificuldades, a Moscovo não lhe falta munições, mas já começam a escassear os obuses, que têm sido arrasados pelas tropas ucranianas", aponta o especialista militar.

Atacar o ponto fraco da Ucrânia

Para o major-general Agostinho Costa, as alegações de Umerov têm sentido, embora faça a ressalva de que era expectável que esta nova vaga russa fosse composta no máximo por 150 mil operacionais. Na sua análise, as reservas militares russas têm capacidade para mais uma remessa de soldados de grande dimensão e, ao que tudo indica, estes serão "soldados bem preparados graças ao sistema de recrutamento russo que assenta no voluntariado". Resta agora responder à "pergunta de um milhão de euros", como o próprio diz, ou seja: "Qual é o objetivo russo?". O analista militar acredita que seja "atacar o ponto fraco da Ucrânia, a falta de pessoal e recursos".

Agostinho Costa explica que a criação desta nova frente de batalha, na região de Sumy, obrigaria o comandante-chefe das Forças Armadas da Ucrânia, Oleksandr Syrskyi, a movimentar forças para o norte, esvaziando as bases de descanso e enfraquecendo as restantes frentes e essa é a intenção de Vladimir Putin. "O objetivo russo não é conquistar terreno, o objetivo do Kremlin é dizimar o maior número de soldados das forças inimigas possível", garante o major-general, lembrando que "a doutrina da guerra tem apenas dois objetivos: destruir o inimigo ou fazer com o inimigo deixe de querer combater".

Isidro de Morais Pereira insiste que "não é credível que a Rússia tenha capacidade de alavancar mais uma ofensiva com 300 mil homens", até porque "não é só a Ucrânia a ter dificuldades". " Moscovo não lhe falta munições, mas já começam a escassear os obuses, que têm sido arrasados pelas tropas ucranianas", aponta. Para além disso, como realça o especialista, "a Rússia quando atacou a Ucrânia foi com os seus melhores homens e muitos deles já morreram, os primeiros meses foram uma razia".

Mas não tem dúvidas sobre os objetivos de Moscovo. "Putin não desiste de conquistar o Donbass: o objetivo do Kremlin é fechar a região", garante Isidro de Morais Pereira.

Caso se confirme o prenúncio de Rustem Umerov, o major-general defende que o Ocidente só terá um caminho: "O ideal seria que os EUA autorizassem a utilização dos ATACMS em território russo para neutralizar quaisquer concentrações de soldados russos junto à fronteira."

Para Agostinho Costa, o Ocidente tem estado "a testar a determinação de Putin". "É como se dois carros se deslocassem, a alta velocidade, para uma colisão frontal para ver quem será o último a desviar-se." Enquanto isso, "Zelensky está preocupado com duas coisas: manter-se legitimado pelo Ocidente como presidente da Ucrânia e evitar a fadiga da guerra".

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