Num debate em que Temido e Bugalho escolheram a picardia, o Chega juntou-se aos conservadores e a CDU não foi em guerras

CNN Portugal , MJC
21 mai, 23:35

Ao quinto debate, a candidata socialista e o candidato da AD acusaram-se mutuamente de estarem a dizer mentiras. João Oliveira, da CDU, defendeu a paz na Ucrânia mas não explicou como atingi-la, e Tânger Corrêa, do Chega, disse não querer uma Europa "de portas escancaradas"

O crescimento da extrema-direita em toda a Europa foi um dos temas em destaque no quinto debate para as eleições Europeias que, esta terça-feira, juntou à mesma mesa, na RTP, Marta Temido, do Partido Socialista, Sebastião Bugalho, da Aliança Democrática, António Tânger Corrêa, do Chega, e João Oliveira, da CDU.

O clima foi tenso entre Marta Temido e Sebastião Bugalho ao longo de todo o debate. No momento em que se discutia o direito universal à habitação, por exemplo, Bugalho acusou a socialista de estar a ser "inverdadeira", Temido por seu lado acusou-o de estar "impreparado". Foram muitas as vezes em que se interromperam, falaram um por cima do outro e trocaram apartes. O tom nem sempre foi amigável, a picardia foi permanente.

"Expulsar um país da União Europeia só em caso limite, mas há princípios dos quais não abdicamos", disse Bugalho quando questionado sobre o que será admissível e o que não o será. "A tolerância à diversidade tem-nos servido para fazer um caminho em comum", prosseguiu, explicando que não deixam "de ser críticos e atentos". "Neste momento, quanto estamos a enfrentar uma guerra, quanto mais unidos melhor. Temos de defender o estado de direito e a democracia, mas a coesão é essencial", afirmou o candidato social-democrata.

Marta Temido foi mais rígida nos seus limites: "Entendemos que o respeito pelos princípios do estado de direito é absolutamente essencial e não podemos condescender", defendeu a socialista. "Também não nos podemos esquecer que há determinadas forças políticas que tendem a ter maior presença no Parlamento Europeu, que defendem ideias que podem pôr em causa alguns princípios democráticos." Temido recordou a reunião da extrema-direita realizada há dias em Espanha onde foram proferidas "declarações inaceitáveis" - e com as quais Ursula von der Leyen parece aceitar fazer parcerias: "Isso é o que está em causa nestas eleições, isto não é dramatizar."

A primeira tensão

Neste momento aconteceu o primeiro momento de tensão entre Temido e Bugalho. O candidato da AD não concordou com a antiga ministra da Saúde: "Não podemos dizer que a senhora Von der Leyen está mais próxima daqueles que estão ao lado de Putin do que aqueles que estão ao lado da democracia"; "Não podemos amalgamar o grupo da identidade e democracia com o grupo dos conservadores e reformistas", alegou o candidato da AD. "Ai não?": Marta Temido discordou de Bugalho e afirmou que a diferença não pode ser só definida pela posição em relação à Rússia - "há mais coisas além disso".

António Tânger Corrêa, por seu lado, considerou que é "totalmente errado" classificar o Chega como partido da extrema-direita, uma vez que repugna toda a ideologia neonazi e totalitária. "O Chega não se revê em ideologias caducas", garantiu. Na sua opinião, "o Chega é um partido conservador e que não é de todo a favor de Putin". Posto isto, Tânger Corrêa não excluiu a hipótese de, no Parlamento Europeu, o Chega passar para a família conservadora. "Vai seguramente haver negociações entre as várias plataformas políticas", previu. No seu ponto de vista, as duas famílias estão cada vez mais próximas e esse deverá ser o caminho a seguir.

“O ambiente de fratura entre países não pode dar resultados de soluções democráticas mais robustas. Abre portas às soluções mais reacionárias. Há uma sã convivência da União Europeia com a extrema-direita”, acusou João Oliveira. Isso acontece porque, no seu entender, "a extrema-direita não põe em causa nem o militarismo nem o capitalismo". O comunista deixou ainda uma crítica à extrema-direita que "tem um projeto político profundamente reacionário e antidemocrático, mas em algumas circunstâncias tem de mascarar o seu discurso" - se não não teria votos. Na sua opinião, o combate à extrema-direita faz-se sobretudo com políticas de asilo, garantia de salários, combate ao desemprego e à precariedade, à discriminação, ao racismo e à xenofobia.

Marta Temido sublinhou que falar da extrema-direita é debater "uma Europa que avança versus uma Europa que retrocede". E referiu, tal como já fez antes, que na sua opinião estas são "provavelmente as mais importantes eleições europeias dos últimos anos", uma vez que enfrentamos não só uma guerra na Europa como a ameaça da extrema-direita. "Estamos a dizer que a Europa está sob ataque e não é só a guerra que está às portas, é um ataque aos seus valores essenciais, é um ataque a uma visão solidária da Europa que se está a esboroar", argumentou a socialista.

E aqui, novamente, aconteceu mais um momento de tensão entre Bugalho e Temido. "A AD não pode aceitar lições de conivência e complacência com a extrema-direita da parte do Partido Socialista", reagiu Sebastião Bugalho, acusando os socialistas na Europa de terem votado em consonância com a extrema-direita 823 vezes juntos. Mas Marta Temido respondeu que esses números não podem ser apresentados assim: "Isso é um artifício."

Ao falar de imigração, ficaram claras as diferentes posições dos candidatos. Tânger Corrêa declarou que o Chega é "contra o pacto migratório", por considerarem que "impõe soluções atacando a soberania dos países", defendendo que cada país deve poder encontrar as suas soluções. "Pode haver uns conceitos da União Europeia sobre a imigração, mas cada país" deve poder tomar decisões. "Queremos uma Europa mais próxima dos cidadãos." "O Chega nunca fez um discurso contra a imigração, nós não queremos é um país de portas abertas", disse o candidato. "Tem de haver regras."

"A Europa foi pensada como um espaço de paz e prosperidade, a começar pelos seus cidadãos e depois para os cidadãos não europeus. Nós temos de tratar primeiro os nossos cidadãos", defendeu Tânger Corrêa. "A Europa solidária tem de sê-lo primeiro com os seus cidadãos."

Créditos. Pedro Pina/RTP

"O que a Europa precisa é de cidadãos iguais nos seus direitos", afirmou João Oliveira, criticando os discursos "chauvinistas" que põem os imigrantes à mercê da escravatura. "Nós recusamos completamente essa perspetiva antidemocrática. Defendemos que deve haver solidariedade, acolhimento e integração dos imigrantes, com condições."

Sebastião Bugalho explicou que não recusa o pacto mas quer melhorá-lo, de forma a aumentar os mecanismos da imigração legar e diminuir a atuação das redes de tráfico. Mas Marta Temido acusou a AD de defender os imigrantes que são mais qualificados - e este foi mais um momento de grande crispação entre os dois candidatos, com Bugalho e Temido a acusarem-se mutuamente de estarem a mentir: "Recusa a sua família europeia? Não está confortável no partido onde está?", perguntou a socialista ao candidato da AD já quase no final do debate.

Todos querem a paz, mas o que fazer até lá?

Questionado sobre as declarações de Gouveia e Melo sobre a possibilidade de uma guerra e a necessária participação de militares portugueses, Sebastião Bugalho foi perentório: "Afirmações sobre o futuro dos jovens portugueses devem ser feitas por elementos eleitos pelos portugueses e não pelo Chefe do Estado Maior da Armada."

Já Marta Temido foi mais cautelosa: "Entendemos que a eventual ideia de envio de tropas para o terreno é admitir a escalada daquilo que se passa num contexto regional para uma guerra mundial, portanto há que utilizar uma grande prudência quando se fazem essas análises."

Para Tânger Corrêa tratou-se de "mais uma declaração de intenções do que outra coisa". "Para já, não temos ninguém para mandar para lado nenhum. As forças armadas portuguesas foram convenientemente destruídas", atirou. Por isso, "temos de investir na defesa, sem dúvida". "Dito isto, nós não somos de todos belicistas. Em última análise, tem de ser uma decisão concertada entre todos os Estados-membros", defendeu.

João Oliveira considerou as declarações de Gouveia e Melo "preocupantes" e ainda mais graves quando as juntamos às declarações dos líderes europeus - "Há um ambiente de preparação para a guerra e é agora que o povo tem de se levantar para interromper esse caminho, porque esse caminho não serve a ninguém. A melhor ajuda que se pode dar à Ucrânia é trabalhar para a paz e não se trabalha para a paz enviando armas." - "quer a Ucrânia quer o Médio Oriente precisam de um cessar-fogo imediato", defendeu.

As reações não se fizeram esperar. "A favor da paz estamos todos nesta mesa", respondeu Sebastião Bugalho. "Eu acredito que as suas intenções são boas, mas as consequências dessas intenções são péssimas."

Marta Temido também respondeu: "Nós não podemos impor a paz, quando a própria Ucrânia diz que só quer paz em determinadas condições. Evidentemente que o caminho para a paz todos o queremos, mas a posição do PCP neste tema é indefensável."

Sondagens: "Nenhum de nós se apresenta a eleições para perder"

O debate começou com uma sondagem realizada pela Universidade Católica para a RTP, que prevê um empate técnico entre as duas principais forças - PS e AD - com uma ligeira vantagem da AD. Instada a comentar estes resultados, Marta Temido afirmou que não lhe interessava comentar sondagens, mas antes "enfrentar o trabalho que temos pela frente". 

"Nenhum de nós se apresenta a eleições para perder", reagiu Sebastião Bugalho. "Estou satisfeito com a sondagem mas é só uma sondagem." Bugalho assumiu como meta mínima manter os sete deputados, mas admitiu que gostaria de aumentar este número: "Esta sondagem já supera as minhas expectativas."

"Sondagens são sondagens, nós começámos assim nas legislativas e acabámos como se sabe", comentou António Tânger Corrêa, sublinhando que ainda há muito por fazer nesta campanha. Como nas regatas de vela, em que costuma participar, nem sempre aqueles que partem na frente acabam por vencer. O candidato explicou que Ventura vai juntar-se à campanha: "Eu não sou uma figura tão conhecida como ele", admitiu. "É evidente que o André, além de ser presidente do partido, tem uma presença" que é importante para os eleitores.

De acordo com a sondagem, a CDU aparentemente pode perder um mandato mas mantém a representação no Parlamento Europeu. João Oliveira não pareceu preocupado: "sondagens há muitas", comentou, e, por isso, a CDU vai continuar o seu combate.

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