Dicas de guerra: barreiras nas ruas, buracos nas paredes e mantas na cabeça. Como ganhar aos russos numa cidade

12 mar 2022, 08:00

É especialista nas guerras em contexto urbano e tem usado o Twitter para partilhar conhecimento com os ucranianos. John Spencer avisa que os bombardeamentos em cidades como Kiev vão tornar-se mais constantes. E há um conselho que pode fazer toda a diferença: não ser visto, porque do céu tudo é um potencial alvo

John Spencer não esperava que a resistência ucraniana fosse tão forte. “Não acredito que os russos vençam, não para este tipo de resistência. Para qualquer exército, seria um desafio nesta fase”. Este antigo soldado norte-americano é especialista em guerra urbana. Tem-na estudado ao pormenor para confirmar uma tese: “É o sítio mais difícil para lutar”.

Combater no meio de uma cidade até pode ser melhor para quem se defende, mas não para quem ataca. “Se estiver a atacar uma cidade numa cidade, não consegue ver onde está o inimigo, que pode estar num bunker ou numa janela a disparar sobre nós”.

Entrar no centro de Kiev – algo que John Spencer diz ser “o grande objetivo” de Vladimir Putin – é um autêntico desafio, como provam estas duas primeiras semanas de guerra. E é aqui que vem uma das primeiras dicas. “A minha recomendação é que construam barreiras nas ruas, para impedir a entrada de tanques e de infantaria. Ninguém combate numa cidade sem ter tanques”. Foi assim em grandes batalhas como Berlim, Seul ou Manila, diz.

Mas mesmo assim, se as forças russas conseguissem furar o cerco, este norte-americano sabe bem o que faria a seguir. “Levá-los para ruas muito apertadas, para onde não consigam trazer muito equipamento”. Nas barreiras, pelo menos, os ucranianos têm aplicado a lição.

Não ser visto (e a importância do subsolo)

John Spencer tem usado o Twitter para partilhar dicas de guerra com os ucranianos, escritas também na língua do país que está debaixo de fogo. E há um conselho que rege todos os outros: é preciso não ser visto, porque a partir do céu tudo é um potencial alvo. “Acho que ainda não vimos sequer uma fração dos bombardeamentos que vamos ver nos próximos dias, infelizmente”.

“Nesta fase, é preciso quebrar coisas, fazer buracos nas paredes, para ser possível atravessar edifícios sem estar no meio da rua. É conhecido na guerra que os cenários de rua são cenários de morte”. E é isso que se pretende evitar, sejam militares ou civis. Outra das estratégias passa por usar materiais, como madeiras ou mantas, por cima da cabeça. É uma forma de camuflagem.

Para cumprir o desígnio de não ser visto, há outro território urbano que John Spencer não dispensa: o subsolo. É importante para o refúgio, como tem acontecido com milhares de cidadãos, mas também pode ser usado para o ataque, surpreendendo o inimigo.

“Kiev tem uma vasta rede de metro. E há túneis do metro, túneis de água, túneis de esgotos. A guerra de Estalinegrado era conhecida como a guerra dos ratos. Estalinegrado não tinha o subsolo que Kiev tem, mas foi uma parte determinante dessa guerra. Pode destruir-se um exército usando o subsolo”, argumento. E por isso, acredita, mais tarde ou mais cedo, os ucranianos vão usá-lo para proteger-se a si, às armas e aos mantimentos. Até porque há que cumprir a “regra do três”: “Podemos sobreviver três dias sem água, três semanas sem comida”.

O papel dos civis (e que armas usar)

“Não gosto de ver civis no meio de uma guerra. Ponto final. A partir do momento em que um civil pega numa arma, passa a ser um alvo”. Apesar desta convicção, John Spencer diz que a guerra na Ucrânia chegou a um ponto em que já não é possível evitá-lo. É uma questão de “sobrevivência da nação”.

E há tarefas que podem ser feitas que não envolvem pegar numa arma. “Os civis podem ser muito úteis para os militares, mesmo que não queiram disparar contra os russos. Na construção de barreiras, no apoio médico, a acumular material, a distribuir água, colocando coisas no subsolo para sobreviver”. O primeiro passo para a vitória ucraniana, aponta o especialista do Modern War Institute, é manter a unidade, a esperança, já que “os russos querem criar um horror de tal dimensão, que os leva a desistir”.

Mas, se as populações tiverem de pegar em armas para se defenderem, o melhor é que sejam de uso fácil. “Como uma AK-47 [conhecida como Kalashnikov], um RPG [lança-granadas], granadas ou cocktails molotov”. Estas armas não devem ser usadas, de preferência, a partir de um lugar onde o civil não está visível. Porque, com a tensão latente, basta ver uma arma para um militar russo disparar sobre um inocente, alerta o especialista norte-americano. O melhor é usá-las dentro de edifícios, atrás de janelas.

Se for preciso fazê-lo na rua, John Spencer aconselha a saber de antemão onde se proteger e durante quanto tempo se tem o inimigo atordoado.

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