Manobras "que roçam o abalroamento" ou "criar ruído às comunicações": Rússia já opera em Portugal como nos tempos da Guerra Fria

16 mai, 09:00
Marinha monitoriza embarcações russas

Denúncia partiu do chefe do Estado-Maior da Armada sobre as operações de patrulha a navios russos em águas portuguesas. Analistas militares dizem à CNN Portugal que fenómeno deverá aumentar com a presença russa em África: "Faz lembrar os tempos da Guerra Fria"

Aproximações perigosas do mar territorial português, manobras que possam colocar em risco a segurança de outros navios e tentativas de interferir com as comunicações da Marinha. São estas algumas das ações mais comuns que os oficiais se deparam ao seguir embarcações estrangeiras - como as russas - que têm vindo a cruzar a costa nacional e que, segundo denunciou o chefe do Estado-Maior da Armada, resultam em situações “desagradáveis”.

Esta quarta-feira, em entrevista à TSF e ao DN, Henrique Gouveia e Melo sublinhou que as missões de acompanhamento de navios russos, tanto pela Marinha como pela Força Aérea, em águas portuguesas quadruplicou e que delas têm surgido ocorrências “que podem ser um escalar”. Segundo analistas militares disseram à CNN Portugal, há uma clara vontade por parte destas embarcações de “causar embaraço aos navios-patrulha que os possam estar a seguir”. “São manobras deliberadas para interferir com a operação portuguesa”, aponta o comandante da Marinha João Fonseca Ribeiro, “é como se fosse uma espécie de condução agressiva que surge em retaliação”. 

Essas manobras, segundo explica João Fonseca Ribeiro, “podem ir desde situações que roçam o abalroamento de outros navios, ou mesmo através da ingerência nas comunicações da Marinha, criando ruído para que as mesmas se tornem inaudíveis”. Da parte da tripulação que escolta estes navios, acrescenta, há sempre a preocupação de não escalar este tipo de ocorrências. “São observadas, tomadas notas - mas não costuma ir mais além do que isso”. 

Já o major-general Isidro de Morais Pereira, que chegou a comandar a Zona Militar dos Açores, aponta que estas incursões em águas portuguesas vão se tornar cada vez mais frequentes após a assinatura do pacto técnico e militar entre a Rússia e São Tomé. “Há um cada vez maior interesse da Rússia em explorar as antigas colónias portuguesas e isso vai levar a que cada vez mais navios russos façam essa travessia através da Zona Económica Exclusiva”. 

Por detrás destas incursões, afirma o major-general, há uma estratégia que “faz lembrar os tempos da Guerra Fria” no sentido de Putin conseguir projetar poder ao ocidente com a sua capacidade naval. “Portugal fica na fachada atlântica, é o quintal da NATO e a sua navegação por parte da Rússia serve para mostrar que o poderio naval continua ativo”. 

A travessia de navios russos em águas portuguesas tem vindo a ser progressivamente mais frequente desde a invasão da Ucrânia. “Há três anos o número de acompanhamentos que fazíamos era inferior a uma dezena por ano. Só no ano passado fizemos 46 e já este ano fizemos 14”, disse Gouveia e Melo, sublinhando que esses navios da Federação Russa podem “transitar nas nossas águas no sentido de irem da posição A para a posição B ou então podem ter interesses nas nossas águas. E as duas coisas acontecem simultaneamente”. 

A lei define que estes navios não podem aproveitar a riqueza das águas portuguesas, ou conduzir qualquer atividade científica que não esteja expressamente autorizada pelo Estado. Só que, alerta Isidro Morais Pereira, “com a maior presença naval russa, quer através de acordos em África, quer para continuar a mostrar que não tem medo dos países da Nato, sobe também o risco de existirem infrações àquilo que já foi regulamentado”. “Para fazermos face a essa ameaça, precisamos de investir em mais meios para patrulhar este tipo de movimentações”.

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