Polícias manifestam-se esta quinta-feira e PSP "reforça policiamento" junto ao Parlamento após apelo de André Ventura em dia de debate

4 jul, 07:00

No dia em que os partidos debatem a revisão do suplemento de missão para as forças de segurança, num debate pedido pelo Chega, pelo menos "um sindicato" acedeu à convocatória de André Ventura. Com polícias a manifestarem-se e polícias a controlarem os manifestantes, dois ex-ministros da Administração Interna, Eduardo Cabrita (PS) e Miguel Macedo (PSD), fazem leituras diferentes da polémica

Três meses após o início das negociações entre Governo e sindicatos das forças de segurança, o Parlamento debate esta quinta-feira, a partir das 15:00, a revisão do suplemento de missão para PSP, GNR e guardas prisionais, sob o olhar atento de pelo menos "um sindicato" da polícia e dois movimentos inorgânicos, que acederam ao pedido de André Ventura para se mobilizarem junto à Assembleia da República durante a sessão plenária.

A Câmara Municipal de Lisboa (CML) confirmou à CNN Portugal que “a Polícia Municipal de Lisboa rececionou a comunicação de um sindicato da PSP para a realização de uma manifestação no dia 4 de julho, junto à Assembleia da República”, sem adiantar qual o sindicato em questão, no entanto, o Sindicato Independente dos Agentes de Polícia (SIAP), que integra a plataforma e um dos sete sindicatos da PSP que tem direito a negociar com o Governo, comunicou a realização de uma concentração de agentes, por considerar que o debate deve ser acompanhado pelos seus associados.

Na segunda-feira, as duas principais associações representativas da GNR e da PSP demarcaram-se da convocatória feita pelo presidente do Chega, lembrando que as negociações com o Governo ainda estão em curso (para a próxima terça-feira está agendada uma nova ronda negocial). Em contrapartida, os movimentos inorgânicos de elementos da PSP e da GNR, nomeadamente o Movimento Zero e o INOP, acederam de imediato ao apelo de André Ventura, convocando todos os seus associados “para que estejam presentes em frente à Assembleia da República” na quinta-feira.

Neste contexto, a direção nacional da PSP confirmou também à CNN Portugal que foi preparado “um reforço do policiamento junto à Assembleia da República”, ressalvando, contudo, que este é um procedimento normal sempre que “se prevê interesse nos temas em debate” e tendo em conta “a avaliação do risco” que é feita pela própria Polícia de Segurança Pública.

Dois ex-ministros da Administração Interna, Eduardo Cabrita (PS) e Miguel Macedo (PSD), fazem leituras diferentes da polémica negocial, com o antigo governante socialista a considerar que Luís Montenegro "estragou tudo" num momento em que as negociações ainda decorrem, enquanto o social-democrata defende que se fez "o contrário" do que deveria ter sido feito, ou seja, primeiro melhorava-se as condições de PSP e GNR e só depois se equilibra as contas para a PJ.

Afinal, há margem ou não há margem para negociar?

O debate e a manifestação surgem dois dias depois de Luís Montenegro ter afirmado publicamente que o Governo não vai dar “nem mais um cêntimo” além dos 300 euros que propôs para o aumento do suplemento de missão das forças de segurança - valor que seria pago de forma faseada até 2026, passando o suplemento fixo dos atuais 100 para 400 euros, além de se manter a vertente variável de 20% do ordenado base. 

Horas depois, porém, a ministra da Administração Interna disse estar “disponível para discutir até ao final” com as forças de segurança - uma posição que alguns representantes da PSP e da GNR entenderam como contraditória com o que tinha sido dito anteriormente pelo primeiro-ministro.

Eduardo Cabrita, antigo ministro da Administração Interna do PS, considera que estas declarações revelam uma "falta de coordenação dentro do Governo". "O tom perentório [de Luís Montenegro] é totalmente desajustado do tom adotado pela ministra", diz à CNN Portugal, descrevendo as declarações de Margarida Blasco como demonstrativas de "uma grande bonomia e otimismo quanto à expectativa do quadro negocial".

"O que Luís Montenegro veio fazer foi, de algum modo, estragar tudo", critica Eduardo Cabrita, questionando "que margem política tem a ministra para negociar o que quer que seja na próxima semana" com os sindicatos representantes das forças de segurança.

Miguel Macedo, também antigo ministro da Administração Interna do PSD, por sua vez, rejeita a ideia de que Luís Montenegro e Margarida Blasco estejam em pontos diferentes sobre esta matéria. “Eu percebo que a ministra diga que pode haver ainda, dentro do teto orçamental, margem de negociação, por exemplo, na forma como se vai pagar esses aumentos dos subsídios”, argumenta o ex-governante em declarações à CNN Portugal.

Mas "a situação é muito, muito difícil”, admite Miguel Macedo, sublinhando que o Governo de Luís Montenegro está a braços com “a herança mais pesada” que o anterior executivo lhe deixou. É que as negociações entre o Governo e os sindicatos da PSP e da GNR dura há três meses, mas o problema arrasta-se há mais tempo, desde que o anterior Executivo atribuiu, em novembro passado, um suplemento de missão para as carreiras da Polícia Judiciária que, nalguns casos, pode representar um aumento de quase 700 euros por mês. Desde então, as forças de segurança exigem o mesmo tratamento dado à PJ, argumentando que estão a ser alvo de tratamento discriminatório e injusto.

Ao fim de três meses de negociações ainda não há acordo e a proposta do Governo continua a não convencer a plataforma dos sindicatos da PSP e associações da GNR, que inicialmente pediram 600 euros de aumento e propõem agora um aumento de 400 euros pago em três vezes: 200 euros este ano, 100 euros em 2025 e outros 100 em 2026.

No entendimento de Eduardo Cabrita, "o Governo está a pagar o custo da forma como se comportou no período pré-eleitoral", quando, diz, o PSD e o então candidato a primeiro-ministro, Luís Montenegro, "deram gás a todos estes protestos" e dando a entender que "isto era fácil de resolver e que se resolveria com grande celeridade num futuro governo do PSD".

"As eleições foram há quase quatro meses, o Governo está em funções há três, e o que vemos agora é que as coisas estão a complicar-se", analisa o antigo ministro da Administração Interna, defendendo que estas negociações exigem "uma avaliação global da situação quer de toda a área das forças de segurança, mas também dos impactos diretos nas outras áreas, designadamente nas Forças Armadas", recordando que Nuno Melo, ministro da Defesa, já disse que o que for decidido para a PSP e para GNR "tem depois de repercutir-se" numa solução para os militares.

Além dessa avaliação global, "o Governo tem de contribuir para a estabilidade das forças de segurança, legitimando os próprios interlocutores, e aqui, Montenegro, com esta intervenção, enfraqueceu quer a posição da ministra, quer a posição dos sindicatos", critica Eduardo Cabrita.

Polícias que nem professores, "não pode ser"

No entendimento de Bruno Pereira, porta-voz da plataforma sindical e presidente do Sindicato Nacional de Oficiais de Polícias, a proposta de 400 euros é “perfeitamente comportável” em termos orçamentais. “Vamos insistir nos mesmos 400 euros, ainda que de forma provavelmente mais faseada”, frisou, em declarações aos jornalistas, em reação às declarações taxativas de Luís Montenegro.

Para o antigo ministro Miguel Macedo, porém, esse valor está longe de ser comportável, do ponto de vista orçamental. “Para quem quer ter contas saudáveis no fim do ano, isto não pode ser... Não é possível”, defende, admitindo, ainda assim, compreender a posição das forças de segurança, que se dizem injustiçadas perante o aumento que foi atribuído à PJ.

Mas o problema, para Miguel Macedo, reside precisamente nesse princípio, criticando a "irresponsabilidade" do anterior Governo ao atribuir um aumento do suplemento de missão à PJ sem pensar nos precedentes que tal abriria para os restantes setores da Administração Pública, no caso, das forças de segurança. “Instalou-se a ideia de que a comparação tem de ser feita em termos absolutos com aquilo que foi para a Polícia Judiciária”, considera, argumentando que o que deveria ter sido feito era precisamente “o contrário”, ou seja, começar por melhorar as condições das forças de segurança e depois sim “a PJ teria uma valorização profissional equivalente ao que se fez para as outras forças de segurança”. Assim, explica, “avaliava-se primeiro o esforço para 40 e tal mil pessoas -, soldados da GNR e elementos da polícia - e depois o reflexo que isso teria na PJ”.

Embora admita não saber “qual o valor total do esforço orçamental” para o aumento do suplemento de missão proposto pelas forças de segurança, Miguel Macedo estima que “provavelmente é tanto ou mais do que a recuperação do tempo de serviço para os professores”, tendo sido abrangidos pela medida mais de 100 mil professores. “Isto mostra a dimensão do esforço”, compara o ex-ministro.

No início de maio, o Comando da GNR e a Direção Nacional da PSP fizeram chegar ao Ministério da Administração Interna propostas com dois cenários diferentes, sendo que o primeiro, defendido pela maioria das estruturas sindicais, prevê a atribuição do suplemento de risco à PSP e à GNR na modalidade em que é aplicado o suplemento de missão à PJ - que teria um impacto financeiro para o Estado a rondar os 351 milhões de euros por ano. No segundo cenário, as propostas apontam para um acréscimo remuneratório num montante igual ao que foi concedido à PJ e para uma valorização remuneratória evolutiva ao longo dos quatro anos da legislatura, num impacto financeiro de 209 milhões de euros por ano.

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