A Pirelli revelou o seu calendário de 2023, uma edição opulenta, em forma de sonho, com um elenco repleto de estrelas.
Com o título “Letters to the Muse” (cartas à musa), o calendário é uma homenagem a um grupo de “mulheres extraordinárias” - artistas, ativistas, atletas e outras pioneiras - afirmou a fotógrafa australiana Emma Summerton, que a inspiraram.
“Queria voltar à raiz etimológica da palavra ‘musa’ e retratar mulheres que me inspiram pela sua contribuição para a literatura, ciência e artes”, disse Summerton à CNN na sede da companhia italiana de pneus de Milão, onde se realizou o evento de imprensa do calendário.
“A ideia era representar o que realmente são e criar mundos que pudessem refletir e contar as suas incríveis histórias.”
Como tal, o elenco de 14 modelos apresenta-se como as várias “musas” em fotografias altamente estilizadas, vestindo na pele o seu trabalho para além da passerelle. Cara Delevingne, por exemplo, que foi protagonista em vários papéis no cinema, para além da sua carreira de modelo de grande sucesso, aparece como “A Performer”, vestida com uma roupa de macramé em poses impressionantes no meio de dentes-de-leão gigantes.
Nas sessões que ocorreram em Nova Iorque e Londres durante o verão, as modelos foram fotografadas contra cenários elaborados, imbuídas de realismo mágico e elementos surreais como os já referidos dentes-de-leão, bosques escuros, corujas e espelhos óticos, cortesia do cenógrafo Viki Rutsch. Para complementá-los, a diretora de moda Amanda Harlech criou figurinos de fantasia.
“Ter uma equipa quase exclusivamente feminina fez com que toda a experiência se tornasse extra especial”, referiu Summerton. “Foi uma grande colaboração.”
O calendário anual, que é sempre muito aguardado, já apresentou algumas das mais conhecidas modelos do mundo, desde Iman até Kate Moss. Cada ano é escolhido um fotógrafo diferente, como Annie Leibovitz e Richard Avedon entre aqueles que foram anteriormente convidados a fazer a sessão.
Summerton é a quinta mulher a fotografar o calendário desde o seu lançamento na década de 1960 pela companhia italiana de pneus. Antes dela foi Sarah Moon em 1972, Joyce Tenneson em 1989, Inez Van Lamsweerde (juntamente com Vinoodh Matadin) em 2007, e Leibovitz em 2000 e 2016.
“É algo que sempre quis fazer”, afirmou a fotógrafa sobre o projeto. “E espero que venham mais mulheres a seguir a mim.”
‘Não é o calendário de pin-ups do teu papá’
Desde o momento em que assumiu o projeto, Summerton sabia que as musas seriam o conceito para a sua versão. O seu quadro de humor inicial apresentava algumas das criadoras que mais influenciaram o seu trabalho, desde a pintora mexicana nascida na Grã-Bretanha Leonora Carrington e a atriz italiana Monica Vitti, à cineasta experimental americana Maya Deren e à artista australiana Vali Myers.
Summerton utilizou-as como referência para construir cada personagem, “e criar uma espécie de energia em torno de cada musa”, que poderia ajudar a criar uma conversa mais profunda e ampla entre o sujeito e o espectador em torno da beleza, empoderamento e vulnerabilidade.
Guinevere Van Seenus - “A Fotógrafa” - foi a primeira modelo a ser fotografada (“pareceu-me natural começar pela fotógrafa”, justificou Summerton). Na imagem, Van Seenus surge segurando uma câmara em frente a um espelho de corpo inteiro, no qual se encontra empoleirada uma coruja.
“A Emma realizou um sonho, e vê-la a torná-lo realidade foi uma educação para mim, no mínimo”, disse a modelo e fotógrafa americana no evento Pirelli. “Penso que ela estava realmente à procura da profundidade das mulheres em cada fotografia.”
A modelo Lauren Wasser, que também participou no projeto, concordou.
“Estas fotografias deixam-nos cativados e a desejar mais”, disse. “Isto é tão difícil de fazer com as imagens hoje em dia, porque estamos tão, mas tão saturados delas. Mas as fotografias da Emma têm uma ressonância diferente. Ela conseguiu realmente capturar-me a mim e à minha essência de resiliência e força.” Aos 24 anos, a modelo, ativista da Síndrome do Choque Tóxico (SCT) e outrora jogadora de basquetebol, sofreu de SCT, o que levou à amputação de ambas as pernas. Continuando a sua carreira ao quebrar barreiras na passerelle com próteses nas duas pernas, Wasser foi aclamada como alguém que mudou as regras do jogo na indústria de moda.
Para o calendário, encarnou “A Atleta” e foi caracterizada como Joana d’Arc no topo de uma lua crescente dourada contra um pano de fundo do oceano, segurando uma grande espada de prata na postura de uma guerreira.
“Senti-me realmente forte e poderosa”, afirmou Wasser, que usou as suas próteses douradas na sessão. “Emma soube como apresentar os nossos ângulos e os nossos pontos fortes. Penso que isso é algo que não conseguimos realmente ver no mundo da moda.”
Nem, durante grande parte da sua história, no próprio calendário Pirelli. Mas em 2016, Leibovitz rompeu com a tradição de representar maioritariamente nus artísticos e sex appeal, fotografando um grupo de mulheres bem-sucedidas em retratos onde estão, quase na sua maioria, vestidas. Nos últimos anos, tem continuado a mostrar expressões de beleza mais matizadas e diversificadas.
“Já não é o calendário de pin-ups do teu papá”, afirmou Ashley Graham, que encarnou “A Ativista”.
“O calendário para 2023 é provavelmente o mais fixe que já fizeram, porque dá voz a todos os que estão envolvidos. E faz a ponte entre a fantasia e a realidade, disse a modelo e ativista de positividade corporal. A mim permitiu-me realmente ser eu própria.”
A fotógrafa explicou que o filme que acompanha a realização do calendário ajuda a afastar o foco da objetificação das mulheres.
“Queria ouvir o que estas mulheres tinham para dizer e vê-las falar sobre quem são e o que fazem”, afirmou Summerton. “Isso aconteceu juntamente com a execução das fotografias, porque quando se olha para elas quer-se saber quem são.”