Mais de uma centena de lares sem condições mínimas

7 out 2005, 23:55
Mais de uma centena de lares sem condições mínimas

Trabalham sem licença e não cumprem a sua função. Segurança Social diz que os idosos sofrem cada vez mais nas instituições. Stress profissional gera violência sobre o mais velhos. Familiares devem estar atentos aos sinais de maus tratos. Mas os «filhos pagam para que se lhes tire um peso das costas»

Em 2004, foram levantados 122 autos a estabelecimentos que acolhem idosos. Dados do Instituto da Segurança Social revelam que «não estavam a ser cumpridas as normas legais de licenciamento e as condições de funcionamento não eram as mais adequadas».

De acordo com a lei, num Lar de Terceira Idade devem ser «desenvolvidas actividades de apoio social a pessoas idosas através do alojamento colectivo». Ao mesmo tempo, estes estabelecimentos são obrigados a garantir aos utentes «alimentação, cuidados de saúde, higiene e conforto, fomentando o convívio e propiciando a animação social e a ocupação dos tempos livres».

No entanto, a realidade nem sempre é esta. Os idosos sofrem, muitas vezes, nas mãos de quem teria obrigação de cuidar deles. A «falta de formação das entidades proprietárias e dos funcionários e a ausência de um acompanhamento assíduo por parte dos familiares que permita detectar e denunciar situações de risco em tempo oportuno», são algumas das razões que levam alguém a maltratar um «ser que se torna indefeso», conta fonte oficial do Instituto da Segurança Social, a entidade que fiscaliza os Lares de Terceira Idade.

«Os familiares devem estar atentos para detectar alterações, físicas e comportamentais, que possam indicar possíveis maus tratos», alerta a mesma fonte. «São eles que conhecem, melhor que ninguém, o estado físico e psicológico do familiar aquando da admissão no lar», acrescenta.

O que acontece é que muitos dos utentes são colocados «ao abandono num lar e nem sequer recebem uma visita. Sentem-se sós e sem apoio. E é a solidão que, por vezes, os faz ter atitudes que irritam
os funcionários», explica a psicóloga Cátia Filipe para quem «nada justifica a tal violência física ou psicológica» a que muitas das vezes estão sujeitos. «Na sociedade em que vivemos os filhos pagam para que se lhes tire um peso das costas», acrescenta.

Quando a equipa de inspectores que averigua possíveis actos violentos contra idosos, nos lares, não pode contar com a ajuda da família para ter elementos concretos sobre as ocorrências, procede à audição de outras possíveis fontes. «Existe um grupo alargado de intervenientes a quem compete acautelar a possível existência de maus tratos, «não só a própria família mas também o próprio utente, outros idosos colocados nos lares e elementos do pessoal não envolvidos», refere fonte do Instituto da Segurança Social.

A existência confirmada de infracções dá lugar ao levantamento de um «auto de notícia», que é a «base da instauração de um processo de contra-ordenação». Os casos são, posteriormente, denunciados ao Ministério Público «porque se trata de crime, previsto e punido no Código Penal».

Crime causado por stress profissional


Uma grande parte dos profissionais que cuidam dos idosos nos lares encontra-se «em situação de stress
profissional» provocado por «dificuldades em aceitar o envelhecimento [e tudo o que com ele se relaciona] como um processo normal», refere fonte do Instituto da Segurança Social. «Lidar com a morte e o luto com muita frequência pode provocar comportamentos que precisam de tratamento», adianta. Se esse tratamento for adiado «poderá levar à síndrome de esgotamento» que gera «comportamentos agressivos, irritabilidade, cansaço, depressão, conflitos interpessoais com os utentes e consequentemente mais violência», explica a psicóloga.

De acordo com fonte da Segurança Social, a solução para muitos casos de violência nos Lares passaria por acções de formação específicas «que favoreçam atitudes e comportamentos construtivos para com as pessoas mais velhas, muitas delas em situação de dependência, supervisão técnica e apoio psicológico sempre que necessário».

Por outro lado, «se os responsáveis pelos estabelecimentos estivessem sempre presentes nos lares, nomeadamente em períodos nocturnos, fins-de-semana, férias e feriados contribuiriam para evitar ou detectar a existência de possíveis maus tratos».

Patrocinados