O que sabemos e o que não sabemos sobre o 'ataque' ao hospital de Gaza

CNN , Rob Picheta
19 out 2023, 13:57
Imagens do Hospital Al Ahli Ara, em Gaza (GettyImages)

As Nações Unidas apelam a uma investigação cuidadosa. Até que investigadores independentes possam avaliar o incidente em pormenor, é pouco provável que o mundo saiba com certeza o que esteve na origem da explosão

Um dia depois da explosão mortal que destruiu o Hospital Al-Ahli, em Gaza, provocando protestos em toda a região, os Estados Unidos divulgaram a avaliação que fizeram sobre a causa da devastação.

Israel apresentou provas que, na sua opinião, demonstram que a explosão foi causada por um erro de disparo do grupo militante Jihad Islâmica e, na quarta-feira, o presidente dos EUA, Joe Biden, apoiou essa explicação, citando os serviços secretos norte-americanos. Um porta-voz do Conselho de Segurança Nacional afirmou mais tarde que a análise de imagens aéreas, das interceções e informações de fonte aberta sugeriam que Israel "não é responsável".

Os responsáveis palestinianos e vários líderes árabes acusam, no entanto, Israel de ter atingido o hospital no âmbito dos ataques aéreos em curso em Gaza. A Jihad Islâmica - um grupo rival do Hamas - negou a responsabilidade.

De acordo com o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas, centenas de pessoas terão morrido no ataque e as imagens do sangrento rescaldo provocaram protestos em toda a região.

Eis um resumo do que se sabe - e do que não se sabe.

Local da explosão mortal de quarta-feira (Ali Jadallah/Anadolu/Getty Images)

O que aconteceu no hospital?

O vídeo do momento da explosão no Hospital Al-Alhi, geolocalizado pela CNN, mostra o céu a iluminar-se quando uma grande explosão irrompe nos terrenos do hospital, lançando uma nuvem de chamas e fumo para o ar.

No edifício, o pânico instalou-se. Fadel Na'eem, chefe do departamento de ortopedia, contou que estava a fazer uma cirurgia quando uma explosão ensurdecedora soou no hospital. Segundo ele, o pânico instalou-se quando os funcionários correram para a sala de operações a gritar por socorro e a relatar a existência de várias vítimas.

"Acabei de terminar uma cirurgia e, de repente, ouvimos uma grande explosão, pensámos que era fora do hospital porque nunca pensámos que bombardeassem o hospital", disse à CNN num vídeo gravado.

Mulheres e crianças esperam por tratamento no Hospital Al-Shifa na terça-feira à noite (Abed Khaled/AP)

Na'eem revelou ainda ter-se deparado com uma cena impressionante. "Muitas pessoas foram decapitadas. Por todo o lado havia um grande incêndio. A equipa médica esforçou-se por tratar dos feridos e dos moribundos, mas a magnitude da devastação foi avassaladora. O número era tão grande e tão gigantesco que não conseguimos fazer nada."

Embora seja difícil confirmar de forma independente quantas pessoas morreram na explosão, a violência da mesma pode ser vista em imagens de rescaldo partilhadas nas redes sociais. Em fotografias e vídeos, crianças pequenas cobertas de pó são levadas a correr para serem tratadas dos seus ferimentos. Outros corpos jazem sem vida no chão.

O Ministério da Saúde de Gaza afirmou que o número de mortos é superior a 400.

O que disseram israelitas e palestinianos

Na terça-feira à noite, as autoridades palestinianas culparam Israel pelo ataque.

O porta-voz das Forças de Defesa de Israel (IDF), Jonathan Conricus, disse à CNN na quarta-feira que "as primeiras informações" são "uma prova que sustenta claramente o facto de não poder ter sido uma bomba israelita".

Israel afirma que os seus serviços de informação mostram que o responsável pelo ataque foi um "lançamento falhado de um rocket" do grupo militante islâmico Jihad Islâmica. O movimento negou estas afirmações, considerando-as "falsas e sem fundamento".

As IDF também divulgaram um áudio que, segundo as mesmas, captava uma conversa entre dois operacionais do Hamas, na qual estes falavam de um lançamento de rockets a partir de um cemitério perto do hospital. De acordo com uma tradução da conversa feita pelas IDF, um dos alegados operacionais diz: "Estão a dizer que os estilhaços do míssil são estilhaços locais e não estilhaços israelitas".

A CNN não pôde verificar a autenticidade das gravações.

Na terça-feira, as IDF apresentaram imagens que, segundo as mesmas, provam que a destruição no hospital não pode ter sido o resultado de um ataque aéreo, afirmando que não havia sinais visíveis de crateras ou danos significativos nos edifícios que resultariam de um ataque deste tipo.

Um vídeo publicado pela conta oficial do Estado de Israel na plataforma social X, na noite de terça-feira, foi também apresentado como prova de que o hospital foi atingido por rockets disparados por militantes. Mas o carimbo de data e hora no vídeo parecia não coincidir com a hora da explosão, e o tweet foi posteriormente editado para remover o vídeo.

"Recebemos o vídeo, pensámos que era de uma fonte oficial, mas quando a contactámos ele disse que o tinha obtido de outro sítio, por isso retirámo-lo", explicou à CNN o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros de Israel, Lior Haiat.

Na quarta-feira, as autoridades de Gaza também afirmaram que o Hospital Al-Ahli foi danificado por dois obuses israelitas há quatro dias, após o que as IDF avisaram a direção do hospital para evacuar as instalações. A CNN contactou as IDF para comentar a alegação.

O que sugerem os serviços secretos dos EUA

Atualmente, o governo dos EUA considera que Israel "não foi responsável" pela explosão, de acordo com o Conselho de Segurança Nacional dos EUA (NSC).

Biden, que fez uma visita de alto risco a Israel na quarta-feira, disse ao primeiro-ministro israelita Benjamin Netanyahu que os danos no hospital "parecem ter sido causados pela outra equipa". "Não por vocês."

"Mas há muita gente por aí que não tem a certeza, por isso temos de ultrapassar muitas coisas", acrescentou Biden.

Na tarde de quarta-feira, o NSC aprofundou a sua avaliação: "Os serviços de informação indicam que alguns militantes palestinianos na Faixa de Gaza acreditam que a explosão foi provavelmente causada por um rocket ou míssil lançado pela Jihad Islâmica Palestiniana (PIJ). Os militantes ainda estão a investigar o que aconteceu", disse a porta-voz Adrienne Watson.

As autoridades disseram à CNN, em separado, que as primeiras provas recolhidas pela comunidade de informação dos EUA sugerem que o ataque ao hospital foi provocado por um rocket lançado pela Jihad Islâmica Palestiniana.

Entre as provas está uma análise da explosão que sugere que foi uma explosão no solo e não um ataque aéreo que atingiu o hospital, disse uma das fontes. Não havia uma cratera única que sugerisse a existência de uma bomba, mas havia danos extensos causados pelo fogo e detritos espalhados que são consistentes com uma explosão que começou a partir do nível do solo, segundo a fonte.

Esta análise é um dos dados que levou os funcionários dos serviços secretos a considerarem que o ataque ao hospital foi um lançamento de um rocket que correu mal.

Ainda assim, a análise da explosão é apenas uma das coisas que estão a ser examinadas pela comunidade de informações, que aumentou os meios de recolha de informações para a região.

Como é que o mundo reagiu?

Vários países manifestaram o seu horror perante a perda de vidas no hospital e apelaram à prudência na atribuição de culpas até que as circunstâncias sejam claras.

As Nações Unidas apelaram a uma investigação cuidadosa. Até que investigadores independentes possam avaliar o incidente em pormenor, é pouco provável que o mundo saiba com certeza o que esteve na origem da explosão.

De acordo com um responsável israelita e outra fonte familiarizada com o assunto, Israel forneceu aos EUA informações que recolheu relacionadas com a explosão mortal no hospital de Gaza.

Vários países árabes, incluindo a Arábia Saudita, a Jordânia, o Egipto, os Emirados Árabes Unidos e o Iraque, emitiram declarações condenando Israel e acusando os seus militares de bombardearem o hospital.

Entretanto, milhares de manifestantes, gritando palavras de ordem anti-israelitas, reuniram-se no Líbano, Iraque, Jordânia, Kuwait, Egipto e Tunísia. Os protestos também abalaram a cidade ocupada de Ramallah, na Cisjordânia.

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