O projeto de lei prevê medidas mais duras para os imigrantes em França e foi bastante contestado pelos deputados e ministros da esquerda
O parlamento francês aprovou um projeto de lei de imigração que prevê medidas mais rigorosas e que reduz os pagamentos da assistência social para os estrangeiros no país, mesmo depois de vários ministros terem ameaçado com a demissão caso a lei fosse mesmo para a frente. Com efeito, e poucos minutos após a decisão, Aurélien Rousseau, que tinha a pasta da Saúde, anunciou a saída do governo.
A lei de imigração foi primeiro aprovada no Senado (com 214 votos a favor e 114 contra) e depois foi também aprovada pela Assembleia Nacional (com 349 votos a favor 186 votos contra), sendo que a extrema-direita votou a favor, colocando em cheque vários dos partidos que ainda apoiam o presidente, Emmanuel Macron.
Esta lei foi bastante contestada. As regras mais duras, que ilustram a mudança para a direita na política de grande parte da Europa, causaram desconforto entre alguns dos deputados de esquerda.
O texto acordado limita a 10 mil trabalhadores por ano, mas não bloqueia, o objetivo do Governo de regularizar os imigrantes indocumentados que trabalham em setores que não encontram mão-de-obra, como a construção ou a hotelaria. Além disso, estende-se para cinco anos a partir dos seis meses atuais, o período de espera durante o qual os imigrantes legais de países terceiros podem solicitar alojamento ou auxílio familiar.
O direito automático ao trabalho dos requerentes de asilo também é abolido (atualmente existe um período de espera de seis meses). Outro elemento é que as condições de acesso ao trabalho para estudantes estrangeiros são mais rigorosas.
Adicionalmente, estabelece-se o objetivo de criação de quotas anuais de imigração, cria-se o crime de residência ilegal em solo francês, inicialmente punível com pesadas multas, e prevê-se a retirada da nacionalidade para os binacionais que cometam determinados crimes. Por outro lado, é proibida a entrada de menores em centros de detenção administrativa para imigrantes indocumentados e são aumentadas as penas para os traficantes de imigrantes.
“O texto da imigração foi votado definitivamente”, saudou imediatamente Gérald Darmanin no X (antigo Twitter). "Uma longa luta para melhor integrar os estrangeiros e expulsar aqueles que cometem atos de delinquência. Um texto forte e firme", disse o ministro do Interior, congratulando-se por o texto ter sido aprovado “sem os votos dos deputados do RN" - ou seja, mesmo sem os 88 votos do partido de extrema-direita Rassemblement National, o projeto de lei seria aprovado.
Le texte immigration est voté définitivement. Un long combat pour mieux intégrer les étrangers et expulser ceux qui commettent des actes de délinquance. Un texte fort et ferme. Sans les voix des députés RN.
— Gérald DARMANIN (@GDarmanin) December 19, 2023
Nos partidos que apoiam o presidente Macron nem todos concordam com a nova lei: entre os deputados eleitos pelo Renaissance, 20 votaram contra e 17 abstiveram-se; no MoDem, 5 deputados votaram contra e 15 abstiveram-se; no Horizons só dois deputados votaram contra.
A aprovação resulta de um acordo alcançado esta terça-feira numa comissão mista Assembleia-Senado, em que houve uma clara maioria de direita, e que endurece a proposta inicial e é muito semelhante à que tinha sido inicialmente aprovada na câmara alta (Senado), com maioria conservadora. O ‘golpe’ ocorreu quando a líder da extrema-direita Marine Le Pen anunciou que o seu partido RN apoiaria o texto e tentou apropriar-se da sua aprovação, proclamando “uma vitória ideológica”.
Darmanin denunciou que estas declarações foram apenas “um golpe político”, uma vez que o RN finalmente cedeu à sua política de não aceitar mais imigrantes de fora da União Europeia (UE).
O acordo perturbou a ala esquerda do ‘macronismo’, e três dos ministros que representam essa tendência (Saúde, Ensino Superior e Habitação) ameaçaram demitir-se se o projeto fosse aprovado. Poucos minutos da decisão, o ministro da Saúde apresentou mesmo a demissão.
Macron convocou uma reunião de emergência no Eliseu com a primeira-ministra, Élisabeth Borne, e com os presidentes dos partidos que compõem o seu bloco, bem como com os chefes dos grupos parlamentares destas formações. Nessa reunião ficou acordado não retirar o texto alcançado, mas, em vez disso, abriu-se a possibilidade de uma segunda leitura caso o projeto fosse adiante graças à extrema-direita do RN.