Deve o meu filho comer iogurtes e pudins de proteína? A resposta é um redondo não (e temos alternativas)

26 ago 2023, 12:00
Criança a comer iogurte (Freepik)

São dos produtos alimentares da moda, mas nem assim são indicados para todos, sejam bebés, crianças ou até adultos. Mas há uma “proteína artificial” que pode até ser uma aliada na alimentação dos mais novos

Vendem-se em qualquer supermercado, têm sabores variados, são doces, encaixam na perfeição em várias receitas ‘fit’ e prometem uma média de 20 gramas de proteína por cada 100 gramas de produto. Os iogurtes e pudins proteicos estão na moda e é preciso fazer um alerta: não são para todos, muito menos para os mais pequenos.

O consumo destes alimentos por parte de bebés e crianças pode trazer riscos para a saúde - sobretudo a nível renal e hepático - devido à elevada quantidade de proteína que possuem e que excede, em muito, as necessidades diárias de uma criança que já faz uma alimentação saudável e variada. 

Não é um produto que foi feito a pensar nas crianças, foi desenhado para a alimentação de um desportista. Não considero que seja um produto bom para dar às crianças, pelo menos numa base regular”, começa por dizer a nutricionista Mariana Abecasis. 

Da mesma opinião é a nutricionista Andreia Revez: “Estes alimentos são criados, são novos, não existem na natureza, logo à partida não serão adequados a bebés e crianças”. E não hesita em dizer que o elevado teor proteico - que vem de uma proteína que é artificial - não é a única questão a ter em conta nestes produtos alimentares: “têm adoçantes químicos, que não são interessantes para nenhuma população, sobretudo a de risco como grávidas, mulheres a amamentar e crianças”.

Os sabores adocicados destes produtos e a textura agradável que têm “minam o palato” das crianças, dificultando, depois, a inclusão de outros alimentos mais saudáveis, mas menos doces. “Falamos dos dois primeiros anos de vida, é quando trabalhamos o paladar, queremos que não seja muito seletivo e que a criança tenha máximo de contacto com sabores diferentes”, explica.

Apesar de defender que a escolha para bebés e crianças deva ser o mais “natural” possível, Mariana Abecasis não vê mal que a criança experimente este tipo de produtos, mas tal tem de ser a exceção e não a regra. “Pontualmente, uma criança ver um pai comer e pedir para comer um bocadinho não é prejudicial, mas ser o snack e aquilo que consome diariamente nos seus lanches não é o ideal”.

Um único iogurte pode ter a proteína que uma criança tem de ingerir num dia inteiro 

Vamos a contas: por cada quilo de peso corporal, uma pessoa precisa de um grama de proteína, o que numa criança de 20 quilos dá cerca de 20 gramas. Um destes iogurtes e pudins é suficiente para alcançar esse valor, mas torna-se excessivo se a criança consumir carne, peixe ou ovos nas duas refeições principais, o almoço e o jantar.

Ao incluir estes iogurtes e pudins, facilmente o consumo de proteína passa a ser acima do recomendado, além de que ao privilegiar este macronutriente, há o risco de colocar a gordura e os hidratos de carbono em segundo plano, o que poderá levar a carências. 

“Acredito mesmo que algumas doenças do futuro se vão revelar por este consumo excessivo de proteína de hoje, sobretudo proteína artificial”, lamenta Mariana Abecasis, dizendo que quanto mais cedo se começar este mau hábito, pior.

Quando se come a mais de um macronutriente, consome-se a menos de outro”, diz Andreia Revez. E Mariana Abecasis completa: “vai desequilibrar o que é o balanço calórico e de distribuição dos nutrientes, que deve ser 30% de proteína, 10-20% de gordura, 50% de hidratos de carbono”.

Uma vez que a proteína “é altamente saciante”, Andreia Revez diz que há o risco de a criança ficar “com menos oportunidade para comer outros alimentos, macro e micronutrientes”. E não é por terem vitaminas adicionadas que faz deles melhores opções. “Nestes pudins e iogurtes são adicionadas vitaminas artificiais, não é a mesma coisa um micronutriente sintético de um natural, a biodisponibilidade é diferente”, continua.

Não é só a proteína que está em causa nestes produtos

Mariana Abecasis diz mesmo que a lista de ingredientes é um dos problemas destes alimentos. “Esses produtos fortificados em proteína - e não falamos em proteína pura - são produtos com edulcorantes, estabilizadores, vários aditivos para tornar o produto atrativo, a alimentação deve ser o mais natural possível”, adverte.

Nos bebés e crianças, destaca ainda Andreia Revez, o consumo de proteína deve privilegiar fontes naturais deste macronutriente, como “carne, peixe, ovos, marisco, este em timings específicos”. E a especialista diz mesmo que quer “destacar o ovo”, pois além de ser prático a consumir, “tem proteína de alto valor biológico e tem colina, temos em Portugal uma défice de consumo deste aminoácido em crianças”. A colina é uma das vitaminas do complexo B (a B8) e tem impacto na função cerebral, sobretudo a nível de memória e aprendizagem.

Para a nutricionista Mariana Abecasis, nada melhor do que “o iogurte convencional, o normal e não um iogurte proteico, se estivermos a falar de um pudim, arrisco-me a dizer que mais vale dar um pudim flan, de receita tradicional, à criança, sendo isto, claro, uma exceção e não a regra da sobremesa”. Até as gelatinas são uma melhor opção, diz.

Além disso, destaca Mariana Abecasis, “estes produtos não deixam de ser alimentos altamente processados, fala-se muito em fugir aos processados, mas com a moda da proteína as pessoas esquecem-se que é um alimentos altamente processado, até no adulto apenas é interessante em alguns casos, como em dietas de emagrecimento ou desportivas”.

E se for whey?

A proteína do soro do leite (whey) é também uma proteína a que as nutricionistas chama ‘artificial’, mas acaba por não ser tão nociva para as crianças, pode mesmo ser uma aliada em alguns casos.

“Numa criança que é ‘picky eater’, que come muito pouco, aí poderemos equacionar dividir a ingestão proteica durante o dia”, diz Andreia Revez, explicando que o uso deste produto em panquecas pode ser uma vantagem, mas se as panquecas já levarem o ovo, então a criança “não precisa da proteína do soro de leite”.

No entanto, Andreia Revez destaca que nem toda a proteína em pó é igual. E aqui o conselho é para miúdos e graúdos: a especialista sugere a compra de “proteína isolada, sem adoçantes, sem sabores” e, dependendo da pessoa e das suas intolerâncias, “poderá ou não ter lactose”. O que importa é que a lista de ingredientes seja a mais simples possível.

Ainda assim, Andreia Revez que nada como um ovo cozido e uma maçã para um snack saudável, nutritivo e saciante. E se os pais quiserem dar iogurtes, então o ideal é optar pelos naturais, que na lista de ingredientes tenham “essencialmente leite, que pode ser um leite inteiro, e sem adição de açúcar ou adoçantes”. O leite aqui pode ser de vaca, cabra ou ovelha, enumera a especialista. Quanto à questão do açúcar, esta é importante, pois grande parte dos iogurtes no mercado têm quantidades significativas deste ingrediente, como revelou recentemente um estudo britânico.

Os queijos em doses individuais são outra recomendação de Mariana Abecasis, que também é a favor do ovo, do iogurte natural e da fruta como alimentos ideais para os lanches dos mais novos (e, diz, também dos mais velhos).

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