É mesmo verdade que o cabelo cai mais no outono?

23 set 2023, 09:00
Queda de cabelo (Freepik)

OUTONO CNN. Dicas que o ajudam a viver melhor esta estação

O cenário repete-se todos os anos: terminadas as férias e já em plena rotina de trabalho, eis que parece que há mais fios de cabelo na escova e no ralo da banheira. Mas será apenas uma perceção? Nem por isso. Há, de facto, uma maior queda de cabelo depois do verão e são muitos os fatores em jogo, assim como os motivos de preocupação.

“É efetivamente uma realidade, os cabelos têm mais tendência a cair durante o outono e pensa-se que isso se deve a uma série de fatores”, diz Carlos Portinha, diretor clínico da Insparya, que adianta que esta é uma das queixas mais comuns em consultório depois do verão ou até quando chega a primavera. “Há mais cabelos a entrarem catagénese [fase de repouso] e telogénese [fase de queda] nessas alturas de grande transição de estações, verão e outono e inverno e primavera”, explica.

A dermatologista Joana Dias Coelho adianta que há, de facto, “uma maior queda de cabelo no outono e após o verão.” 

A própria ciência tem estudado este fenónemo e este estudo mostrou que a queda de cabelo está associada a mudanças sazonais. “No couro cabeludo, a proporção de folículos em anágeno [fase de crescimento] atingiu um pico único de mais de 90% em março e caiu continuamente para um mínimo em setembro”, com um pico de queda a começar em agosto, lê-se no estudo publicado na revista British Journal of Dermatology. Já um outro estudo revela a existência de uma maior queda no verão (de final de junho a final de setembro), podendo verificar-se nas semanas seguintes. Este estudo diz que a queda para no inverno e pode retomar, em alguns casos, na primavera.

Agora que se sabe que não é mito, o que causa uma maior queda de cabelo?

Além desta questão sazonal, aquilo a que Joana Dias Coelho chama de “uma queda de cabelo fisiológica”, há outros fatores que ao longo do ano podem intensificar a perda de fios - e até adensar os que já seriam normais cair no outono. 

Segundo a dermatologista, existem vários fatores que levam a um aumento da queda de cabelo, sendo o termo médico correto para isso “defluvium telogénico”. Entre os fatores mais frequentes estão “o parto, cirurgias, febre, perdas súbitas de peso, alterações tiroide, deficiência nutricional, stress intenso e alguns medicamentos”. 

A covid-19, seja a infeção em si ou a chamada covid de longa duração, é também um fator em jogo, havendo já evidência de que a queda de cabelo é uma das consequências. “Logo na primeira vaga, em 2020, comecei a aperceber-me de que vinham muitas pessoas com queda de cabelos pós-covid. Umas cerca de três meses depois, outras duas ou três semanas depois da infeção”, contou à CNN Portugal Rui Oliveira Soares, médico dermatologista e tricologista e autor do estudo Deflúvio telógeno agudo em pacientes recentemente infetados com Sars-Cov-2, que levou a cabo juntamente com a médica Ângela Rosa e que foi publicado na Revista da Sociedade Portuguesa de Dermatologia e Venereologia.

O próprio verão pode também pode impulsionar uma maior queda, como diz Carlos Portinha. “É no verão em que o cabelo sofre uma série de agressões, mais exposição ao sol, à água do mar, das piscinas, à areia, isso causa um maior dano capilar”, diz o médico, lembrando ainda a tendência para prender demasiado o cabelo nos dias de calor, causando fricção e repuxamento, o que pode levar à queda por tração, chamada alopecia por tração, por vezes irremediável. “Além disso, findas as férias de verão é o retorno ao trabalho, à rotina e ao stress e isso vai ter o seu efeito também a nível capilar”, continua o médico. 

Ao contrário do que muitos pensam, a lavagem de cabelo não é um gatilho para a maior perda de fios. Pelo contrário.

“Uma boa higiene do cabelo é importante. Existe um mito errado que a lavagem do cabelo aumenta a queda. Pelo contrário, uma boa higiene capilar reduz a inflamação no folículo e ajuda na prevenção da queda de cabelo. É importante informar da importância da higiene regular”, frisa Joana Dias Coelho.

E sobre a lavagem, Carlos Portinha vai mais longe e aconselha ainda o uso de um “champô de qualidade, sem sal, álcool e parabenos e se possível o mais natural possível”, havendo ainda opções como champô “enriquecido em ácido hialurónico, que vai ajudar a hidratar a fibra do cabelo da raiz à ponta dos cabelos”. O ideal, diz é a pessoa aconselhar-se com um especialista para saber qual o mais indicado para si.

Quando é que a queda de cabelo deve ser um motivo de preocupação?

Não há uma resposta taxativa, diz-nos os especialistas, mas há um número que ajuda a ter uma melhor noção de quando o cabelo está mesmo a cair mais. “É normal perdermos cerca de 100 cabelos por dia”, adianta Joana Dias Coelho, que diz que quando há uma queda superior a esse número “é necessário a observação por um dermatologista para estudo das causas e medicação”.

“A pessoa deve preocupar-se se o aumento não for transitório ou mesmo transitório mas muito marcado, pode haver outras doenças, como hipotiroidismo, doença renal, deficiência no aporte nutritivo ou até a alopecia androgenética”, diz o médico Carlos Portinha. No fundo, adianta, há que procurar ajuda quando “os pacientes não vêm esse cabelo recuperado”.

No caso do deflúvio telogénico, “a queda ocorre dois a três meses após o estímulo que o provoca. A massa capilar pode levar seis a 12 meses a normalizar após o estímulo ser resolvido”, explica a dermatologista. 

“É importante esclarecer que nesta queda de cabelo não há perda de folículo e que o cabelo vai recuperar. Quando estamos perante um fator causal, deve ser corrigido”, adianta a médica. 

Mas quando esta correção não acontece, então importa fazer uma avaliação, preferencialmente junto de um dermatologista ou tricologista, um profissional de saúde capaz de “fazer a análise do couro cabeludo, a tricoscopia do cabelo”, pois só assim é possível “saber se a queda é parte da renovação normal ou se há motivo para investigar outra causa”, explica Carlos Portinha.

Deflúvio telogénico não é o mesmo que alopécia androgenética.

O deflúvio telogénico é uma queda de cabelo limitada no tempo, cuja recuperação dá-se em semanas, dependendo de cada pessoa. A alopécia androgenética, por seu turno, é uma queda de cabelo mais prolongada, nem sempre recuperável ou cujo crescimento dos fios é mais complexo e vai além da paciência. É a chamada calvície.

A alopécia androgenética “tem que ver com factores como stress, factores psicológicos e, nalguns casos, associar-se a outras doenças do foro autoimune, como vitiligo, tiroidite e anemia, que é causada pela deficiência de vitamina B12”, como explicou Ana Sofia Baptista em entrevista à CNN Portugal, aquando das notícias de Jada Pinkett-Smith

Nos casos de deflúvio telogénico, nada como ter paciência e esperar que o cabelo volte a crescer. Em alguns casos, diz Joana Dias Coelho, “a ingestão de suplementos vitamínicos está recomendada”, sobretudo “quando há uma carência de alguma substância, tendo também um impacto psicológico positivo”. Carlos Portinha acrescenta a importância de manter um estilo de vida ativo e saudável e pede um maior foco na redução dos níveis de stress.

Nestes casos de alopécia, os tratamentos devem ser mais personalizados. “O minoxidil tem propriedades vasodilatadoras, a finasterida interfere na produção hormonal, bem como a espironolactona”, explicou Ana Sofia Baptista, que apontou estes como opção para tratamento.

Em alguns casos, seja de alopécia ou queda de cabelo mais acentuada, a mesoterapia capilar é uma opção. Carlos Portinha explica que este tratamento é feito com microagulhamento e um cocktail que compostos que estimulam a circulação e, por consequência, o crescimento dos fios. “Vitaminas, proteínas e sais minerais, fatores de crescimento e fatores antioxidantes que reduzem radicais livres” são alguns dos compostos que podem fazer parte do cocktail, explica o diretor clínico da Insparya, que destaca ainda o efeito promissor do “tratamento com plasma rico em plaquetas”, que tem um “efeito positivo no estado anagénico do cabelo, que é a fase de produção do cabelo”.

Saúde

Mais Saúde

Patrocinados