Engenheiros lançam traçado alternativo e “mais barato” para o TGV

11 jun, 07:00

Com o aeroporto em Alcochete, grupo de especialistas alega que a Linha de Alta Velocidade entre Lisboa e Porto deve ser alterada para a margem esquerda e quer pedir ao Governo que avalie as duas opções. Responsável da IP tem o projeto entre mãos garante, porém, que no traçado em vigor há uma solução para o ligar ao novo aeroporto

Um grupo de engenheiros elaborou um estudo prévio de traçado de TGV para ligar o Porto a Lisboa que garante ser mais eficaz e mais barato do que aquele que a Infraestruturas de Portugal (IP) pretende avançar. E apela ao Governo para que faça o mais rápido possível uma análise comparativa entre as duas opções como foi feita com o aeroporto.

Este traçado alternativo segue a margem esquerda do Rio Tejo (e não a direita como o da IP), tem cerca de 170 quilómetros, e segundo os autores, além de mais barato, encurtará as distâncias de muitas cidades do interior até ao novo aeroporto no Campo de Tiro de Alcochete – a localização que o Executivo liderado por Luís Montenegro escolheu.  

"O traçado que defendemos é melhor e terá menos custos", refere à CNN Portugal João Santos Silva, um dos engenheiros envolvidos neste projeto que apoia a mudança do traçado do TGV para a margem esquerda do Rio Tejo, onde “a morfologia do terreno é mais favorável”, evitando “túneis e viadutos que encarecem o projeto”. A ideia ganhou força com o anúncio da escolha do Campo de Tiro de Alcochete feita por Luís Montenegro no dia 14 de maio.

As grandes diferenças entre os dois traçados começam junto da zona de Pombal /Soure. Aqui, o traçado deste grupo de engenheiros corre por Leiria e em Santarém atravessa o Rio Tejo, alinhando-se aí pela margem esquerda até ao futuro aeroporto, em Alcochete, onde vai depois para Lisboa através da terceira travessia do Tejo, cuja construção também já foi anunciada. 

Já o traçado que está aprovado pela IP, quando chega a Soure segue pela margem direita do Rio Tejo até Lisboa. “O traçado da IP estava feito desde 2008, época em que o aeroporto estava previsto para a Ota. Esta nossa alternativa é, hoje, melhor para o País e mais barata. Por isso, tem de ser analisada”, refere à CNN Portugal João Santos Silva, explicando que pretendem apresentar a solução ao Executivo.

“Este grupo de engenheiros, ligados à ferrovia, há muito que defende a mudança de margem, mas o tema estava adormecido. Agora, com a decisão do novo aeroporto, ressuscitámos a ideia”, adianta João Santos Silva. 

Ao mesmo tempo, a ADFERSIT - Associação Portuguesa para o Desenvolvimento dos Sistemas Integrados de Transportes, que junta vários engenheiros, também já anunciou que defende ser urgente rever o traçado do TGV, tendo em conta a localização do NAL. "O novo aeroporto deve ser servido diretamente pela Rede de Alta Velocidade o que implicará, no imediato, a revisão dos atuais traçados da ligação Porto-Lisboa", defende a associação num comunicado, onde apela ao Governo que tome medidas. 

Uma ponte no Carregado para ligar alta velocidade ao NAL

Neste momento, o projeto do TGV da IP está previsto pela margem direita e tem três fases de execução: Porto – Soure; Soure – Carregado e Carregado-Lisboa.

À CNN Portugal, o vice-presidente da IP, Carlos Fernandes, garante, porém, que o atual traçado da alta velocidade em vigor que liga o Porto a Lisboa pela margem direita engloba soluções que mais tarde o permitem ligar ao novo aeroporto, em Alcochete, quando este for construído.

Está previsto que a meio do trajeto, na zona do Carregado, possa ser criado mais tarde, quando houver o novo aeroporto, um outro traçado que atravesse o Rio Tejo, numa ponte a construir, e que siga pela margem esquerda até ao Campo de Tiro de Alcochete, adianta à CNN Portugal o responsável da IP.

Segundo Carlos Fernandes, essa mesma linha seguiria depois para Lisboa pela terceira travessia do Tejo, que "será construída em Chelas-Barreiro". 

Mudanças de plano para a terceira fase do TGV

Mas essa será uma decisão ainda a tomar pelo Governo.  Neste momento, o que está ainda aprovado e em cima da mesa, é um traçado de TGV para ligar as duas principais cidades do País pela margem direita naquelas três fases: a primeira do Porto a Soure que já foi aprovada; a segunda de Soure ao Carregado prevista para 2026 e a terceira de Carregado a Lisboa, com data apontada para 2030.

No entanto, segundo revelou Carlos Fernandes à CNN Portugal esta terceira fase não deverá ser concretizada nos moldes iniciais. Ou seja, tudo indica que entre o Carregado e Lisboa não se vai construir uma linha nova só para o TGV, mas sim usar-se a estrutura da linha do Norte que, entretanto, vai ser quadruplicada.

Este projeto de obras na linha do Norte está agora em fase final de execução, estando previsto que seja submetido em início de 2025 ao estudo de impacte ambiental e em 2026 possa começar a ser executado, segundo dados da IP.

“Ou seja, no futuro, poderá até haver duas formas de entrar em Lisboa. Uma usando a linha do Norte; outra através do traçado que vai do Carregado ao novo aeroporto e que depois chega à capital através da terceira travessia”, explica Carlos Fernandes à CNN Portugal. Isto é, seriam como se fossem duas linhas de alta velocidade: uma na Linha do Norte que liga Lisboa e Porto. Outra pelo Carregado que passa no novo aeroporto e depois vai pela terceira travessia do Tejo para Lisboa.

Quanto ao tempo que cada uma das opções irá demorar a fazer a ligação entre Porto e Lisboa, Carlos Fernandes admite que será superior aos 1h15 minutos inicialmente previstos. 

O grupo de engenheiros alega, porém, que toda esta solução da IP assim como as obras de quadruplicação da linha são complexas e garante que o traçado que descobriu é uma alternativa “muito melhor”. “Se há uma linha que pode ir logo desde Soure pela margem esquerda não faz sentido estar na margem direita até ao Carregado e, depois, para se ir a Lisboa, passando no novo aeroporto, ter de se dar uma volta”, diz João Santos Silva, lembrando que o tempo de ligação do traçado que defendem rondará 1h20m.  

Estudo chegou a dar a opção como “mil milhões de euros mais barata”

"Trata-se de um traçado rápido, mais eficaz e mais barato", frisa ainda o engenheiro, garantindo que em 2010 chegou a fazer-se um estudo que analisava os custos das duas opções e a da margem esquerda era “mil milhões de euros mais barata". Agora, acrescenta, “mesmo que os valores tenham mudado, continuam a ser muitos milhões a menos." 

Isto porque a margem esquerda “tem a vantagem de percorrer uma orografia mais favorável do que a do outro, sendo localizado numa zona com muito menos urbanização”.  E esse fator, acreditam os engenheiros, permitiria alcançar uma poupança de milhões de euros. “A nossa opção tem uma geometria mais favorável. A linha antiga e em vigor exige mais tuneis e viadutos”, diz João Santos Silva.

Neste momento, os especialistas estão a realizar pequenos ajustes ao traçado para o atualizar e poder apresentar ao Governo. “Estamos a fazer as últimas atualizações no estudo” uma vez que começou a ser realizado há vários anos e agora é necessário verificar se é preciso corrigir dados, resultado de novas urbanizações que tenham surgido. Segundo recorda o engenheiro, a ideia de mudar o traçado para a margem esquerda começou a ser lançada em 2010, depois de ter surgido o projeto de construção do aeroporto em Alcochete, apoiado pela CIP e pela AFDER.

Engenheiros querem nova comissão técnica   

Por outro lado, e além de mais barato e eficaz, estes engenheiros defendem que este traçado alternativo passa num circuito que permite que localidades do interior como Santarém, Entroncamento, Tomar, Abrantes, Castelo Branco, Covilhã e Guarda possam ter um acesso rápido ao novo aeroporto.

Já o vice-presidente da IP, Carlos Fernandes, lembra que um estudo de traçado completo “implica anos e anos de trabalho”, recorda que o projeto da Alta Velocidade “foi definido para passar exatamente por Leiria”, uma região que não tem serviço ferroviário, e conclui que “passar noutros locais e noutras cidades seria outro projeto”.

Para tentar lançar um debate sobre esta questão, a ideia destes engenheiros é criar, em breve, um grupo de reflexão ainda mais alargado com vários especialistas para que se comece a discutir no país a possibilidade de o traçado do TGV ser mudado. “O Governo tem de comparar e avaliar as duas opções”, refere Santos Silva, sugerindo que essa análise possa ser de novo ser realizada pela comissão técnica independente liderada por Maria do Rosário Partidário.

O mesmo exigem os engenheiros da ADFER que notam não existir no plano aprovado "qualquer variante na Rede de Alta Velocidade que contemple a acessibilidade ferroviária direta a um aeroporto internacional localizado em Alcochete"

"Torna-se, pois, absolutamente urgente corrigir essa lacuna do Plano Ferroviário Nacional, correção essa que o Governo deverá promover de imediato", dizem os responsáveis da ADFER-SIT, sublinhando que a solução de traçado  de alta velocidade prevista para a nova linha Porto/Lisboa "mantém, inexplicavelmente, a que havia sido definida para a antiga localização na Ota".

O grupo de engenheiros lembra  que Portugal está ainda a tempo de "debater e corrigir", uma vez que o traçado a mudar é aquele que ainda não foi lançado oficialmente. Neste momento o projeto da Alta Velocidade dentro do país está em curso, mas apenas foi aprovada a primeira fase que vai do Porto até Soure – que parece unânime entre todos.

Segundo dados oficiais do Estado, esta fase inicial “compreende o troço entre o Porto e Soure e tem um investimento de cerca de 3.550 milhões de euros. E engloba dois troços: um de 71 km que foi lançado em 12 de janeiro de 2024 e liga Porto a Oiã, no concelho de Oliveira do Bairro; seguindo-se um outro que irá unir esta zona a Soure, previsto para ser lançado em julho.

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