Serviços secretos dos Estados Unidos previram planos de invasão à Ucrânia. Fez alguma diferença?

25 fev 2022, 13:13
Ucrânia: a normalidade no meio do conflito (Pierre Crom, Getty Images)

A invasão da Rússia à Ucrânia ocorreu em grande parte como o governo de Biden previu. O sucesso da informação adquirida pelos norte-americanos foi um dos desdobramentos mais marcantes da crise e teve um impacto real na linha da frente de combate na Ucrânia. Esta sexta-feira, Kiev acordou com o som de explosões e com o avançar de militares russos

Os serviços secretos dos EUA desvendaram o plano de guerra de Putin e conseguiram avaliar com precisão as intenções da Rússia de prosseguir com uma invasão militar à Ucrânia. Durante meses, a Casa Branca fez revelações altamente incomuns sobre os planos do presidente russo, Vladimir Putin, de atacar a Ucrânia. Na esperança de impedir uma invasão, Washington divulgou detalhes da presença de tropas russas na fronteira e repetiu os alertas de que um grande ataque era iminente.

Ainda que esteja a desempenhar um papel importante na linha da frente do conflito, representantes no Senado norte-americano acreditam que o trabalho que foi desenvolvido pelas secretas não foi o suficiente para impedir o avanço de uma guerra e que os Estados Unidos deveriam ter fornecido à Ucrânia armas mais letais e capacidade de defesa aérea com antecedência.

Exército ucraniano faz operações militares em Kiev (Emilio Morenatti/AP)

Críticos dos serviços secretos norte-americanos - incluindo funcionários russos que afirmaram que as alegações de invasão eram fantasia - apontavam para falhas do passado, como a falsa identificação de armas de destruição em massa no Iraque. Mas a invasão da Rússia, até ao momento, parece corresponder às previsões que Biden tem feito desde dezembro.

Vários representantes democratas e republicanos do Senado disseram esta quinta-feira que a precisão das informações recolhidas são um elogio aos serviços secretos dos EUA. No entanto, alguns senadores assumem mesmo que Washington e Kiev poderiam ter feito mais com as informações que os dois governos possuíam de antemão.

Ao anunciar novas sanções contra a Rússia na quinta-feira, o presidente Joe Biden citou as medidas de seu governo para alertar sobre o que se sabia à cerca das intenções de Putin. “Compartilhámos evidências desclassificadas sobre os planos da Rússia e falsos pretextos, para que não houvesse confusão sobre o que Putin está a fazer”, disse o chefe de Estado. “Putin é o agressor. Putin escolheu esta guerra. E agora ele e o seu país vão ter de lidar com as consequências”, acrescentou.

O senador Mark Warner, um democrata eleito pelo estado da Virgínia e que preside ao Comité de Inteligência do Senado, observou vários resultados da campanha pública dos EUA contra os planos da Rússia, nomeadamente o enfraquecimento de qualquer movimento potencial de Putin para criar uma operação de “bandeira falsa” e justificar a guerra, minando qualquer golpe potencial em Kiev escondido da opinião pública.

“Os serviços secretos geralmente não gostam de partilhar informações; querem mantê-las perto”, disse Warner durante uma entrevista à Associated Press. “O que fizeram foi atrasar o timing russo da invasão. Eles também, eu acho, permitiram-nos construir esta coligação que é praticamente sem precedentes”, sublinhou, referindo-se aos vários países ocidentais que aderiram às sanções contra a Rússia.

Mike Turner, o principal representante republicano no Comité de Inteligência, referiu que a desclassificação de informações pelo governo Biden foi “incrivelmente importante”. “Impactou a visão da comunidade internacional sobre Putin e atrasou as suas ações”, revelou Turner que salientou que o principal objetivo da divulgação dos dados relativos às tropas russas foi o de permitir que a Ucrânia tivesse tempo para planear a defesa.

Porém, Turner disse também que a Casa Branca deveria ter fornecido armas mais letais e capacidade de defesa aérea à Ucrânia com antecedência, sublinhando que Biden “estava inicialmente relutante em fornecer algumas de suas descobertas de inteligência a Kiev”.

Destroços da aeronave russa abatida por forças militares ucranianas (AP Photo/Oleksandr Ratushniak)

Ainda assim, de acordo com a Associated Press, que cita fontes ligadas à inteligência dos EUA, Washington e Kiev “estiveram frequentemente em desacordo público e privado sobre a natureza da ameaça russa e o que precisava ser feito”. Isto materializou-se porque, durante meses, Zelenskyy tentou minimizar publicamente as advertências americanas de um grande ataque iminente. O presidente ucraniano também não convocou os seus militares na reserva até esta quarta-feira, data em que também anunciou um estado de emergência de 30 dias.

“A única área em que talvez pudéssemos ter sido mais eficazes era no sentido de convencer os próprios ucranianos a mobilizar ainda mais as suas tropas, incluindo os seus militares na reserva. Não estou a dizer que isso teria conseguido impedir uma invasão russa. As forças russas são tão esmagadoras. Mas poderia ter permitido um melhor esforço de luta”, afirmou Warner na quinta-feira. 

Um funcionário do governo ucraniano que falou sob condição de anonimato ao jornal The New York Times afirmou que Kiev sabia, há cerca de duas semanas, que a Rússia iria prosseguir com a invasão, mas que o governo reprimiu publicamente as preocupações para limitar os danos à economia da Ucrânia. “Qualquer mobilização em massa das forças ucranianas poderia ter dado um pretexto adicional a Putin, que repetidamente e falsamente alegou que a Ucrânia estava a planear atacar partes do Donbas controladas por separatistas”, indicou a fonte ao jornal norte-americano.

Europa

Mais Europa

Mais Lidas

Patrocinados