“Fui despejada com um bebé nos braços. Vivo numa pensão”. A história de Daisy e de outros milhares que saíram à rua para pedir casa digna a preço digno

Wilson Ledo , Com Lusa
30 set 2023, 19:58

Protestos em 24 cidades resumiram aquilo que é preciso: mais casas, mais salário, rendas e prestações mais baixas

Daisy percorre a Almirante Reis, em Lisboa. Ela é um dos rostos de uma crise que há muito reclama soluções. Foi despejada com um bebé de três meses nos braços. Cinco meses depois, ainda não conseguiu encontrar um sítio onde morar. “Não encontrei casa que possa pagar”. Para isso, tem de comer todos os dias fora, no “Pingo Doce”. E abdicar da presença de uma outra filha mais velha. “Tenho que estar a pedir a casa de alguém, porque não permitem que a minha filha more comigo”.

Como Daisy, milhares exigiram em Lisboa um direito básico: o da habitação. E para isso, dizem, só há um caminho: medidas mais rápidas e eficazes do Governo de António Costa.

Nos cartazes, cada um quis expressar-se como melhor sabia. “A casa custa, queremos uma vida justa”, “Onde estão as casas de quem faz as casas?”, “O vosso lucro é a nossa miséria”, “Mais baldios, menos senhorios”, “Senhorio não é profissão”.

Catarina Bio é estudante universitária e sabe bem como é viver sem perspetivas de futuro. “Não é possível que numa cidade com tantas casas, existam tantas pessoas que tenham que morrer na rua”, diz. O que o Governo tem prometido, diz, é uma “fachada” ou “penso rápido”.

O país saiu à rua em 24 cidades para pedir casa, para pedir tetos. Aveiro, Braga, Coimbra, Covilhã, Guimarães, Lagos, Leiria, Portimão, Viseu, Samora Correia e Alcácer do Sal. Em todas a mesma queixa: os salários não permitem cobrir a forma como as rendas têm vindo a escalado, de forma vertiginosa, nos últimos anos.

(Lusa)

Porto

No Porto, pelo menos oito mil pessoas tomaram a mítica rua de Santa Catarina. Gritos de protesto, na expectativa de chegarem a quem decide: “A habitação é um direito, sem ela nada feito", "A casa é para morar, não é para especular", “Nem gente sem casa, nem casa sem gente”.

Os turistas, encarados como muitos como um dos motivos para a pressão nos preços, com muitas casas destinadas a alojamento local ou para receber nómadas digitais, desta vez, ficaram só a observar.

Gisela Ferreira, de 42 anos, fez 15 candidaturas a autarquias para tentar ter uma casa. “Fazemos todo o preenchimento e não há respostas de nada, nem 'feedback' de nada", lamenta. É funcionária pública há 20 anos, leva 800 euros mensais. A família tem três pessoas e está à procura de casa “há dois anos” em Vila Nova de Gaia. Há um ano, a renda duplicou. E, com a falta de oferta a preços que consiga pagar, deposita esperança na habitação social.

(Lusa)

Faro

Em Faro, no início do protesto, mais de uma centena juntou-se pelos mesmos motivos: “baixem as rendas, subam os salários”

Ana Tarrafa, represente do movimento Porta a Porta, um dos envolvidos na organização deste protesto nacional, confessou que a adesão “superou as expectativas, numa região onde o turismo acentua a falta de casas para arrendamento, para médicos, professores e estudantes, entre outros".

Hoje, a CNN Portugal mostra que há vários anúncios a permitir o alojamento na região, mas com o aviso de que será necessário sair até março, coincidindo com o período de chegada de mais turistas, com o calor.

E a conclusão é simples para Ana Tarrafa: “reflete-se no problema de atrair e fixar profissionais para diversos setores de atividade”, como na saúde.

Esquerda junta-se ao protesto. Direita acaba apupada

Em Lisboa, vários representantes da esquerda juntaram-se ao protesto, para criticar a atuação do executivo.

A bloquista Mariana Mortágua defendeu que as manifestações são uma forma de pressionar o Governo de maioria absoluta do PS a resolver problemas como o da habitação, acabando antes por se “juntar à direita que defende a especulação”.

Já o PCP, com o secretário-geral Paulo Raimundo, criticou a falta de respostas para este “drama social”, avisando que “há pessoas que já não aguentam mais as rendas, o brutal aumento das prestações”.

Já o deputado único do partido, Rui Tavares, considerou que o país está perante "uma emergência na habitação" e defendeu que seja criada "uma ajuda" para as pessoas que estão a pagar prestações de casa "sempre a aumentar” e que isso “tem que vir dos bancos”.

A ex-deputada do Partido Ecologista “Os Verdes” Heloísa Apolónia argumentou que a “habitação não é uma mercadoria, é um direito constitucional consagrado”. O vice-presidente do Volt Portugal Duarte Costa considerou que “falta ao Governo liderança na criação de mais habitação pública”.

No início da manifestação, três deputados do Chega marcaram presença, mas após apupos, acabaram escoltados pela PSP para fora do local.

(Lusa)

 

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