Imprensa estatal russa garante que é por “segurança”. Testemunha relata à BBC que a situação é "muito assustadora"
Os soldados russos presentes nas regiões ocupadas da Ucrânia estão a ir porta-a-porta para recolher os votos dos eleitores dos referendos para a união com a Rússia.
A informação foi avançada pela agência estatal de notícias Tass, que diz que, por “razões de segurança”, o voto presencial apenas ocorrerá no dia 27 de setembro, o último dia de votação dos referendos nas autoproclamadas repúblicas populares de Donetsk e Lugansk e nas regiões de Kherson e Zaporizhzhia.
À BBC, uma habitante de Zaporizhzhia, que não se quis identificar, revelou que a situação é "muito assustadora". "Tens estas pessoas armadas que vêm a tua casa e causam apenas medo. Escrever um 'não' é muito assustador quando temos militares ao nosso lado a segurar em armas", conta.
"Não sei quem tem a coragem de dizer não a tais pessoas. Não vou votar nem participar nisto de todo. Vou tentar fingir que não estou em casa. Espero que ninguém venha à minha procura", admitiu a ucraniana.
Nas repúblicas pró-russas, diz a Tass, os boletins de voto estão apenas em russo, dado ser a única língua oficial adotada pelos territórios leais ao Kremlin. Em Zaporizhzhia e Kherson, para além da língua russa, os boletins estão também em ucraniano.
Também a pergunta colocada difere. Aos habitantes de Donetsk e Lugansk será perguntado se querem que a república se torne numa divisão federal da Rússia. Em Kherson e Zaporizhzhia, por seu turno, os eleitores terão de decidir se querem a separação da Ucrânia, a criação de um país independente e subsequente união com a Rússia.
A imprensa estatal russa diz também que os habitantes destas regiões que tiveram de fugir para a Rússia “devido aos bombardeamentos e atos subversivos ucranianos” poderão votar em locais de voto criados na Rússia.
A Tass destaca ainda que as quatro regiões se comprometeram com a “máxima transparência”, e que todas estão abertas à presença de observadores internacionais.
Referendos considerados uma "farsa"
No entanto, a Ucrânia já rejeitou considerar estes referendos válidos. O presidente ucraniano Volodymyr Zelensky classificou as consultas públicas de “farsa”, o mesmo termo utilizado por Joe Biden. "Os Estados Unidos nunca reconhecerão o território ucraniano como algo que não seja parte da Ucrânia. Os referendos da Rússia são uma farsa - um falso pretexto para tentar anexar partes da Ucrânia à força em flagrante violação do direito internacional, incluindo a Carta das Nações Unidas", disse Biden, em comunicado citado pela CNN.
Em Nova Iorque, onde se deslocou para a Assembleia-Geral da ONU, o ministro dos Negócios Estrangeiros João Gomes Cravinho referiu que os referendos “não serão reconhecidos por ninguém”. “Naturalmente, estes referendos são completamente ilegais e não serão reconhecidos por ninguém. A Rússia já levou a cabo este tipo de estratégia em outros contextos, nomeadamente na Geórgia, mas não haverá nenhum tipo de reconhecimento internacional”, disse.