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«Portugal já é temido por toda a gente»

29 ago 2000, 21:06

Costinha e a selecção nacional Depois do que fez no Euro-2000, Costinha recebeu a convocatória de António Oliveira com naturalidade. O médio português já se considera «opção válida» neste grupo, defende a manutenção da estrutura do último Campeonato da Europa e traça a meta para 2002: conseguir «rapidamente» o apuramento e colocar a fasquia «bem lá em cima».

- Depois do sucedido no Europeu, com um novo seleccionador no cargo, você volta a aparecer, sem surpresa, na lista dos convocados para a equipa nacional. É da confirmação de um estatuto que se trata?

- São etapas na carreira de um jogador, que uma vez ultrapassadas não devem voltar atrás. A primeira foi afirmar-me como titular num grande clube, como o Mónaco. Depois disso, claro que uma pessoa aspira sempre a mais qualquer coisa. Essa qualquer coisa, para mim, foi o ir à selecção. Depois, o ir ao Europeu. E assim por diante... 

- Você foi talvez uma das raras excepções à quase unanimidade dos 22 para o Europeu. Sentiu isso?

- Muita gente questionou a minha ida, e até certo ponto compreendo isso, por não ser um jogador muito conhecido em Portugal. Mas acho que desempenhei bem o meu papel, e depois disso sinto-me mais exposto aos olhos das pessoas. Por isso acho natural que agora se confirme o tal estatuto, não digo de indiscutível, mas de mais uma opção válida para ajudar a selecção. 

- Foi fácil integrar-se na equipa?

- Antes do mais, além de um conjunto de jogadores muito fortes, estamos a falar de um grupo de gente muito especial. Confirmei tudo aquilo que pensava deles, para o bem, e qualquer impressão negativa que eu pudesse ter de alguém foi imediatamente apagada. São 22 grandes homens. 

- O que começou por ser uma aposta pessoal de Humberto Coelho transita agora para os planos de António Oliveira. Sente dever isso ao Europeu?

- Acho que esta chamada tem alguma lógica. Tenho consciência de estar a trabalhar bem e a tentar mostrar que posso fazer parte de um grupo de 20/22 seleccionáveis. Mas sei que se não estiver a jogar no meu clube isso não será possível. De resto, acredito que o novo seleccionador tenha estado atento ao que se passou no Europeu. Aliás, parece-me estar em marcha uma ideia de continuidade, aproveitando a mesma estrutura, enquanto esta continuar a dar frutos. Olhando para trás, penso que fizemos uma «boa campanha», embora coloque essa definição entre aspas. 

- Por quê?

- Porque não vencemos. Uma boa campanha, sem aspas, seria a conquista do título. Estivemos lá perto, mas não considero que tenhamos feito um grande campeonato, porque não fomos até ao fim. No mais, o nosso profissionalismo, o nosso empenho, estiveram sempre em campo. Depois, foi pena que não nos tivessem deixado ir mais longe. 

- Passados dois meses sobre a meia-final mantém essa ideia, lançada um tanto a quente?

- Já tenho tido várias conversas a esse respeito, até com colegas meus, franceses. A frio, embora ache que a mão do Abel não foi intencional, até admito que seja «penalty», porque a bola se encaminhava para a baliza. Mas o mais doloroso, para nós, é saber que numa meia-final entre a França e a Alemanha ou a França e a Inglaterra, nenhum árbitro assinalaria a falta naquelas circunstâncias. Nesse domínio continuamos a ser um país com pouco poder. Mas vamos tentar mudar isso com o nosso futebol. 

- Portugal foi a melhor equipa do Euro-2000?

- A melhor equipa foi a França, porque venceu. Mas Portugal demonstrou logo à partida, num grupo onde nos davam como antecipadamente derrotados, que tem jogadores para fazer a diferença em qualquer competição. A vitória frente à Inglaterra, depois de estarmos a perder 2-0, foi a grande mola para as exibições que fizemos a seguir. Deixámos de ser aquela equipa que jogava bem e não marcava. Nesta altura, já somos temidos por toda a gente. Éramos uma potência adormecida, espero que tenhamos deixado de o ser de uma vez por todas. 

Previsões para 2004 dão-me vontade de rir 

- Como é que viveu a demissão de Humberto Coelho, no fundo o seleccionador que apostou em si? Era esperada?

- Da minha parte receava um pouco que isso fosse acontecer. Havia muita controvérsia nos jornais, muito «fica-não fica», muita contestação. Acho que Humberto se cansou de tantos rumores e tomou a atitude que considerou melhor. Saiu «em grande», depois de uma boa prova. É sempre triste quando um treinador se desliga de uma equipa, mas resta-me desejar-lhe as maiores felicidades. É um treinador com carácter e, no meu caso pessoal, foi uma honra trabalhar com ele. 

- No primeiro jogo da Selecção pós-Europeu já houve alguma mudança significativa na orientação da equipa?

- Penso que o seleccionador vai prosseguir na mesma linha. Vendo bem, a base deste grupo está feita pelo menos desde 1996. Entraram quatro ou cinco nomes novos, nos quais me incluo, mas a espinha dorsal é a mesma. E penso que o modelo de jogo também, a não ser que os resultados deixem de ser bons. Neste momento temos um bom sistema, bem aceite pelos jogadores, e óptimos intérpretes para o colocar em prática. 

- Não concorda, então, com a necessidade de renovar, tendo em vista o Euro-2004?

- Dá-me vontade de rir quando ouço as pessoas falar no Fernando Couto e em outros que «em 2004 não vão lá estar». Não sei porquê! Vejo jogadores com 38 anos em Mundiais e Europeus. Não sei por que razão o Fernando, o Paulo Bento, o Dimas não podem fazer um grande Europeu aos 35. Aos 36 anos ainda se pode jogar ao mais alto nível. Ou aos 40, como o Roger Milla... Ninguém pode dizer que em 2004 este ou aquele não vão estar na selecção, tal como o contrário também é verdade em relação aos mais novos. Quem me diz que eu, então com 29 anos, estarei na equipa em 2004? 

-Não vale a pena mexer, é isso?

-Há que deixar as coisas correr, não vale a pena fazer já equipas para o futuro. Há que viver o presente, trabalhar com estes jogadores. Embora seja certo que em 2003 haverá outros com legítimas pretensões, mas uma coisa de cada vez. Até porque há nisto tudo alguma falta de respeito para com certos jogadores, que sabem melhor do que ninguém até onde podem ir. 

Treinar no Mónaco os golos da selecção 

- Assumindo que um grande Europeu teria sido a conquista do título, onde está a fasquia para o Mundial-2002?

- Temos de definir os nossos objectivos sempre pelo mais alto possível, conjugando essa atitude com a humildade. Este grupo tem uma atitude ganhadora, e acho que ninguém entrou no Europeu sem pensar a sério em ganhá-lo. E acredito que essa mentalidade vai manter-se em 2002, porque só a pensar assim é que se fazem grandes equipas. Vamos entrar nas eliminatórias para tentar ganhar o grupo, rapidamente, confiando em nós próprios, para depois colocar a fasquia bem lá em cima. Estes jogadores nunca estiveram num Mundial sénior e têm, temos, consciência de como seria bonito consegui-lo.  

- Depois deste Europeu já é difícil as pessoas satisfazerem-se com o facto de Portugal estar numa fase final...

- Claro, tem de ser encarado com normalidade. Quando vejo jogadores como o Figo, o Rui Costa, o Fernando, o Sérgio, o João Pinto e tantos outros, fora de um Mundial, fico triste não só por eles mas também pelo futebol. Esta é a altura certa para isso mudar. 

- O castigo a Paulo Bento vem abrir uma vaga na posição que também é a sua. A sua afirmação como titular está mais fácil?

- Não, as pessoas não se podem esquecer que há ainda o Fernando Meira, o Paulinho Santos, o Calado. Estando ou não o Paulo Bento, todos sabemos que é quem trabalhar mais para isso que vai conquistar um lugar. Ninguém vai à selecção passar férias. E de qualquer maneira tenho pena pelo Paulo, um grande jogador e óptimo profissional. Aliás, nenhum dos três castigados na selecção merecia a punição que teve. 

- É inevitável falarmos «daquele» golo à Roménia. Aqui no Mónaco já me disseram que a selecção deve agradecer ao seu clube, uma vez que foi lá que você trabalhou esse tipo de lances. É verdade?

- Curiosamente, em duas épocas seguidas fomos a Nancy ganhar por 2-1. O segundo golo foi meu, das duas vezes, e sempre no último minuto, de cabeça, após um livre. Mesmo não sendo muito alto, o jogo de cabeça é um dos meus pontos fortes. E é verdade que no Mónaco sempre se trabalharam muito os livres em função de mim, do Marquez e do Trezéguet. Pessoalmente, nunca consegui muitos golos, mas trabalhei muito a movimentação, contribuí para um bom punhado deles. E, felizmente, foi um trabalho que deu frutos mais tarde. Nem sempre as coisas acontecem quando as esperamos. 

- Se esse golo não mudou a sua vida, pelo menos mudou a maneira de as pessoas olharem para si...

- Sim, até porque ajudou o meu país a passar aos quartos-de-final. Mas não só. Proporcionou um terceiro jogo, com a Alemanha, muito mais tranquilo, que além disso permitiu a outros jogadores actuarem os 90 minutos. Foi bom para todos que o Sérgio, o Capucho, o Pauleta, eu próprio e muitos outros tivéssemos essa oportunidade para mostrar o nosso valor. A nossa campanha ficou valorizada com isso.

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