Moderados vs liberais? Pro-Costa vs anti-Costa? Na sucessão, a divisão não é assim tão linear, com alianças que rasgam o passado

14 nov 2023, 07:30
Congresso da Associação Nacional de Autarcas Socialistas

Socialistas insistem que o foco está num projeto para o partido e para o país. Mas não deixam de "contar espingardas"

Em política, nada nunca é linear. E a organização de forças para a sucessão do PS comprova isso mesmo. Os militantes argumentam que a tradicional divisão moderados-radicais deixou de fazer sentido no seio socialista.

De uma forma simples, o confronto é entre os que apoiam a continuidade das políticas levadas a cabo por António Costa trazida pela candidatura de José Luís Carneiro e os que alinham pela “ideia de renovação e de combate” corporizada por Pedro Nuno Santos.

Comecemos por Pedro Nuno Santos, conotado com uma ala mais à esquerda, radical, do PS. Houve um tempo em que chegou a defender que Portugal não deveria honrar os compromissos com os credores internacionais. Entretanto, o discurso foi-se moderando. Entre os seus feitos políticos encontra-se a geringonça, sendo ele o negociador-mor com o Bloco de Esquerda e PCP.

E tudo isto parecia muito linear se o ex-ministro das Infraestruturas e Habitação não tivesse como um dos principais apoiantes Francisco Assis, mais conotado com a ala liberal e forte crítico da geringonça criada por António Costa. A seu lado terá também Ascenso Simões, forte crítico da atuação do Governo de Costa, que favoreceu este encontro.

Já José Luís Caneiro, com uma visão moderada, chegou a criticar António Costa quando este desafiou a liderança de António José Seguro. Mas hoje, embora mantenha uma ligação aos chamados seguristas, é visto como o nome que daria continuidade natural à governação de António Costa, tirando percurso de um percurso enquanto governante livre de polémicas, antes pacificador, após o trabalho atribulado do antecessor Eduardo Cabrita.

Os militantes ouvidos pela CNN Portugal insistem que, mais do que uma divisão entre alas, entre moderados e radicais, está em causa um projeto de futuro para o PS e para o país.

“Não estamos a falar de guerra, de divisão, estamos a falar de formas diferentes formas de fazer política”, diz Walter Chicharro, presidente da federação de Leiria, apoiante de Pedro Nuno Santos.

“Esta questão da divisão não se coloca. O que o PS precisa é de uma liderança afirmativa, robusta, que coloca um espírito de rejuvenescimento. Aquilo que se trata de pragmatizar é uma liderança que reúna todas as alas”, reitera Luís Testa, líder da federação de Portalegre, apoiante de Pedro Nuno Santos.

Outros militantes ouvidos pela CNN Portugal confirmam a “forte mobilização” em torno da escolha do próximo líder, que precisa de ser “combativo” perante as dificuldades que aí vêm. “A divisão no partido é entre continuidade e renovação”, afirma um deputado. Há mesmo quem argumente que “a divisão entre moderados e radicais deixou de fazer sentido. O PS é único e não há ninguém radical”.

João Soares, que já demonstrou publicamente o apoio a Pedro Nuno Santos, por considerar que está “mais bem colocado”, apesar da amizade com Carneiro, também descarta esta divisão linear dos candidatos à liderança pela ideologia que defendem. “Nem Pedro Nuno Santos é esquerdista nem José Luís Carneiro é direitista. Diria que não há divergências sérias entre uns e outros”, argumenta.

Pedro Nuno Santos (Lusa)

Onde estão os trunfos de cada um?

Na hora de fazer análise, a visão de quem está dentro e fora do partido coincide. O socialista Adalberto Campos Fernandes, comentador da CNN Portugal, admite que “a proximidade da máquina partidária é uma vantagem”. Neste caso, para Pedro Nuno Santos, que “há muito se prepara para este caminho”.

“Para mim, mais importante que contar espingardas, era apontar ideias e refletir sobre o posicionamento do PS”, aponta, lamentando que em momentos “difíceis” como este acabe por predominar “o juízo das claques”.

A politóloga Paula do Espírito Santo explica que Pedro Nuno Santos está a apostar em “grandes figuras do partido que estão em segundo plano”, como Francisco Assis, que tragam esse sentido mais crítico do próprio partido e um projeto alternativo ao atual. O risco para o ex-ministro, descreve, está na falta de transparência na polémica sobre a indemnização de meio milhão na TAP, que acabou por ditar a sua demissão.

Já José Luís Carneiro, além de nomes pesados do Governo, está a “conseguir um trabalho mais autárquico”, sobretudo a norte e no interior do país, “longe dos centros urbanos”, tirando partido do seu percurso e da sua imagem “conciliadora”, reforçada pelo facto de ter conseguido escapar a polémicas numa das pastas mais sensíveis, a Administração Interna. Mas isso, diz, implica um risco: acabar por ser visto como um candidato “regional”.

José Luís Carneiro (Lusa)

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