IGAS esperou um mês para ter acesso à troca de mensagens sobre o tratamento das crianças e só o teve devido a uma queixa da TVI/CNN Portugal
Os documentos que a Presidência da República recusou entregar à Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS), durante a primeira fase da realização do relatório sobre o tratamento das gémeas luso-brasileiras, nunca estiveram em segredo de justiça.
É isso que diz o parecer aprovado em janeiro, por unanimidade, pela Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), depois de uma queixa da TVI/CNN Portugal que pretendia ter acesso aos mesmos documentos pedidos pelos inspetores da saúde.
O parecer com data de janeiro, que teve 11 votos a favor - de todos os membros da CADA -, explica que "uma coisa é o acesso a inquérito ou a processo penal, outra coisa é o acesso à documentação de que dispõe a entidade administrativa", numa posição presente em vários outros pareceres sobre temas semelhantes de acesso a documentos públicos que também tinham sido entregues a autoridades judiciais no âmbito de inquéritos-crime em segredo de justiça.
"No presente caso", continua o documento, falando sobre os documentos das gémeas, "não há qualquer posição do Ministério Público no sentido de obstaculizar o acesso à documentação administrativa".
Segundo o parecer, "a autoridade judiciária informou que o processo de inquérito se encontrava sujeito a segredo de justiça, mas nada referiu quanto à extensão do segredo aos documentos administrativos em poder da entidade requerida", ou seja, da Presidência da República.
Presidência da República condicionou inspeção da saúde
Recorde-se que no relatório sobre as gémeas conhecido esta semana a IGAS acusa a Presidência da República de ter condicionado o trabalho dos inspetores por ter recusado fornecer, durante cerca de um mês, os documentos pedidos a Belém sobre o caso.
Em declarações esta sexta-feira aos jornalistas, Marcelo Rebelo de Sousa justificou-se com o Ministério Público que segundo o Presidente "considerou que havia segredo de justiça".
Parecer pedido pela TVI/CNN Portugal (e não pela Presidência)
Nas declarações aos jornalistas, Marcelo também disse que foi a Presidência da República que pediu um parecer à CADA sobre o assunto para saber o que fazer, apesar de este parecer ter sido pedido pela TVI/CNN Portugal depois da recusa de Belém em dar acesso aos e-mails sobre o caso das gémeas trocados entre o Presidente, os serviços da Presidência e o filho do Presidente.
Isso mesmo é aliás referido pelo relatório da IGAS: "Apenas em 23 de janeiro de 2024 a referida documentação foi remetida a esta Inspeção-Geral, com indicação de que, no seguimento de um parecer da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos, tinha sido dado acesso à mesma a um jornalista".
Até ao parecer suscitado pela TVI/CNN Portugal pela recusa de Belém em dar acesso aos documentos/e-mails arquivados na Presidência da República, a IGAS enfrentou a recusa da Casa Civil de Marcelo de Rebelo de Sousa no acesso a qualquer documento sobre as gémeas luso-brasileiras tratadas no Hospital de Santa Maria.