Decisão 22: O horário da função pública pode voltar às 40 horas?

Qua, 19 jan 2022

Vamos conversar. Escreva-nos nas redes sociais da CNN Portugal com questões e temas sobre as eleições legislativas

Pode o horário da função pública regressar às 40 horas semanais? Um leitor quis saber e nós encontrámos a resposta entre “raspadinhas” no meio de uma rua de Viseu, no dia em que ficou decidido que os isolados poderão sair de casa para votar e mais de duzentos mil já se inscreveram para o voto antecipado. Olá.

RUI MINDERICO/LUSA
Quem conduz quem? (Foto de Rui Minderico/Lusa)

Do isolamento ao voto democrático

Finalmente a decisão: os isolados e infetados com covid-19 vão poder votar no dia 30. A recomendação é de que o façam entre as 18:00 e as 19:00 – e de que não usem os transportes públicos na deslocação.

 

É bom saber que não estamos a inventar a roda: República Checa, Islândia, Croácia, Países Baixos, Nova Zelândia, Noruega, Espanha, Alemanha e Israel já organizaram eleições com inovações adaptadas à pandemia, que correram genericamente bem. O caso de Israel, contudo, mostrou que mesmo a organização não resolve problemas anteriores com elevados níveis de abstenção. Como acontece em Portugal.

 

“Onde ficam os direitos de quem está nas mesas de Voto?”, pergunta o leitor Walter Sério Sénior. A resposta veio hoje da diretora-geral da Saúde, Graça Freitas: quem estiver nas mesas de voto terá "equipamento de proteção individual reforçado, nomeadamente utilizarão bata, uma máscara cirúrgica ou máscara FP2, conforme a sua capacidade de usar uma ou outra".

 

Para memória futura fica a atraso com que tudo foi feito, mostrando mais uma vez como o governo é bom a improvisar e mau a planear. Portugal já organizou três eleições em pandemia, sabe destas eleições há mais de dois meses – e só a 11 dias é que há decisão sobre como votar.

Respostas aos leitores

perguntario

Recebemos a sua pergunta e colocámo-la diretamente a Rui Rio. Em Viseu, numa arruada entre “raspadinhas políticas” oferecidas pelo PSD a quem passava (propaganda do partido com mensagens eleitorais sob a película raspada), o repórter da CNN Portugal questionou e registou em direto a resposta de Rio: “[A reposição das 40 horas na função pública] não está no programa eleitoral, não é uma medida prioritária que nós assumimos que vamos tomar. Reduzir para 35 horas no não-público também não. Ficam como está.”

 

Ficam como está: a regra das 40 horas por semana no privado (de que se excluem alguns contratos coletivos) e das 35 horas por semana no público. E ficam como está porque os dois partidos que podem vir a liderar um governo, PS e PSD, estão nisto de acordo.

 

O programa eleitoral do PSD para estas eleições legislativas não faz de facto referência ao restabelecimento das 40 horas de trabalho semanais para os funcionários públicos, medida adotada em 2013 pelo governo de Passos Coelho, que o PS depois reverteria considerando a redução ilegal, por violação dos princípios da igualdade, proporcionalidade e proteção da confiança.

 

Já nas eleições de 2019 Rui Rio fora confrontado com esta questão e, em entrevista à TVI, o líder do PSD respondeu então que faria “um esforço” para encontrar uma solução que não passasse pelo regresso ao regime das 40 horas semanais na função pública.

 

O tema da função pública esteve também em discussão no debate recente entre António Costa e Rui Rio, dia 13, em que líder do PSD defendeu a necessidade de “otimizar os recursos” na função pública, considerando que “há mais funcionários” mas “os serviços [públicos] estão muito piores”.

Imigração ilegal

Vários partidos com assento parlamentar têm o combate à imigração ilegal como preocupação nos programas eleitorais, enumerando várias propostas de imigração regulada. Só a CDU, CDS e Iniciativa Liberal não se referem ao tema.

 

Algumas das propostas: O PS defende a manutenção dos “acordos bilaterais de migração regulada com países exteriores à UE” (PS); o PSD propõe a adoção de um sistema de pontos (que existe no Reino Unido, onde os imigrantes devem conquistar um determinado número de pontos – em função de itens como ter emprego e falar a língua - para ter acesso a visto; o Bloco de Esquerda propõe uma nova Lei de Imigração assente numa “filosofia humanista e aberta ao mundo, em rutura com as orientações da ‘Europa fortaleza’”; o PAN defende a criação de “um visto para a procura de trabalho, garantindo a existência de vias seguras e legais para a viagem”; o Livre promove a “criação de centros de formação, de recrutamento e de integração”; o Chega defende que os imigrantes devem ser enquadrados numa “política de imigração regulada, criteriosa, assente nas qualificações” e nas “reais necessidades do mercado de trabalho".

Boa pergunta, que aliás também tem sido colocada por vários analistas, em função dos resultados e dos cenários de governabilidade que deles resultem. Conhecemos o nosso padrão de instabilidade: está para ser eleito o primeiro chefe de governo que não tenha passado por eleições antecipadas. Costa, Passos, Sócrates, Guterres e Cavaco (os únicos primeiros-ministros em democracia que cumpriram pelo menos um mandato por inteiro) passaram todos por eleições antecipadas. Em 22 governos constitucionais, só seis chegaram ao fim da legislatura - 16 ficaram pelo caminho.

Factos primeiro

Bruno Fialho

Não é a primeira vez que esta tese, aqui repetida pelo presidente do partido ADN - Alternativa Democrática Nacional, vem a lume. Há alguns meses um documento circulou nas redes sociais com a mesma “informação”.

 

A CNN Portugal contactou a DGS, que respondeu que esta declaração está “descontextualizada” e que se refere a dados com mais de seis meses.

 

“A grande maioria dos certificados de óbito que são emitidos e posteriormente codificados pela DGS são emitidos por médicos com vínculo ao Ministério da Saúde. O processo de vigilância da mortalidade é baseado na emissão e codificação das causas de morte dos certificados de óbito. A codificação de causas de morte é efetuada por profissionais a tempo inteiro na DGS”.

 

De acordo com a International Classification of Diseases (classificação internacional de doenças definida pela Organização Mundial da Saúde), a mortalidade por covid-19 pode ser codificada com dois códigos: U07.1 para o registo da doença covid-19 confirmada por testes laboratoriais; e U07.2 para o registo da doença com quadro clínico fortemente sugestivo de covid-19, quando a confirmação laboratorial é inconclusiva ou não se encontra disponível.

 

A DGS esclarece ainda:

 

“A 18/04/2021 tinham sido codificados pela equipa de codificação da DGS, efetivamente, 152 certificados de óbito relativos a covid-19 pelos médicos que trabalham para a Tutela Ministério da Justiça. Não foi observada qualquer discrepância. Nesse mesmo dia, a 18/04/2021 de abril, tinham sido apurados um total de 16 945 óbitos por covid-19”.

 

Conclusão: Falso

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Costa

David Neeleman desmentiu oficialmente o primeiro-ministro, explicando que nenhuma das suas empresas de aviação faliu durante a pandemia. Costa não especificou a que empresas se referia, mas depois de ter estado associado a outras companhias aéreas no passado (como a Jet Blue), só é pública a presença de Neeleman na Azul, de que é presidente do Conselho de Administração e tem uma participação minoritária, e da a Breeze Airways, que o ex-acionista privado da TAP lançou no ano passado. Ambas estão a operar.

 

Conclusão: Falso

Best (and worst) of

Melhor: o debate televisivo dos partidos sem assento parlamentar

 

Não concordo com os que tratam o debate como quem fez uma visita a um Zoo para ver espécies diferentes (mesmo se houve um elefante de peluche no debate…). Houve vários insólitos, incluindo uma falha de luz no momento em que um dos candidatos falava do preço da eletricidade. Mas isto é como em tudo, a diferença foi entre candidatos bem preparados e candidatos mal preparados.

 

O negacionismo, por exemplo, pontuou o debate. Mas não deixa de ser relevante que ele surja como exceção em toda a campanha eleitoral e em muito poucos (e obscuros) partidos, como o ADN, o Ergue-te e o PCTP-MRPP (que questiona o número oficial de óbitos, sugerindo que são bem menos do que os publicados pela DGS). Tomando os partidos como uma forma de representação da sociedade, talvez isto seja (mais) um indício de que o negacionismo é irrelevante na sociedade portuguesa e que, quando se manifesta, o argumento mais válido que tem é “vão ao Google”.

 

A taça do debate vai para Renata Cambra, líder do MAS. É um bom exemplo sobre como é possível aproveitar um debate para sobreviver além dele e ganhar visibilidade política. “Eu tenho 30 anos, sou professora, sou precária”, arrancou. Defendendo “uma esquerda forte e combativa no Parlamento”, a líder do MAS assumiu posições que geraram reações, apoios, crítica e debate, como quando criticou o projeto do lítio em Portugal. Basta ver que Renata Cambra se tornou o segundo maior “trending topic” (tópico do dia) no Twitter e aumentou substancialmente o número de seguidores e de pesquisas no Google. Quem conhecia o nome de Renata Cambra até ontem?

 

Leia aqui uma análise ao debate entre os 11 partidos que (também) querem um lugar na Assembleia da República. E veja alguns destaques dos candidatos.

 

- Renata Cambra: "A esquerda está amarrada a cálculos eleitorais"

- Tino de Rans: "Com 50% de abstenção, em Portugal não há partidos grandes"

- Tiago Matos Gomes: "Volt traz ao debate questões europeias, porque Portugal é Europa"

- Nós, Cidadãos propõem criação de comissão independente para fiscalizar nomeações no SNS

- Aliança: "Para as pessoas é irrelevante serem atendidas no privado ou no público"

- MPT: "Tanto me faz se é no SNS ou no privado. Quero é ser tratado"

- PCTP/MRPP: "Pandemia foi utilizada para introduzir medidas repressivas e intimidatórias"

- PTP quer combater crescimento do Chega e eleger dois deputados de etnia cigana

- O estranho momento do elefante de peluche

- A luz foi abaixo quando se falava sobre o elevado preço da energia

 

Pior: a conferência de imprensa que não aconteceu

 

O governo convocou jornalistas e convidou personalidade como a diretora geral de Saúde para anunciar ontem como seria feito o voto por isolados. Já depois da hora, cancelou tudo, argumentando que não tinha recebido ainda o parecer da PGR. O caso é mais patético do que grave, mas simboliza bem a falta de capacidade de planeamento e organização em todo o processo. Só hoje, a 11 dias das legislativas, sabemos (eleitores e câmaras municipais) como será o voto dos isolados. Ridículo.

Soundbites

“Portando, para o Amândio Madaleno, eu deveria ir para a prisão”

José Pinto Coelho

Líder do Ergue-te (ex-PNR), reagindo, sem que ninguém se referisse a ele, à proposta do líder do PTP de penas de prisão para racismo e xenofobia

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“Isto nunca me tinha acontecido”

Carlos Daniel

Reação em direto do jornalista, quando a eletricidade falhou a meio do debate televisivo

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"É preciso impor uma derrota a André Ventura"

Catarina Martins

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“Se o Bloco conseguir ficar à frente do Chega é uma derrota”

André Ventura

Se eu mandasse...

Saragoça

… fazia uma profunda reestruturação de toda a administração pública.

Paulo Saragoça da Matta, advogado

“Faria uma profunda reestruturação de toda a Administração Pública, com uma redução muito grande do número de funcionários existentes. E com uma alteração de todas as regras de progressão na carreira, passando esta a assentar em concursos tramitados eletrónica e secretamente, para garantir o mérito. Uma segunda alteração que seria uma redução do número de deputados para o mínimo previsto pela constituição, 180, porque são demasiados deputados para a representação dos eleitores. A terceira coisa seria a separação, total e definitiva, entre a carreira do Ministério Público e a magistratura judicial.” Leia a resposta e as explicações na íntegra aqui.

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Chef Kiko

...criava uma aplicação do género da Uber para evitar o desperdício alimentar.

Francisco Martins (Chef Kiko), Chef de Cozinha

“Um terço do que é produzido no mundo acaba no lixo. É uma quantidade absolutamente assustadora. A ideia seria trabalharmos de uma forma mais séria para percebermos como é que podemos desperdiçar menos comida. A eficiência também se traduz em desperdiçar o mínimo possível e garantir que o maior número de pessoas consegue comer aquilo que é produzido. Começava por criar uma cozinha central para receber os desperdícios alimentares de cada família, quase como se fosse uma ‘Uber’, em que as pessoas que estivessem com excesso de pão, leite, alface, qualquer coisa, e passava por lá uma carrinha ou uma mota para os recolher. Na cozinha central havia uma equipa a trabalhar esses ingredientes e garantir a confeção, através de pratos em que se aplicariam técnicas de cozinha como a pasteurização, a cozinha lenta, a manipulação por congelação. E serviria para alimentar creches, ATLs, vários organismos do Estado…” Leia a resposta e as explicações na íntegra aqui.

Acontece a seguir

Amanhã terá lugar o debate das rádios, organizado entre as 9h e as 11h da manhã na Renascença, TSF e Antena 1, e que será transmitido também pela CNN Portugal. Estão convocados os líderes dos nove partidos com assento parlamentar, que não contará com a presença de Rui Rio.

 

O PSD estará amanhã em viagem pelo norte, com contactos com a população em Bragança e Vila Real, onde agendou uma sessão sobre economia e finanças.

 

Ainda esta quarta à noite, o Bloco de Esquerda tem previsto um comício no Mercado do Peixe, em Torres Novas. Na quinta o PCP viaja na Linha do Oeste até às Caldas da Rainha, seguindo-se uma sessão pública na Marinha Grande, às 18h30.

 

O PS tem ações de campanha em Évora, Reguengos de Monsaraz e Santarém, onde fará um comício às 21h00. Depois de uma manhã em ações de campanha no centro de Leiria, o CDS viaja até Coimbra para uma visita à empresa farmacêutica Bluepharma.

 

O PAN estará no aeroporto de Beja. O Chega segue caminho para o norte, com uma arruada em Bragança e um jantar comício em Vila Real. A Iniciativa Liberal tem três ações de campanha em Lisboa (por áreas temáticas, economia, saúde e educação. O Livre encontra-se com estudantes de Saúde na Faculdade de Medicina do Porto, às 15h00.

Agora nós

Renata Cambra, líder do MAS, escreveu-nos ontem no Twitter, rede onde hoje se tornou “trending” (tendência) em Portugal, depois da sua participação no debate de ontem entre os partidos sem assento parlamentar candidatos às legislativas. Transcrição da pergunta (abreviações completadas por nós):

 

“Eu queria saber porque é que o Volt, que nem aos 22 círculos se candidata, teve direito a direto na @cnnportugal para apresentar propostas, e o MAS, que não só vai a todos os círculos, como tem a representante partidária mais jovem (e única mulher nos pequenos partidos), não”.

 

O líder do Volt esteve, como diz Renata Cambra, na CNN Portugal. Não foi nem será o único partido convidado, contudo. O líder do Estamos Juntos também esteve em antena no canal (antes de se desfazer), estando previstos representantes de mais partidos sem assento parlamentar, alguns já confirmados (o RIR e Aliança, este domingo) e outros ainda em fase agendamento ou convite, incluindo o MAS.

E finalmente...

Escreve-nos, no Facebook, Manuel Cartaxo:

 

“Pessoalmente acho que os repórteres que acompanham a campanha, em vez de andarem a colocar o microfone na frente dos candidatos e depois darem um 'palpite' subjetivo de como está a correr, deviam entrevistar em cada lugar um cidadão comum e perguntarem qual a política pública que esteja em falta nesse lugar - e, já agora, se sabem o nome do candidato em que irão votar nesse circulo eleitoral. Depois, se me permitem, acho que têm 'jornaleiros' a mais a comentar nas emissões e que não trazem qualquer mais-valia, porque referem o óbvio das palavras do pivot...😉”

 

Obrigado pelo comentário. Tenho para a troca uma sugestão de leitura, a reportagem hoje publicada pelo jornalista Wilson Ledo intitulada “Gavião: na terra mais socialista do país, as laranjas caem ao chão”.

 

Ali não passam campanhas e não há visitas de primeiros-ministro há anos. É porque está ganho à partida? “Não, é porque somos poucos”. É um lugar esquecido pela política, onde se deseja melhores salários e mais emprego, uma fábrica até, “como se uma fábrica pudesse, de facto, fabricar as pessoas que fazem falta por aqui”.

 

É o país real.

 

 

Esta newsletter foi escrita com pesquisa de informação dos jornalistas Beatriz Céu e Pedro Falardo.

 

Acompanhe-nos a qualquer hora na televisão e no site da CNN Portugal. Volto a escrever-lhe daqui a umas horas. Até amanhã!

 

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