Ganharam os melhores

4 jul 2000, 12:40

Opinião de José Mourinho José Mourinho, treinador do Barcelona, escreveu nestas páginas durante o Euro-2000.

A selecção francesa junta ao título mundial o europeu e creio que poucos terão dúvidas que são a melhor equipa do continente e como tal os justos vencedores. 

Sob o ponto de vista táctico Aimé Jacquet construiu uma equipa que, obviamente, assentava na perfeita noção da ocupação dos espaços em situação defensiva. Uma defesa zonal, onde os laterais Thuram e Lizarazu, pela sua velocidade, não necessitam de muitas cobertura, uma dupla de centrais imbatíveis no jogo aéreo e onde o poder de Desailly e a leitura de jogo de Laurent Blanc culminam com um guarda-redes do futebol moderno.  

Roger Lemerre foi inteligente, não entrou na linha de pensamento de muitos treinadores que querem impor um cunho pessoal, quando o mais lógico é oferecer continuidade a um sucesso quase garantido. Que importa se esta é a «defesa de Jacquet» ou a «defesa de Lemerre», quando o importante é ser a «linha defensiva da França»? 

No meio-campo, e ainda referindo-me ao aspecto defensivo, Vieira e Deschamps posicionados num triângulo onde Zidane é o vértice mais adiantado. Um ponta-de-lança fixando e limitando a acção de construção dos centrais e dois homens que, defensivamente, se posicionam interiormente, mas preparados para sair a pressionar os laterais contrários. 

A distância entre as linhas é praticamente nula, a distância entre jogadores é também ela reduzida e inalterável, o movimento colectivo em relação à posição da bola é «absurdamente perfeito». 

Em posse de bola, há a coexistência harmoniosa entre o mecânico e o criativo. A primeira fase de construção tem horas de trabalho: saídas pelos laterais usando o triângulo do meio-campo como referências de segunda linha, entradas de Blanc no espaço criado pelo movimento dos dois pivots ou o passe largo de Barthez para zonas e referências pré-determinadas seguidas de pressão.  

As fases posteriores de criação de situações de finalização assentam na incrível qualidade de Zidane e nos movimentos de Djorkaeff, Dugarry, Wiltord, Pires e até Micoud, que num só jogo clarificou as razões da comparação com Cantona e Zidane.  

No último terço do campo floresce a criatividade e a dinâmica dos artistas. Liberdade com visão táctica para trocas de posição implicam mudança de funções e assim o segredo de reunir numa equipa, alegre e colectivamente, a seriedade e o rigor da táctica com a beleza e a dinâmica dos livres pensadores. Ganharam os melhores! 

Jogadores - os melhores e o melhor 

Falar dos melhores e escolher um onze tipo parece-me incrivelmente difícil e totalmente dependente da filosofia de cada analista; escolher o melhor parece-me fácil, tal a diferença evidenciada.

Barthez, Baía ou Toldo?

Blanc, Nesta, Desailly, Couto, De Boer?

Lizarazu, Chivu, Maldini?

Beckham, Nedved, Zahovic, Rui Costa?

Kluivert, Raúl, Sukur, Henry? 

Certamente entende as razões de tantas dúvidas com a qualidade com que nos confrontamos. Agora para mim é fácil apontar clara e decididamente Figo como o segundo melhor e Zidane como o melhor jogador da competição e da Europa. 

Zidane é tecnicamente fabuloso, tacticamente magistral, fisicamente poderoso, psicologicamente nascido para liderar. Zidane... o melhor. 

Onde está o sentido comum? 

A experiência confronta-me com o facto de faltar ao poder de decisão no futebol sentido comum. A alguns árbitros profundamente conhecedores das regras do jogo falta por vezes sentido comum e poder de comunicação; a muitos dirigentes detecto a mesma falta de sensibilidade para com humanos e sujas reacções emocionais. 

Não sei o que fizeram ou disseram Nuno Gomes, Paulo Bento ou Abel Xavier, mas estou seguro que nem mais nem menos que Figo, Couto, Jorge Costa ou qualquer um dos emocionalmente destroçados jogadores portugueses. 

O castigo é ridiculamente injusto e a falta de sentido comum é evidente.

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