No início deste ano, uma jornalista perguntou-me quais seriam as principais mudanças observadas no mercado de trabalho português nos últimos 50 anos. Respondi que seriam a entrada das mulheres no mercado de trabalho, com uma subida de 178% da população ativa feminina, e a expansão do ensino superior e melhoria das qualificações da população em geral – neste período a percentagem da população com curso superior passou de cerca de 2% para quase 20% (multiplicou por dez), e com ensino secundário de 3% para 24% (aumento de 8 vezes).
A minha resposta limitou-se a destacar alguns factos estatísticos, mas faltou a parte mais interessante: quais as causas e as consequências destas alterações. O trabalho de Claudia Goldin, vencedora este ano do Prémio do Banco da Suécia em Ciências Económicas em Memória de Alfred Nobel, ajuda-nos a dar resposta a estas questões.
Golden estudou profundamente a transformação do mercado de trabalho dos EUA, nomeadamente o contributo das mulheres para a economia, relacionando a expansão da educação, a disseminação do planeamento familiar e as alterações culturais quanto ao papel do casamento e da estrutura familiar na participação feminina no mercado de trabalho e na explicação das diferenças salarias entre sexos.
O artigo científico "Orchestrating Impartiality: The Effect of 'Blind' Auditions on Female Musicians", de 2000, escrito com Cecilia Rouse, é um dos seus trabalhos mais citados, ao demonstrar empiricamente o efeito da discriminação no momento da contratação: usando dados sobre contratações em orquestras norte-americanas, Goldin e Rouse descobrem que as orquestras que alteram o seu processo de recrutamento de novos músicos de audições abertas para audições “cegas”, em que o júri não conhece o candidato, aumentam a probabilidade de uma mulher ser aceite nas fases iniciais do recrutamento em 50%.
A segunda área onde o trabalho de Goldin é mais referido é no âmbito da relação entre educação, tecnologia e desigualdade. O livro “The Race between Education and Technology”, de 2008, é uma obra fundamental para percebermos de que forma a transformação tecnológica, passada e em curso, foi o resultado da massificação do ensino, e qual o contributo de ambas para a dinâmica da desigualdade ao longo do século XX.
O trabalho de Goldin assenta não só numa abordagem teórica rigorosa, mas também numa análise empírica detalhada e extensa, na linha do trabalho de outro premiado, David Card, no ano de 2021. Mais do que um trabalho de história económica, o contributo de Claudia Goldin é fundamental para compreendermos o mundo do trabalho atual e futuro.