Brasileirão: chegou a vez do Palmeiras, 22 anos depois

25 nov 2016, 10:24
Palmeiras

No campeonato mais equilibrado do mundo é possível subir e em três anos estar prestes a ser campeão, tal como disputar o título e no ano seguinte estar a lutar pela manutenção. E não faltam chicotadas, como bem sabe o técnico português Sérgio Vieira, uma das vítimas: 18 das 20 equipas mudaram de treinador durante a época

Palmeiras campeão do Brasil... Desde 1994, nos tempos áureos do investimento da Parmalat no futebol, que o feito não estava tão próximo, a ponto de se poder concretizar já no fim-de-semana.

Nessa espécie de era dourada do verdão, os milhões da multinacional italiana de produtos alimentares permitiram aos paulistas construírem uma superequipa orientada por Vanderlei Luxemburgo, com Roberto Carlos, Rivaldo e Edmundo como cabeças de cartaz.

22 anos depois, o Palmeiras está a um ponto de voltar a reclamar para si o título brasileiro e a festa do título pode fazer-se domingo (19h00) na novíssima Arena Palestra Itália. Basta um empate diante da Chapecoense ou esperar por um deslize do Santos, o único perseguidor que ainda tem esperanças em conquistar o título – mas que está a seis pontos atrás, os mesmos que estão em disputa quando faltam duas jornadas para o final.

Nos últimos anos, a vida não foi fácil para o clube que nasceu e cresceu no seio da imensa comunidade italiana da maior metrópole do Hemisfério Sul: foi despromovido pela primeira vez em 2002, regressou de seguida, mas em 2012 voltou a experimentar a descida à Série B. Facto é que em três anos, o Palmeiras conseguiu passar do segundo escalão do futebol brasileiro para a iminência da conquista de um título que lhe escapava há mais de duas décadas. No polo oposto, por exemplo, o Internacional de Porto Alegre, que nas últimas duas épocas terminou em quinto e terceiro lugar, respetivamente, está agora em zona de despromoção e vai no quarto treinador este ano.

Mercado sempre aberto, instabilidade permanente

Este tipo de sobe e desce dos grandes seria impressionante em qualquer outro lugar do mundo. No Brasil, nem tanto assim. Não há campeonato mais equilibrado. Das 20 equipas que em competição, pouco mais de metade iniciam a época como legítimas aspirações à conquista do título.

Sérgio Vieira, técnico que este ano treinou o América Mineiro – tal como Paulo Bento no vizinho Cruzeiro –, último classificado da Série A e já despromovido, explica ao Maisfutebol alguns dos motivos que tornam o Brasileirão um campeonato diferente:

«O mercado está constantemente aberto e as equipas que têm bom rendimento acabam por perder os jogadores que mais se destacam com a época a decorrer. Foi o caso do Corinthians, que perdeu uns cinco ou seis titulares durante a época, entre eles o Felipe para o FC Porto e o Elias para o Sporting. Por outro lado, um jogador que não seja opção, em vez de esperar e trabalhar para sê-lo, opta pela solução mais fácil, falar com o empresário e fazer pressão para sair no imediato. Além disso, o calendário não tem comparação com o de nenhum outro país e a logística também é bem mais complicada: há equipas que chegam a fazer 70 ou 80 jogos por ano e as viagens são muito longas, pelo que é difícil manter alguma regularidade nos resultados. Tudo isso contribui para uma instabilidade constante na gestão dos clubes, o que afeta o trabalho dos treinadores.»

Sérgio Vieira (ao centro), quando treinava o América Mineiro

Os factos comprovam-no: 18 das 20 equipas que disputam o Campeonato Brasileiro trocaram de treinador durante esta época. Só Santos (Dorival Júnior) e Grémio (Roger Machado) mantiveram os respetivos treinadores. Ainda assim, São Paulo e Corinthians ficaram sem os técnicos Edgardo Bauza e Tite, respetivamente, não porque os tivessem demitido mas porque assumiram o comando das seleções da Argentina e do Brasil neste ano.

Ontem mesmo, Marcelo Oliveira foi demitido do comando técnico do Atlético Mineiro depois de perder a primeira mão da final da Copa do Brasil. Oliveira que já tinha sido demitido esta época do Palmeiras e que, para todos os efeitos, contribuiu também para o previsível título de campeão.

Dois técnicos portugueses foram vítimas das «chicotadas». A falta de estabilidade foi o que acabou por minar o seu percurso no América, reconhece, tal como o de Paulo Bento no Cruzeiro. Sérgio Vieira entrou a meio do campeonato e fez 10 antes de ser sair do comando técnico do clube.

«Não devia ter aceitado, mas tinha de passar por isso. Confirmei o que já sabia: para disputar a Série A é preciso ter um plantel forte. A próxima decisão vai ser ponderada. Não aceitarei um novo projeto só porque vou para um clube maior», diz o técnico que no início de 2017 vai orientar o São Bernardo no Estadual de São Paulo.

Gabriel Jesus e outros talentos

O mérito do Palmeiras para estar prestes a conquistar o título de campeão brasileiro é precisamente a estabilidade, salienta Sérgio Vieira: «Apesar de terem trocado o Marcelo Oliveira pelo Cuca, que está a fazer um excelente trabalho como técnico, eles optaram por não transferir jogadores importantes a meio da época, além de contratarem outros que trouxeram dinâmica à equipa. Isso acaba por fazer a diferença num campeonato tão equilibrado como a Série A.»

Quem também faz a diferença na equipa de Cuca é Gabriel Jesus, considerado por muitos como o maior prodígio do futebol brasileiro a atuar entre portas. O avançado de 19 anos já foi anunciado como reforço do Manchester City – por uma verba que poderá rondar os 32 milhões de euros – e será a próxima grande estrela brasileira na Europa.

Gabriel Jesus, destaque do Palmeiras e da seleção brasileira, já assinou pelo Manchester City

«Apesar de ser muito jovem, já é titular da seleção brasileira, faz golos e mostra um grande talento na linha do que já era possível ver em Cristiano Ronaldo, Messi ou Neymar quando eles tinham a mesma idade. Ele tem apenas 19 anos, mas afirma-se como se já tivesse 24 ou 25», afirma ao Maisfutebol Sérgio Vieira, salientando que não faltam jovens de qualidade a destacarem-se no Brasileirão: «Cada equipa tem dois ou três talentos que podem vir em breve a rumar ao futebol europeu: desde logo o “Gabigol” – Gabriel Barbosa – que saiu para o Inter de Milão no defeso, mas também outros jovens avançados, como o Roger Guedes do Palmeiras ou o Richarlison do Fluminense, ou até um “8” de qualidade como o Matheus Rossetto, do Atlético Paranense.»

Se os jogadores brasileiros sempre interessaram ao futebol português, os treinadores portugueses começam cada vez mais a interessar aos clubes brasileiros.

Sérgio Vieira explica que mais do que a nacionalidade o que conta «são as capacidades e a qualidade do trabalho», mas reconhece: «Apesar de haver grandes técnicos brasileiros, lá ganhou força a ideia de que os treinadores europeus estão mais bem preparados.» O técnico português espera poder provar isso mesmo ao mais alto nível e aguarda por um projeto sólido para voltar à elite do futebol brasileiro. 

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