Aviso: o que se está a passar no Mar Vermelho "pode encarecer os combustíveis e alimentos em Portugal"

15 dez 2023, 23:47
Mar Vermelho (Getty Images:Satellite image (c) 2023 Maxar Technologies)

Duas das principais transportadoras marítimas suspenderam as suas atividades no Mar Vermelho. Motivo: ataques dos rebeldes Houthis do Iémen

Duas das principais transportadoras marítimas, a dinamarquesa Maersk e a alemã Hapag-Lloyd, vão interromper todas as viagens através do Mar Vermelho após uma série de ataques a navios por parte dos rebeldes Houthis do Iémen. E isso pode trazer consequências no abastecimento de bens e no preço dos mesmos.

“Se já era difícil circular no Mar Vermelho, isto vai dificultar muito as escolhas daqui para a frente. as rotas do norte e Atlântico sul são muito longas e têm custos maiores, o que pode encarecer os produtos, como combustíveis e alimentos, mesmo aqui em Portugal”, alerta Tiago André Lopes, especialista em Relações Internacionais.

O Mar Vermelho é uma das rotas mais importantes do mundo para o transporte de petróleo e combustível, assim como de bens alimentares e de consumo. E, no caso da Maersk, que “transporta um pouco de tudo para todos os destinos, todos os bens podem ser interrompidos daqui para frente”, diz o comentador da CNN Portugal. “Isto tem impacto na tentativa de escoar produtos.”

A Maersk anunciou a suspensão do tráfego de navios na rota do Mar Vermelho após dois ataques armados dos islamitas Houthis do Iémen, um dos quais na quinta-feira, em que o navio Maersk Gibraltar foi alvo de um míssil enquanto viajava de Salalah, Omã, para Jeddah, na Arábia Saudita, pelo estreito de Bab al-Mandab. Um outro ataque decorreu esta sexta-feira, lê-se na Reuters. Na quarta-feira, dois mísseis disparados a partir de território controlado pelos Houthis atingiram um navio-tanque comercial de fabrico indiano carregado com combustível perto deste mesmo estreito. Também a Hapag-Lloyd, que transporta, por exemplo, café para todo o mundo, viu um dos navios “sofrer danos físicos devido a um ataque aéreo” ao norte da cidade costeira iemenita de al-Makha (Mocha) - posto isso, decidiu suspender até segunda-feira a sua atividade nestas águas, diz a Al Jazeera

“Estas empresas querem suspender a passagem [no Mar Vermelho], contornar essas águas mais arriscadas, indo por uma rota mais longa e mais segura que passe pelo Cabo da Boa Esperança. Mas se isto ocorrer em grande escala, aumenta o custo de transporte o custo dos bens transportados e alguém vai ter de pagar isso”, adianta o economista Ricardo Ferraz, também investigador no ISEG - Instituto Superior de Economia e Gestão - ISEG e professor da Universidade Lusófona.

O estreito de Bab al-Mandab é um canal de cerca de 30 quilómetros conhecido por ser dos mais complicados e perigosos de navegar. É também dos mais importantes, uma vez que é a rota pela qual os navios podem chegar ao Canal de Suez vindos do sul. Este estreito situa-se entre o Iémen, na Península Arábica, e Djibuti e Eritreia, na costa africana, e, como se lê na BBC, cerca de 17 mil navios e 10% do comércio global passam por lá todos os anos. Mas não só: cerca de 10% de todo o petróleo comercializado no mar passa pelo estreito.

Mão do Irão para pressionar cessar-fogo?

O grupo Houthis está a atacar vários navios e contentores de transporte que circulam no Mar Vermelho desde o início do conflito entre o Hamas e Israel, mas esta semana essas ações afetaram os navios da Maersk que se dirigiam para território israelita. Aliás, o grupo rebelde tem atacado navios independentemente da nacionalidade ou dos países de origem, o que, para o economista Ricardo Ferraz, é um sinal de que estes ataques dos Houthis têm mão do Irão, que com isto pretende “causar danos na economia global” e “pressionar” os países a exigir a Israel um cessar-fogo.

“A inflação tem vindo a ser controlada. como sabemos, já tivemos preços bastante elevados na sequência da pandemia e da guerra da Ucrânia e da Rússia, mas podemos vir a assistir agora, esperemos que não, a um efeito na inflação”, adverte o economista, que diz que resta “saber qual a dimensão e duração” deste impacto nos vários países.

Embora a empresa alemã Maersk tenha revelado que os navios não foram atingidos, a decisão da suspensão deve-se à falta de segurança. Para Tiago André Lopes, esta “insegurança” pode “certamente” levar outras empresas a tomar a mesma decisão e a iniciar pausas no tráfego e é um sinal claro de “fragilidade e dificuldade” no patrulhamento dos mares.

“Há um sinal de fragilidade e dificuldade de patrulhar os mares, dá a imagem de que não há um patrulhamento dos mares. E fica a questão de quem podia fazer esse patrulhamento, mas não é uma resposta fácil de responder. O  nosso pensamento é sempre os Estados Unidos, mas não têm jurisdição nesta área do globo. Podia-se pedir à ONU mas teria de desbloquear o impasse. O mais viável seria uma força conjunta multinacional”, diz, embora reconheça que qualquer cenário é complexo e difícil de aplicar.

Um patrulhamento mais apertado podia implicar sanções para os atacantes, mas os Houthis, por não serem um Estado, estão imunes a esses castigos, o que para Tiago André Lopes aumenta a insegurança sentida por quem lá navega. “Como não são reconhecidos como uma força estatal, há uma série de normas que se aplicam a Estados e que não se aplicam aos Houthis. Há sanções que não lhes afetam. É mais fácil  bloquear um estado do que um grupo de rebeldes.”

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