«É melhor ser regular do que vistoso», considera Ibarra

30 jun 2001, 13:00

A primeira entrevista do novo reforço do F.C. Porto

A contratação de Ibarra pelo F.C. Porto espantou tudo e todos em Portugal, pois enquanto se esperava que chegasse um ponta-de-lança às Antas, Pinto da Costa decidiu não resistir à tentação do mercado argentino e resgatou o lateral-direito ao Boca Juniors e aos interesses manifestados pelos espanhóis Saragoça e Valência. 

Num plantel que conta com Secretário, Nélson e Sousa não se esperava que Octávio Machado pudesse vir a contar com mais um elemento para o lado direito da defesa. De qualquer forma, como os elogios ao novo reforço têm surgido em catadupa, tudo indica que esta seja mais uma aposta séria do presidente. 

Na primeira entrevista de Ibarra como dragão, o jogador revela a sua história de dificuldades ao longo da sua vida, mas não adianta grande coisa sobre este novo passo na carreira. Apenas a habitual confirmação do sonho europeu. A oportunidade de conhecer o crack é dada pelo diário «Clarin», a partir de Buenos Aires. 

«Um desafio bonito» 

A viagem para o Porto está marcada para segunda-feira e, depois de se ter sagrado bicampeão da América do Sul, Ibarra já começou a pensar na próxima época. 

«Para mim é um desafio bonito», começou por referir o jogador, comentando com sinceridade os dias que o esperam. «Na vida estabeleci sempre metas e no Boca concretizei tudo a que me propus. Agora, quero triunfar no futebol europeu».  

Sobre o seu novo clube nada mais. Na ressaca da festa louca na Argentina depois de conquistado mais um título, é altura de falar ainda da casa que deixa para trás. «Dizem sempre que é o fim de um ciclo e quando ganhámos a Copa América do ano passado, bem como a Intercontinental, isso foi falado com insistência, mas as caras foram sempre as mesmas. Mesmo com todas as vendas anunciadas (Riquelme e Bermudez devem sair), este grupo não vai perder a mentalidade ganhadora». 

Mentalidade brasileira 

Na extensa caracterização do homem e do jogador, destaca-se o facto de Hugo Benjamim Ibarra ser o mais brasileiro de todos os argentinos. A comparação é, no mínimo curiosa, pois El Negro sempre admirou Cafú e Roberto Carlos e adora comer a tradicional feijoada. Pode-se dizer que no Porto sentir-se-á em casa... 

Apesar do ar sisudo, por trás da capa o argentino é um homem sincero, humilde, com muito sentido de humor e valores bem marcados. Não troca a sua terrinha por nenhuma ilha das Caraíbas, por isso preferiu passar as férias em El Colorado (a 160 quilómetros de Buenos Aires), junto da numerosa família e dos amigos. «Eles marcaram a minha adolescência e não me esqueço das minhas origens», confessa. 

As preocupações socias ocupam lugar no seu coração, nomeadamente no que se refere à pobreza vivida na região onde vive. «As províncias do norte do país estão como estão: marginalizadas. Há muita pobreza. Está tudo parado. Há imagens terríveis», elucida criticando a classe governante: «Os políticos deveriam sair de Buenos Aires para ver o que se passa no interior». 

Subir a pulso 

El Negro sempre gostou de futebol, mesmo quando participava nos torneios do seu bairro. Era o seu hobby e já nessa altura actuava no lado direito, mas nunca lhe passou pela cabeça chegar a profissional e, muito menos, à Europa. Em 93 assinou pelo Union, mas a experiência saiu frustrada, passando muitas carências nesses meses. Teimoso, um ano mais tarde regressou a Santa Fé, ao clube onde o ex-sportinguista Acosta também brilhou. 

Com 16 anos começou a jogar na primeira divisão, mas pelo Colon da mesma cidade. Foi nessa altura que decidiu deixar o ataque, onde chegou a marcar muitos golos, pelo meio-campo. Todavia, o seu treinador de então (Nelson Chabay) encontrou-lhe a vocação para defesa-direito. 

A unanimidade popular coloca-o como o melhor número 4 argentino, mas Ibarra relativiza os elogios. «É um carinho que agradeço. Dá-me mais ímpeto para prosseguir o meu caminho, mas o mais importante é ajudar a equipa e ser solidário com os colegas. Porque é melhor ser regular do que vistoso». A humildado do argentino não se fica por aqui e acrescenta que já resolveu o seu principal defeito, que era não medir as acções ofensivas: «Sei quando tenho que ir ao ataque e quando não. Antes, subia com mais frequência, mas não de forma tão decisiva». 

O retrato possível de um jogador que apresenta um discurso que deverá agradar aos dirigentes portistas e, principalmente, a Octávio Machado.

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