Organizam movimento nas redes sociais e convocam "greve" às aulas. Mas ninguém sabe quem eles são

30 out 2023, 18:00
Greve de professores (Nuno Veiga/Lusa)

No espaço de uma semana, alcançaram mais de sete mil seguidores no Instagram. Têm protesto marcado para 2 de novembro, convocado pelas redes sociais, mas as faltas às aulas nesse dia podem nem ser justificadas, já que não há qualquer enquadramento legal para uma greve de alunos

A primeira publicação no Instagram do movimento A Escola É Nossa! data de quinta-feira, dia 12 de outubro. É o logotipo do movimento - um desenho de um lápis, com uma lâmpada em cima – acompanhada da legenda “movimento criado por alunos, para alunos! Vamos mostrar que queremos o melhor para a nossa escola!”. No mesmo dia, mostravam ao que vinham e convocavam uma “greve nacional de alunos” para dia 2 de novembro.

“É greve porque é grave! Agora é a nossa vez! Exigimos melhores condições para estudarmos!”, podia ler-se na publicação.

Durante a primeira semana, publicaram quase diariamente reivindicações, que passam por “educação sexual para todos”, “comida decente” nas cantinas ou a colocação de professores e mais assistentes profissionais nas escolas.

Entre as publicações, está um manifesto em jeito de carta aberta dirigida ao ministro da Educação, João Costa. Um documento com 35 pontos, com outras tantas “exigências”, que resultaram de uma sondagem online.

“Remover a obrigatoriedade dos exames nacionais. Devem ser apenas para quem quer ingressar na universidade. Não é justo que quem quer apenas ter o 12º ano tenha de se sujeitar a um exame numa hora que ditará o seu futuro no ano seguinte! (…) Não podemos ser prejudicados nos exames nacionais quando não temos professores numa disciplina, por culpa do Governo. (…) Cada aluno deve ser livre de comer o tipo de comida que quiser. Existem escolas que proíbem os alunos de levar comida de casa e de a comer na cantina! Apenas os pais têm o direito de controlar o que os filhos comem. O problema é deles, não vosso! Deveria existir a possibilidade de fruta gratuita como forma de lanche, para todos. Não apenas para os alunos com escalão (falem com os hipermercados das zonas das escolas: há sempre fruta que pode ser enviada para as escolas, por já não estar boa para ser vendida)”, pode ler-se no documento publicado no Instagram.

Mas quem são estes jovens e como surgiu o movimento? A CNN Portugal contactou o grupo, através do Instagram. Aceitaram responder a algumas questões, mas recusam revelar a identidade, com a justificação de que não querem criar animosidade com colegas que os possam acusar de quererem protagonismo.

“Quem fundou o movimento foi um aluno tímido e idiota (de ter ideias) que estava farto da injustiça a que todos os alunos estavam a ser sujeitos desde a pandemia”, responderam.

Sempre sem se identificarem, apesar da nossa insistência, responderam através de mensagens do Instagram. Garantem que não têm qualquer ligação com sindicatos, partidos ou outros movimentos. “Tentámos fazer ligação a grupos de alunos já organizados, mas sem sucesso. A criação deste grupo servirá para dar voz a nível nacional a todos os alunos. Uma associação de estudantes é uma coisa local”, dizem.

Acrescentam, contudo, que têm “o apoio de toda a gente” e que “todos os adultos a quem explicaram os motivos e as reivindicações” os apoiam. Escolheram o dia 2 de novembro para o protesto, que “foi uma coisa única” e não sabem se haverá uma próxima ação, por ser próxima a um feriado e terem a oportunidade de preparar tudo “para chegar com força máxima, sem exames nem testes nos dias antes”.

A CNN Portugal contactou juristas que adiantam que o protesto marcado por estes jovens não pode ser encarado como uma greve, já que não são uma estrutura sindical, nem têm entidade patronal, pelo que não lhes é conferido legalmente o direto à paralisação. A greve é um direito dos trabalhadores e só pode ser convocada por estruturas sindicais.

O presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos de Escolas Públicas (ANDAEP) concorda: “Eu acho que isto não constitui um pré-aviso de greve. A quem vão fazer o pré-aviso? Ao Ministério da Educação? Não estão constituídos em sindicato. Só os sindicatos é que podem fazer a convocação de uma greve. Percebo que é uma forma de os jovens se organizarem, mas não lhe podemos chamar greve”.

Filinto Lima considera mesmo que as faltas às aulas nesse dia não poderão ser justificadas, já que não há qualquer enquadramento legal que permita justificar uma ausência às aulas nestes termos. Tendo em conta o histórico de boicotes estudantis nos últimos anos, o representante dos diretores também não tem espectativa de que haja grande adesão ao protesto.

Filinto Lima acredita nas boas intenções do grupo de jovens, mas levanta algumas questões sobre a organização. “Entendo os nossos alunos, que são puros nas suas intenções. Mas sinto que estão a aparecer muitos movimentos. Professores, pais, alunos... Todos dizem que defendem a escola pública. É um conjunto de cidadãos que se organizam e uma forma das pessoas se manifestarem e transmitirem os objetivos à sociedade…”, diz.

A Confederação das Associações de Pais (CONFAP), também contactada pela CNN Portugal, diz desconhecer o movimento e as suas reais intenções. "Já ouvimos falar de uma greve, mas não sabemos de nada em concreto", admite Mariana Carvalho, presidente da CONFAP.

A CNN Portugal contactou ainda o Ministério da Educação para obter uma reação ao movimento estudantil e ao boicote às aulas agendado para o início de novembro. Mas, até o momento, cerca de uma semana depois, não obteve qualquer resposta.  

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