Quem é Cirilo I, o aliado de Putin contra as “forças do mal”?

6 mai 2022, 22:00

O líder da Igreja Ortodoxa Russa poderá ser um dos próximos alvos das sanções da União Europeia, pela sua proximidade ao Kremlin, mas sobretudo ao seu presidente

O líder da Igreja Ortodoxa Russa poderá ser um dos próximos alvos das sanções da União Europeia, pela sua proximidade ao Kremlin, mas sobretudo ao seu presidente. Mas quem é Cirilo I, o aliado de Vladimir Putin contra as "forças do mal"?  

Nasceu Vladimir Mikhailovich Gundyayev, em novembro de 1946, em Leningrado, atual São Petersburgo, e desde 1 de fevereiro de 2009 que é Cirilo I - Patriarca de Moscovo -, a figura maior da Igreja Ortodoxa e peça central da política russa nas últimas décadas, sendo um dos pilares de Vladimir Putin e um dos defensores da “operação militar especial” na Ucrânia.

Apologista dos valores religiosos conservadores, já foi acusado de ser ex-informador do KGB - os serviços secretos soviéticos. É um dos poderosos do círculo restrito de Putin e tem sido fulcral no reforço do autoritarismo do Kremlin desde que ascendeu ao mais alto cargo religioso na Rússia.

Desde os primeiros dias à frente dos ortodoxos russos que se tem mostrado como um denunciante de protestos e manifestantes, bem como um defensor inabalável de Vladimir Putin. Em 2012, descreveu-o mesmo como um “milagre de Deus”.

Gundyayev e Putin reunidos do Dia do Santo Cirilo em Moscovo, 24 de maio 2019 (Imagem AP)

Tanto Cirilo I como Putin, e várias outras figuras proeminentes da oligarquia russa, são naturais da antiga capital imperial do país, São Petersburgo. Tal como o pai, Mikhail, e o avô acabou por optar por uma carreira religiosa, mas, ao contrário do avô - que acabou exilado durante 30 anos nos campos de trabalho forçado - Vladimir Gundyayev subiu rapidamente na hierarquia da igreja russa, tendo acabado por se tornar chefe de relações externas, conquistando mesmo o seu próprio programa de televisão, focado na doutrina religiosa. 

Na televisão russa teve a audácia de propor um plano ambicioso de reforma da igreja, que estava estagnada desde o período de ateísmo soviético. O objetivo sempre foi só um: expandir a presença da religião em instituições estatais como escolas e exércitos. Enquanto patriarca, acabou por torná-lo realidade, sempre muito próximo de Putin.

Assegurou a consolidação dos valores ortodoxos na última revisão constitucional, aprovada em 2020, introduzindo diversos princípios conservadores defendidos igualmente por Vladimir Putin, como a fé em Deus, o casamento reservado aos heterossexuais, o ensino patriótico e a imunidade vitalícia dos presidentes russos.

Gundyayev e Putin em Kronshtadt, cidade costeira a 30 quilómetros de Moscovo, 30 de julho de 2017. (Imagem AP)

Nas últimas semanas, tem sido uma da maiores vozes públicas de apoio à "campanha militar" da Rússia na Ucrânia, pedindo a todos os fiéis que se unam no combate aos “inimigos externos e internos” de Moscovo. No sexto pacote de sanções da Comissão Europeia, é um dos nomes na lista de 58 personalidades a serem punidas.

Em fevereiro, já com a guerra em curso, afirmou perante os fiéis que em curso estava uma luta contra as "forças do mal", que se opõem à "histórica unidade" entre Rússia e Ucrânia".

Recentemente, foi visado pelo Papa Francisco, que disse a Vladimir Gundyayev que os homens da igreja “não devem usar a linguagem política, mas a linguagem de Deus”.

Cirilo I e Putin colocam rosas nas cerimónias do Dia da Unidade Nacional na Praça Vermelha em Moscovo, 4 de novembro de 2019 (Imagem AP)

Outra polémica a envolver Cirilo I foi quando, em outubro de 2015, concedeu uma bênção à intervenção russa em defesa do presidente sírio, Bashar al-Assad, operação que classificou como sendo uma “guerra santa” para proteger os cristãos. Disse, então, que a “Rússia tomou a decisão responsável de usar forças militares para proteger o povo sírio dos problemas causados pela tirania dos terroristas”, justificando que os bombardeamentos se tornaram necessários, porque "o processo político não levou a nenhuma melhoria percetível na vida de pessoas inocentes e estas precisavam de proteção militar".

Cirilo I tem vindo a utilizar a retórica em relação ao povo ucraniano, em tudo semelhante à posição de Vladimir Putin. Para o patriarca, este é um confronto que deve ser observado como um drama religioso e nacional, uma batalha existencial em que o bem (Rússia) se opõe ao mal (Ucrânia), um confronto entre a tradição, os valores, a unidade e as influências estrangeiras corruptoras presentes na fronteira da Rússia.

“Entrámos numa luta que não tem um significado físico, mas metafísico”, disse o patriarca num sermão em 6 de março.

Cirilo e Putin no Muro das Lamentações, em Moscovo, momento em memória das vítimas de perseguição política de Estaline, 30 de outubro de 2017 (Imagem AP)

Desde que Gundyayev assumiu o cargo de patriarca de Moscovo, a Igreja Ortodoxa Russa tem visado as minorias religiosas, como, em 2017, quando as Testemunhas de Jeová, que foram descritas como uma “seita totalitária” que queria “destruir o psicológico das pessoas e as famílias”, acabaram por ser banidas do país.

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