TAP: Defesa acusa ex-CEO de conflito de interesses e diz que Widener violou deveres por ocultar acordo de saída de Alexandra Reis

Agência Lusa , DCT, atualizado às 13:30
16 jan, 13:19
A presidente executiva da TAP, Christine Ourmières-Widener, na Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP (Lusa/António Cotrim)

De acordo com o documento, um mês após assumir o cargo, Floyd Widener “já estava na TAP a fazer apresentações do produto para o vender” à companhia aérea, sendo que a sua passagem pela Zamna coincide praticamente com o mesmo período de tempo em que a gestora exerceu funções na transportadora aérea.

Os advogados da TAP acusam a ex-presidente executiva (CEO) de permitir uma situação de conflito de interesses com a empresa que contratou o marido e tentou prestar serviços à companhia aérea, causando “graves riscos reputacionais” à transportadora.

Segundo a contestação da defesa à ação judicial de Christine Ourmières-Widener, a que a Lusa teve esta terça-feira acesso, o marido da ex-CEO, Floyd Murray Widener, foi contratado para a empresa israelita Zamna três meses depois de Christine Ourmières-Widener ter assumido funções na TAP.

Os advogados apontam ainda que o marido da gestora foi contratado para o cargo de diretor de desenvolvimento comercial, apesar da formação na área da literatura e experiência profissional na área das telecomunicações e aluguer de espaços para eventos.

De acordo com o documento, um mês após assumir o cargo, Floyd Widener “já estava na TAP a fazer apresentações do produto para o vender” à companhia aérea, sendo que a sua passagem pela Zamna coincide praticamente com o mesmo período de tempo em que a gestora exerceu funções na transportadora aérea.

“Pode ser coincidência que um mês depois de ser contratado o marido da Autora [ex-CEO] já estar na TAP a fazer apresentações de produtos e, pouco depois, a implementar um projeto piloto, à revelia do Conselho de Administração. Mas tudo isto levanta a legítima suspeita de que o marido da Autora fora contratado pelo facto de a Autora ser CEO da TAP”, apontam os advogados, levantando a suspeita da eventual prática de “tráfico de influência, de oferta indevida de vantagem ou mesmo de corrupção”.

A defesa acrescenta que, mesmo que não se verifique a existência de crimes, a mera permissão de Christine Ourmières-Widener à situação de “manifesto conflito de interesses” é “inadmissível”, acusando ainda a gestora de colocar em causa a reputação da TAP.

A contratação da empresa representada pelo marido da ex-CEO só não avançou, alega a defesa, devido à intervenção da então administradora Alexandra Reis.

Os advogados apontam que esta decisão de Alexandra Reis, juntamente com a recusa em despedir o motorista que falou sobre o uso pessoal da viatura de serviço por familiares de Christine Ourmières-Widener, estão na base da “animosidade pessoal” da ex-gestora francesa relativamente a Alexandra Reis, que culminou no seu afastamento da companhia, e não o desalinhamento quanto à execução do plano de reestruturação, conforme alegado pela ex-CEO.

“Em concreto, a engenheira Alexandra Reis – tendo em melhor atenção os interesses das sociedades que administrava – obstaculizou (e muito bem!) duas situações em que a Autora se olvidou dos mais elementares deveres de gestão”, sustentam os advogados.

Quanto às negociações para a saída de Alexandra Reis, que acabou por acontecer acompanhada de uma indemnização de meio milhão de euros, a defesa da TAP aponta que Oumières-Widener “decidiu e executou, à revelia do seus colegas da administração, o que quis, como quis, quando quis, tendo provocado uma pura situação de facto consumado”, “assinando um acordo ilegal e para o qual não tinha poderes”.

Christine Ourmières-Widener foi exonerada por justa causa, em abril de 2023, no seguimento da polémica indemnização de 500.000 euros à antiga administradora Alexandra Reis, que levou à demissão do então ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, e do seu secretário de Estado Hugo Mendes, e à constituição de uma comissão parlamentar de inquérito à gestão da companhia aérea.

Ex-CEO violou deveres por ocultar acordo de saída de Alexandra Reis

A TAP acusou a ex-presidente executiva (CEO) de violar “grosseiramente” os deveres de administradora, ao ocultar o acordo de saída de Alexandra Reis da maioria dos membros do Conselho de Administração, que souberam pela comunicação social.

“A Autora [Christine OUrmières-Widener] ocultou a celebração do acordo de cessação da maioria dos membros do Conselho de Administração, os quais sofreram o vexame de saber pela comunicação social, no final de 2022, que a empresa de que eram administradores havia pago mais de meio milhão de euros à engenheira Alexandra Reis para esta sair”, lê-se na contestação da companhia aérea à ação judicial da ex-CEO para contestar o despedimento por justa causa.

Segundo o documento, a que a Lusa teve hoje acesso, os advogados apontam que a ex-CEO negociou um contrato com a então administradora Alexandra Reis, sem submeter os termos e a decisão de o assinar ao Conselho de Administração ou à Comissão Executiva.

Adicionalmente, a defesa indica que Christine Ourmières-Widener também não informou os acionistas – Estado, representado pela Direção-Geral do Tesouro e Finanças (DGTF) - daquela decisão.

Na sua ação, a defesa de Ourmières-Widener alega que informou o ministro das infraestruturas e Habitação (MIH) e o secretário de Estado das Infraestruturas (SEI), à data Pedro Nuno Santos e Hugo Mendes, respetivamente.

“O MIH e o SEI não exerciam a função acionista do Estado Português na TAP SA ou na TAP SGPS, função que, nos termos do RJSPE [Regime Jurídico do Setor Público Empresarial], era exercida exclusivamente pelo ministro das Finanças e pelo secretário de Estado do Tesouro”, sublinham os advogados da TAP da sociedade Uría Menéndez - Proença de Carvalho.

Para a defesa, ignorar esta circunstância indicia o “nível de zelo e cuidado” que a ex-CEO impunha no exercício das suas funções, acrescentando que “falar por ‘whatsapp’ com um secretário de Estado e pensar que está a ter uma deliberação dos acionistas, como se estivesse a falar com o sócio único de uma sociedade unipessoal por quotas, demonstra uma conduta grosseiramente negligente e uma total inépcia para o cargo”.

A contestação nega também que as Infraestruturas e Habitação tenham dado ordens expressas para centralizar as comunicações com o Governo através daquele ministério e assinala que a ex-CEO continuou a contactar diretamente por email com o secretário de Estado do Tesouro, João Nuno Mendes, e por ‘whatsapp’ com o ministro das Finanças, Fernando Medina.

A defesa da companhia desvaloriza o papel da gestora francesa nos primeiros resultados financeiros positivos pós-pandemia, considerando que se deveram “não às suas ‘expertises’ de gestão, mas sim, globalmente, a uma à recuperação antecipada e surpreendente […] da economia mundial”.

Relacionados

Empresas

Mais Empresas

Patrocinados