A revista morreu, longa vida à revista

13 fev 2022, 17:30
Revista Cor-de-Rosa de Ana Sampaio e Maia (Foto: Bruno Simão)

Em ‘Revista Cor-de-Rosa’, Ana Sampaio e Maia recupera um género com longas raízes, para lançar questões sobre o sistema cultural português. Afinal, não é tudo brilho e plumas

Há coisas que passam de geração em geração, como o amor pela arte. Neste caso concreto, o de Ana Sampaio e Maia, a curiosidade pelo teatro de revista. Foi dos avós que foi recebendo textos e referências deste género, que agora reinterpreta em palco.

“O meu avô tinha uma associação em Mindelo. É aí que se inicia a minha pesquisa”, conta a autora de “Revista Cor-de-Rosa”. Um título em duplo sentido, entre o glamour da cor e a imprensa dedicada aos famosos, precisamente para desconstruir ideias pré-concebidas.

Ana Sampaio e Maia admite ter pena de não ter assistido à revista durante o seu período áureo, entre as décadas de 1960 e 1980. E, também por isso, a empreitada deste espetáculo pode ser “bastante traiçoeira”. “Não tenho idade para ter experienciado, como público, a revista no seu auge”.

Mas há algo que fica claro: do meio teatral à revista, as distâncias parecem aumentar a cada dia. Só para dar o exemplo: a atriz e encenadora faz um espetáculo assente em apoios públicos, na revista a lógica da produção tende a envolver um empresário. Os circuitos e o público são distintos. “Fiz uma audição para uma revista no Maria Matos, pude perceber que não conhecia quase ninguém que concorria ao papel”.

Mas há margens para pontes. “E a prova viva é que estou a fazer um espetáculo assente no teatro de revista. É um caminho pessoal de vontade e de curiosidade individual. Lá porque ouço jazz não quer dizer que não vá ouvir a Mónica Sintra”. A criadora acredita naquilo que pode sair destes cruzamentos.

Carreira do espetáculo teve de ser encurtada, ficando em cena apenas uma semana (Foto: Bruno Simão)

Nesta “Revista Cor-de-Rosa” procura-se, a partir dos códigos da revista, questionar o panorama cultural português. Entre outras coisas, os intérpretes fazem “uma caricatura dos atores conhecidos do grande público”, para criticar uma vida de facilidades que as revistas associam à profissão, esquecendo todos os outros que, nos palcos do país, lutam a cada dia.

É, no fundo, rir da desgraça enquanto se “desafia o sistema”. E, com isso, introduz-se o cunho político que o género da revista cultivou – e continua a cultivar, embora muitos a digam ‘moribunda’ - ao longo de décadas. “Querer falar do setor de uma forma satírica e sem ser hermético, é algo político”, resume a criadora.

Um caso positivo de covid-19 na equipa obrigou a encurtar a carreira. A peça está em cena na Escola de Mulheres a partir de quinta-feira, 17 de fevereiro. Para compensar, no domingo, 20, haverá dose dupla.

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