Autarca de Kiev em guerra com Zelensky: "Alguém quer voltar a controlar a capital. Já ganhámos? Eu sou o maior problema agora?"

22 jun 2023, 09:39
Vitali Klitschko (Andrew Kravchenko/AP)

Em causa estará um recente bombardeamento que matou três pessoas na capital do país. Os dois nunca tiveram uma boa relação, nem sequer há registo de fotos em que os dois estejam juntos

“Existe uma campanha feroz para desacreditar o governo da cidade de Kiev”. Quem o diz é o próprio autarca da capital ucraniana, que teceu duras críticas ao “governo central”, marcando uma posição clara contra a liderança de Zelensky.

A tensão entre Vitali Klitschko e Volodymyr Zelensky não é de agora, mas as palavras do autarca trazem o conflito interno para um novo tom. “Buscas sem fim pararam o trabalho dos departamentos e serviços da cidade. O caos está a ser introduzido durante a gestão de uma guerra e infraestruturas críticas não estão a conseguir acompanhar a carga de trabalho. Os mesmos documentos estão a ser repetidamente pedidos”, afirmou o autarca de Kiev, através de um vídeo publicado no YouTube.

Entende o autarca que o governo ucraniano está a “tentar o seu melhor para arruinar” a sua reputação, acusando o governo central de “entregar notas de culpa” aos seus funcionários, enquanto os acusam de serem culpados.

“Mas, quando os casos chegarem a tribunal, não vamos ouvir quaisquer pedidos de desculpa”, acrescentou.

Vitali Klischko mencionou em concreto a detenção do diretor do Departamento de Segurança Municipal de Kiev, Roman Tkachuk, que é suspeito de negligência grosseira na gestão da cidade.

O autarca afirmou-se “indignado” com a detenção, garantindo que nenhum dos responsáveis do governo central foi afetado no raide à administração da capital.

“Como podemos falar de objetividade e ausência de motivações políticas?”, questionou, sugerindo que existe uma clara perseguição à sua figura.

“Alguém quer voltar a controlar a capital. Já ganhámos [a guerra contra a Rússia]? Klitschko é o maior problema agora?”, reiterou.

Abrigos fechados fazem disparar guerra interna

A 15 de junho o jornal ucraniano Pravda avançou que Volodymyr Zelensky estaria a pensar em retirar Vitali Klitschko da administração estatal da cidade. Um cenário em que o autarca poderia continuar a liderar o município, mas no qual perderia força como figura política.

A mesma notícia dava conta de que o presidente ucraniano estava a considerar o nome do atual ministro das Indústrias Estratégicas, Oleksandr Kamyshin, para substituir Vitali Klitschko naquele cargo.

O Pravda refere que esta demissão já é pensada por Volodymyr Zelensky desde 2019, mas um episódio ocorrido há semanas poderá ter feito acelerar o processo. É que três pessoas morreram após um ataque russo a Kiev, no final de maio. Acabou por se descobrir que as vítimas foram impedidas de entrar num dos abrigos da capital, o que motivou duras críticas do governo central.

"Infelizmente, ainda hoje, depois de tudo isto, os residentes de Kiev continuam a publicar informação sobre a inacessibilidade dos abrigos. Não apenas de abrigos fechados, mas de entradas de abrigos guardadas, ausência de abrigos em alguns locais da cidade. Este nível de negligência na cidade não pode ser justificado de forma nenhuma", afirmou Volodymyr Zelensky, que anunciou uma inspeção ao caso.

Ainda antes do presidente ucraniano falar foi o ministro do Interior da Ucrânia, Ihor Klymenko, a tecer críticas à autarquia de Kiev. "Quaisquer violações encontradas devem ser documentadas e os responsáveis devem ser trazidos à justiça", afirmou, dizendo mesmo que fechar abrigos num cenário destes é "um crime". O mesmo ministro avançou, no início deste mês, que apenas 597 dos 1.078 abrigos da cidade estavam em condições de serem utilizados. Outros 359 estavam sem condições e 122 estavam fechados.

As críticas de um lado e do outro não são novas. Ainda em 2020, bem antes da guerra, e logo após as autárquicas, os dois deram a entender que não partilhavam a mesma visão. Problema que se arrastou para a guerra, e que tem surgindo de quando em vez. Em novembro de 2022, por exemplo, Volodymyr Zelensky acusou Kiev de não estar a fazer tudo o que era possível para proteger a população. "Eu sei que, infelizmente não em todas as cidades, o governo local tem feito um bom trabalho. Em particular existem muitas queixas em Kiev. Por favor, prestem atenção. Os residentes de Kiev precisa de mais proteção", afirmou, já na altura questionando a ausência de abrigos em todas as partes da cidade.

Curiosamente, e ainda antes de se tornar autarca de Kiev, Vitali Klitschko marcou, em 2019, uma das primeiras posições contra Volodymyr Zelensky. Numa entrevista à DW concedida com o irmão, o famoso pugilista Wladimir Klitschko, o agora autarca de Kiev confessou ter votado em Petro Poroshenko nas presidenciais que deram a vitória a Volodymyr Zelensky.

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