Da intensidade e perspicácia portista ao desgaste físico à falência tática sportinguista
Intenso e vertical, o FC Porto conseguiu uma vitória clara no clássico da 23ª jornada, provocando rasgos na cobertura montada pelo Sporting.A frágil cobertura às opções principais de Marco Silva ficou evidente, uma vez mais, depois da na desgastante missão europeia com o Wolfsburgo. Podemos discutir se o técnico podia ter efetuado mais do que uma alteração na equipa inicial, mas escasseiam opções que ofereçam as mesmas garantias, sobretudo num cenário como este.
Montero foi a única novidade no onze, e voltou a desaproveitar a oportunidade. Tanaka parece em melhor momento, mesmo tendo em conta os falhanços de quinta-feira, e relativamente a Slimani teremos de assumir que não estava em condições de jogar de início. Adrien vai somando exibições discretas, mas o outro «8» do plantel é João Mário, que joga um pouco mais à frente, e André Martins também não tem conseguido intrometer-se na luta pela titularidade (não terá Gauld de começar a aparecer mais frequentemente?).
A verdade é que, tirando a questão do ponta de lança, e excluindo Jefferson das contas pelos motivos conhecidos, quem escolheria um onze diferente? Mesmo sabendo do desgaste inerente ao jogo de quinta-feira, cuja fatura foi paga neste domingo.
O Sporting até entrou bem no jogo, com uma pressão alta que condicionou o FC Porto nos primeiros 15/20 minutos. A estratégia de Marco Silva passava por esperar pelo momento em que a bola chegava a Marcano, e então procurar provocar o erro. Os dragões provaram do seu veneno, pois também se sentem mais confortáveis a pressionar no meio-campo contrário, a reagir rapidamente à perda de bola e a recuperá-la logo de seguida.
Postura passiva da primeira linha defensiva (Montero-João Mário) quando a bola vai para Maicon
Pressão ativa quando a bola vai para Marcano
Só que essa coesão leonina cedo se perdeu, ao mesmo tempo que a crescente intensidade portista ia provocando rasgos na cobertura tática que Marco Silva tinha delineado. Faltou frescura, e Tobias Figueiredo até terá sido o exemplo mais evidente. Basta recordar o lance ao minuto 50, em que perde a bola na defesa para Jackson e depois revela muitas dificuldades para reposicionar-se e mesmo para reagir, até na abordagem ao lance na grande área, ainda que não existissem razões para assinalar a grande penalidade que o colombiano pediu.
À medida que aumentava o fosso entre a defesa e o setor intermédio, o Sporting destapava o problema crónico de controlo da profundidade na linha mais recuada. O FC Porto foi sagaz a tirar proveito disso, explorando o espaço entre Tobias e Jonathan. Se no primeiro golo o apontamento genial de Jackson sobrepõe-se à descoordenação sportinguista, estranhamente gerado a partir de um pontapé de baliza de Rui Patrício, os outros dois tentos expuseram claro desnorte visitante.
O espaço à disposição do calcanhar de Jackson
No lance do segundo golo Tobias corta a bola para a zona de meio-campo, e na sequência acaba por perder o contacto com Jackson. O colombiano não está longe quando recebe a bola, devolvida por Alex Sandro, mas o central leonino hesita entre encurtar o espaço ou acompanhar o recuo dos colegas. Jonathan, que procurava fechar por dentro, pouco podia fazer perante a velocidade de Tello, até pela vantagem promovida pelo mau posicionamento de Cédric, do lado contrário, a colocar o espanhol em jogo.
Embora próximo de Jackson, quando este recebe a bola, Tobias opta por recuar e não atacar o portador da bola
Desgastado fisicamente, e por consequência sem o discernimento necessário a decidir, Tobias Figueiredo voltaria a cometer novo erro no terceiro golo. William aparece ligeiramente à esquerda para receber a bola, mas Tobias opta por um passe longo para Cédric, ligeiramente adiantado do lado direito (quando se procura sair a jogar com uma linha de três nunca deve ser o jogador do meio a arriscar o passe vertical). O passe foi intercetado por Quaresma, que de imediato colocou em Herrera, na zona central. Apanhado sobre a esquerda, William tentou intercetar o passe do mexicano para Tello, mas em vão. Jonathan estava mais adiantado, como seria de esperar, tendo em conta que a equipa procurava sair para o ataque com uma primeira linha de três jogadores.
Tobias opta pelo passe longo para Cédric, que subia pela direita
Herrera procura Tello e é William que acaba por tentar intercetar o passe, sem sucesso
O argentino ficou mal na fotografia, mas só no primeiro golo fica a ideia que podia ter feito melhor. E se o álbum do clássico deve incluir os deslizes leoninos, nele devem estar também bem realçadas as virtudes portistas no jogo. Intensidade, agressividade, verticalidade e muita perspicácia.
«4x4x3» é um espaço de análise técnico-tática do jornalista Nuno Travassos. Siga-o no Twitter.