As obras de arte foram todas levadas de forma organizada em camiões e autocarros para a Crimeia. Operação durou cinco dias e envolveu cerca de 10.000 peças
Entre edifícios residenciais, infraestruturas, pontes e centrais elétricas, não é novidade que os russos deixaram para trás um rasto de destruição em Kherson, na Ucrânia. Mas agora soube-se que roubaram obras num valor ainda não estimado dos dois maiores museus da cidade - Museu de Belas Artes e o Museu Regional Local.
De acordo com o El País, que falou com a diretora do Museu de Belas Artes, Alina Dotsenko, todas as obras de arte foram levadas de forma organizada em camiões e autocarros até à Crimeia.
"Os russos entraram em Kherson a 1 de março. Vieram até ao museu, mas inicialmente não tocaram em nada. Mentimos e dissemos que a nossa coleção tinha sido retirada e durante dois meses conseguimos mantê-los afastados", explicou ao telefone, a partir de Kiev. Mas "mais tarde, os russos voltaram, vestidos à civil, mas armados".
Alina Dotsenko só agora vai poder visitar o Museu de Belas Artes e ver em que condições é que está, uma vez que teve de esperar que fosse realizada uma operação de desminagem no edifício. As obras de arte tinham sido tapadas e escondidas numa área especial, onde permaneceram trancadas, para que não fossem danificadas pelos eventuais ataques russos.
"No dia 4 de maio eles [as autoridades de ocupação russas] ligaram e propuseram montar uma exposição para o dia 9 de maio no âmbito das celebrações do Dia da Vitória. Expliquei-lhe que o museu estava fechado porque estavam a ser realizadas obras de reparação e que as obras de artes já não estavam lá. Também lhes disse que não me queria associar às autoridades de ocupação."
Dotsenko contou que os russos lhe disseram que estavam ali para libertar o povo ucraniano dos "nacionalistas radicais" e recomendaram-lhe que seguisse "o exemplo da minha colega, diretora do Museu Regional Local, que voluntariamente lhes deu a sua coleção e os recebeu com um ramo de flores". As autoridades russas acusaram-na de desrespeito e convocaram-na a estar presente no dia seguinte no Ministério Público de Kherson.
Naquela mesma noite, Alina Dotsenko fugiu da cidade e três dias depois conseguiu chegar a Kiev. A colega, do Museu Regional, terá desaparecido. Assim como também desapareceram três pessoas do Museu de Belas Artes, que, segundo a diretora, terão ajudado os russos a chegar ao local onde estavam escondidas as obras de arte.
A operação de carregamento de obras de arte durou de 31 de outubro até ao dia 4 de novembro. Os camiões e autocarros utilizados nunca seguiram em coluna, iam saindo consoante eram carregados com material.
Dotsenko revelou ao El País que das 14.000 peças que faziam parte da coleção do Museu de Belas Artes, cerca de 10.000 apareceram no Museu de Taurid, em Simferopol, na Crimeia. Uma informação confirmada pelo diretor Andréi Malguín: "Temos aqui 10.000 peças e estamos a fazer um inventário."
O Ministério da Cultura da Crimeia emitiu um comunicado a confirmar que as obras estavam ali guardadas e ali iriam permanecer até que recebesse um pedido para que fossem devolvidas.
Malguín garantiu ainda que as obras estão protegidas das ações da guerra e foram colocadas na "sala de concertos, por ser o único espaço grande o suficiente". O Museu de Belas Artes de Kherson albergava peças do século XVII até aos dias atuais.