"Senti-me aterrorizado e desprotegido”. Luso-israelita sentiu medo pela primeira vez, mas recusa abandonar Israel

11 out 2023, 19:56
Prédios reduzidos a pó e ruas viram empilhados de entulho: assim está a Faixa de Gaza passados só três dias (AP)

Luso-israelita descreve o cenário de guerra a que tem assistido desde 7 de outubro. Confessa medo, por tudo o que tem visto, mas recusa abandonar o país

Poderia ter sido mais um sábado normal, em que um israelita, às primeiras horas da manhã de sábado, acaba de acordar. As sirenes que soaram poderiam ter sido as mesmas que há muito habituaram aqueles que vivem na Terra Santa. Mas aquilo que até agora fazia apenas disparar os corações tornou-se realidade, deixando em pânico os israelitas. 

“As sirenes tocaram às seis da manhã, mas não demos grande importância porque já estamos habituados. Só não esperávamos que desta vez acontecesse aquilo a que todo o mundo está a assistir.” De voz trémula e palavras frágeis, é desta forma que Joshua (nome fictício), luso-israelita, começa por explicar a situação atual que vive em Israel.  

Mora em Ramat Gan, cidade localizada a escassos quilómetros de Telavive. Tem 34 anos e é casado com uma israelita, de quem espera o terceiro filho. Nasceu lá, mas poucos meses depois os pais decidiram vir para Portugal, onde viveu até aos 21 anos. Foi estudar engenharia aeroespacial para Toulouse, em França, ficou lá a trabalhar e em 2013, meses após o ataque terrorista de Mohammed Merah, jihadista francês que matou sete pessoas, sente que deixa de ser bem-vindo e decide abandonar o país. 

É no momento da partida que recebe uma proposta de emprego em Israel e, sem pensar duas vezes, aceita-a e muda-se de vez para o país que o viu nascer. “Nunca me senti exposto à insegurança. Nunca senti medo de andar em liberdade nas ruas, mas ontem saí pela primeira vez de casa, após os ataques, e assim que meti os pés fora de casa senti-me aterrorizado e desprotegido”, assume após dez anos de uma vida tranquila e feliz em Israel. “Recebemos a notícia de que o pai do educador de infância de um dos meus filhos foi raptado e levado para a Faixa de Gaza. Como é que é suposto reagirmos a isto?”, questiona. “Felizmente nenhum ente querido meu sofreu nas mãos do Hamas, mas tenho visto vídeos nas redes sociais que ferem o coração de qualquer um”, acrescenta, revelando que existe a preocupação constante de querer saber se os seus estão em segurança. 

Ainda que em cenário diário de guerra, não tenciona abandonar Israel. Tem grande parte da família em Portugal, que vê uma ou outra vez por ano, nas férias, mas assume que só virá para cá “se a situação escalar muito e Israel perder o controlo do conflito”. “Não abandono Israel, esta é a minha casa”, argumenta.  

Assume-se esperançoso. Acredita no poder da força israelita e espera ver a situação resolvida em poucas semanas. “O objetivo deles é só um: matar. Mas nós já estamos habituados ao inimigo, conhecemo-lo bem”, explica.  

No entanto, Joshua lembra que a população não foi avisada previamente sobre um possível ataque em grande escala, como o que veio a acontecer. “Desta vez falharam connosco. Questionamo-nos sobre o que terá acontecido para a inteligência interna israelita ter falhado e ter deixado que este massacre acontecesse”, lamenta, considerando, apesar de tudo, que não é tempo de perguntas ou investigações: “O país tem de estar unido.” 

Existem 170 mil soldados à disposição e já foram chamados 300 mil reservistas. Joshua explica que não poderá ajudar na frente de combate, por não ter tido treino militar em Israel, mas tem três primos que foram agora chamados para se juntarem aos militares. “Os meus primos e todos aqueles que são chamados não vão com medo ou tristeza, vão antes com o sentimento de honra por saberem que vão servir o país”, garante, ainda que tenha uma avó a escassos metros, aterrorizada, e em constante sofrimento por saber que poderá não voltar a ver os seus netos. 

Não dormem sossegados há mais de três dias. Estão fechados em casa, mas de olhos postos no exterior. Os telemóveis tornaram-se a principal fonte de informação e entre as infinitas chamadas a pergunta é sempre a mesma: “Estão todos bem?”. 

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