O aluno de Massamá que esfaqueou três colegas e uma funcionária. Plano passava por massacre com 60 mortes

11 fev 2022, 10:39

Jovem detido esta quinta-feira não foi o primeiro a planear um ataque a uma escola. Documentos apreendidos na fase de investigação deste caso, em 2013, apontavam que o jovem tinha como objetivo "matar, pelo menos, 60 pessoas para bater o recorde” dos casos de homicídios em massa internacionais

Massamá, dia 14 de outubro de 2013, é o dia que muitos antigos alunos da Escola Secundária Stuart de Carvalhais nunca esquecerão. Ao início da tarde, por volta das 16:15, a PSP é chamada ao estabelecimento de ensino, após três alunos e uma funcionária terem sido esfaqueados por outro estudante. Um quarto aluno ficou também ferido, depois de cair enquanto fugia da ameaça: um colega de 15 anos.

À chegada à Stuart de Carvalhais, os agentes depararam-se com um cenário atípico. Não se tratava de nenhuma rixa, não era um desentendimento entre alunos que acabara em violência, nem era também nenhum ajuste de contas. Na mochila do agressor estavam “cinco [embalagens de] fumos de cor verde e amarela com base vermelha, uma [embalagem] de fumo de cor verde e amarela com base vermelha deflagrado, uma de gás pimenta, três frascos de álcool, uma caixa de fósforos e dois isqueiros”, de acordo com as autoridades. Um contexto que remetia para cenários de massacres em escolas como aconteceu em Columbine, Stockton ou Santa Fé, nos Estados Unidos. As autoridades pareciam não ter dúvidas: a intenção era “matar indiscriminadamente”, motivado por “um episódio psicótico”, descrevia a PSP.

“O jovem descompensou e começou a esfaquear pessoas. Queria cometer um assassinato em série, como se vê nas televisões”, disse a fonte da PSP no dia do incidente.

O suspeito acabou por fugir da escola, mas foi intercetado pelas autoridades ainda nas imediações do recinto escolar. Tinha 15 anos, sofria “bullying” na escola e acabou por ficar internado.

“Tratou-se de um ato isolado que nunca aconteceu nesta escola”, explicava o vice-presidente da associação pais da escola, José Manuel Carreira, em declarações à TVI24 no dia da ocorrência. Mas nem isso impediu que dezenas de encarregados de edução se dirigissem para a Secundária de Massamá num pranto de preocupações.

Já os pais do suspeito tiveram como destino a esquadra da PSP. Nenhum dos progenitores queria acreditar e reiteravam que “não havia sinal evidente que ele iria fazer isto”. “Os pais do suspeito já estiveram na esquadra e estão em choque”, adiantava a PSP.

O caso motivou até uma reação do Ministério da Educação, que lamentou o incidente e desejou “rápidas melhoras aos alunos e à funcionária atingidos”. O responsável máximo pelo ensino em Portugal garantia ainda que a escola iria “instaurar um processo disciplinar”.

Tanto os três alunos como a funcionária sobreviveram aos ataques. A trabalhadora da escola foi mesmo quem inspirou mais cuidados, por ter sido ferida no pescoço; os estudantes sofreram apenas ferimentos ligeiros.

Plano era um massacre com pelo menos 60 mortos

O plano era “imitar um massacre e matar, pelo menos, 60 pessoas”, explicou à Lusa fonte policial, dois dias depois dos acontecimentos.

A investigação apreendeu uma folha A4 ao menor, onde este descrevia “com bastante pormenor o plano de massacre”, nomeadamente “os materiais a usar, as aulas onde estariam mais alunos, o modo e a estratégia de atuação e os objetivos a atingir, sendo que queria matar, pelo menos, 60 pessoas para bater o recorde”.

O suspeito referiu ainda às autoridades que pretendia “imitar um massacre”, dando como exemplo os casos do Instituto de Columbine e o da escola primária Sandy Hook (EUA), culminando o plano com a sua “fuga e suicídio”.

De acordo com a lista do material a usar pelo jovem, havia “facas, fumos, bombas caseiras, gás pimenta, um bastão, gasolina, álcool, fósforos, isqueiro e uma espingarda”. Além disso, foi ainda apreendida a faca utilizada na agressão, quatro facas de vários tamanhos, um cachecol e um gorro, com os quais, disse, “pretendia causar mais medo e receio aos colegas de turma” da Secundária Stuart Carvalhais.

Agressor já tinha historial de violência na escola

“No ano transato, o agressor já tinha tentado atingir um professor com uma pedra que lançou para a sala de aulas, tendo apenas partido o vidro”, dizia a investigação. Outro dos episódios apurados pelas autoridades era um em que o suspeito “incendiou um caixote do lixo numa zona de Belas”.

Um colega do jovem informou ainda as autoridades de que o mesmo tentou “adquirir uma arma de fogo, pelo que lhe propôs falsamente a venda de uma, tendo o suspeito oferecido 170 euros”.

“Ofereceu uma PlayStation e cinco jogos ao colega, mas o negócio não se concretizou”, por falta de dinheiro.

O que aconteceu ao jovem?

No dia seguinte ao incidente, o menor foi ouvido Tribunal de Família e Menores de Sintra durante cerca de seis horas, depois de ter passado a noite nas instalações do Comando Metropolitano de Lisboa.

O juiz ordenou o internamento compulsivo numa instituição, onde o jovem receberia acompanhamento psiquiátrico, revelou o advogado do menor. O estudante acabou por ser acusado pela prática dos crimes de terrorismo e de tentativa de homicídio. O Ministério Público (MP) pediu como “medida definitiva o internamento em regime fechado durante 30 meses”.

Antes das alegações finais da fase de acusação do julgamento, o procurador do MP deixou cair o crime de terrorismo e as 66 tentativas de homicídio. O jovem foi, então, julgado por três crimes de homicídio tentado e três crimes de ofensas corporais.

O julgamento acabou por decorrer à porta fechada, o tribunal justificou a decisão com a “salvaguarda da imagem, do estado psíquico e a ingenuidade do comportamento do jovem, atendendo à especificidade dos crimes que lhe estão imputados e ao grande alarme social que os mesmos provocaram na comunidade em geral”.

No dia 4 de fevereiro de 2014, o Tribunal de Família e Menores de Sintra sentenciou-o a dois anos e meio de internamento, em regime fechado. A pena referia-se a três crimes de homicídio qualificado na forma tentada e por um crime de detenção de arma proibida.

A defesa recorreu da decisão para o Tribunal da Relação de Lisboa, que acabou por manter a pena do tribunal de primeira instância. No entanto, o jovem acabou por ser libertado temporariamente após seis meses de internamento num centro educativo nos Olivais, por atrasos no processo, tendo regressado para cumprir o resto da pena.

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