Portugal ganhou um treinador

27 jun 2000, 20:10

EDITORIAL

Aconteça o que acontecer amanhã, quando uns tombarem no relvado e outros se perderem em alegres correrias, Portugal já ganhou. Não uma equipa, que já tinha, não este lugar na História, que já conquistara, não o respeito da Europa, que já merecia. 

A novidade desde Europeu tem sido a atitude de Portugal. Mesmo quando as exibições não convenceram, os golos tardaram e os lugares no «onze» não chegaram para todos, a equipa manteve-se unida. 

O jogo com a Alemanha é a chave da participação no Euro. No passado, esse teria sido um desafio perdido à nascença. Em campo com os «outros», Portugal entraria para perder por poucos, olhando tímido para a própria sombra. Desta vez os que Humberto chamou apareceram de peito feito, convencidos do valor que têm. E espantaram a Europa. Ao fazê-lo colocaram saudável pressão sobre os «habituais» e sobre os adversários, surpreendidos pela força da segunda linha. 

Nessa como em outras ocasiões, Humberto Coelho esteve muito bem. É difícil gostar do seleccionador nacional. Sorri pouco, não tem um passado no banco que o sustente, as suas frases jamais surgirão editadas em livro, ninguém se lembra de uma ideia inesperada e brilhante. 

Mas, no entanto, as decisões de Humberto convencem. Não são politicamente correctas, denotam coragem, fazem crer que por detrás das palavras existe determinação. Recordam o homem que durante anos liderou o Benfica nos relvados. 

Amanhã ver-se-á se Portugal iguala o resultado de 1984 ou se acrescenta uma página inédita ao livro nacional. Uma coisa é certa: o futebol português recuperou um treinador. Humberto Coelho, sem ter o currículo de outros, inscreveu o nome ao lado dos melhores. 

Se é verdade que teve a oportunidade de dirigir estes jogadores quando eles conseguiram, finalmente, juntar a maturidade ao talento, não é justo resumir Humberto à felicidade de ser o homem certo no local exacto. O seleccionador conseguiu ser mais do que isso. 

Infelizmente para o futebol português, a maioria dos jogadores que formam esta equipa actua no estrangeiro. Bom para eles, mau para quem passa o ano sentado nos estádios de cá. Talvez por isso, aposto que as próximas discussões nada terão de construtivas. O último apito no Euro-2000 será o sinal que muitos esperam para iniciar o debate por que anseiam: deve Humberto Coelho continuar? 

Depois das dúzias de páginas de balanço, das entrevistas sorridentes e dos debates estéreis seguir-se-ão as polémicas de sempre. Para um dia ficará o imenso resto: formação, número de clubes profissionais, solidez financeira. Portugal corre o risco de ser lembrado como o país que tinha selecção sem ter futebol.

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