Gil Vicente-Sp. Braga, 1-0 (crónica)

7 fev 2004, 00:35

A vitória, o desperdício e o credo na boca

Foi um derby entretido. Um derby que ficou tanto mais entretido quanto o tempo corria. Começou por ser praticamente de sentido único, o da baliza de Quim, percorreu toda a primeira parte nesse registo solitário, mas melhorou com o intervalo e a percepção da parte do Sp. Braga de que havia que disputar o resultado. A formação de Jesualdo Ferreira recolheu aos balneários em desvantagem e isso era o melhor que o jogo podia pedir. A partir daí os bracarenses largaram as amarras, estenderam-se no terreno, procuraram o golo e fizeram por justificar a emoção que se imagina dever assistir a qualquer derby que se preze. Este, entre o Gil Vicente e o Sp. Braga, é um derby menor, um derby regional, mas em Portugal é já dos que recolhe mais tradições. A emoção com que terminou fez por respeitar essas tradições.

A vitória do Gil Vicente, essa, justifica-se pela lógica. Foi a melhor equipa, logo ganhou. Ganhou bem. Podia até ter ganho com mais tranquilidade, mas não o conseguiu. Falhou em demasia à frente da baliza. Por momentos pensou-se mesmo que o velho ditado que sublinha não haver duas sem três não fosse mentiroso, e que o Gil Vicente pudesse completar a terceira partida a perder depois de ter entrado a ganhar. O desperdício da primeira metade e a reacção bracarense na etapa complementar alimentavam todas as superstições. Foi só uma impressão. Até porque, mesmo que tenha terminado o jogo com o credo na boca, os gilistas nunca deixaram de querer disputar o jogo. Nunca deixaram de atacar, de procurar a tranquilidade. Também por isso ganharam bem.

Com esta vitória, o Gil Vicente galgou duas posições até ao décimo lugar, com 25 pontos e muito desafogo em relação aos lugares onde a corda mais aperta. Já o Sp. Braga continua na quinta posição, com os mesmo pontos do Beira Mar, quarto classificado, mas com mais um jogo. E fica também à mercê do Boavista. No final da jornada, os arsenalistas podem cair para o sexto posto. E passarem a ser cada vez menos a sensação do campeonato. Para já vão também quatro jogos sem ganhar.

Uma questão de princípio

A história deste jogo acaba por não ser verdadeiramente uma surpresa. As formações que de um lado e de outro subiram ao relvado permitiam logo a perceber que se tratava de um Sp. Braga mais cauteloso. Jesualdo Ferreira deixou Wooter no banco (o holandês regressava após lesão) e não se preocupou em colocar outro número 10 no terreno. Preferiu reforçar a zona defensiva com três médios de contenção (Barroso, Vanzini e Frederik). Ora tantas cautelas trazem suspeitas. Suspeitas confirmadas com o início da partida e a superioridade marcante do Gil Vicente. Se a ideia era dar mais força à intermediária, foi então também uma aposta falhada. Mesmo jogando também apenas com três homens no meio-campo, a formação da casa foi mais forte e ganhou metros aos adversários. Sem superioridade na intermediária nem acutilância na frente, os bracarenses tornaram-se presas fáceis.

A tudo isto há que acrescentar mais duas ideias. Primeira: Kenedy foi uma aposta falhada no lado esquerdo. O internacional está, naturalmente, sem ritmo de jogo, o que se notou em vários momentos. Não teve velocidade, não teve entendimento com os colegas e não teve capacidade de assistência. Os cruzamentos que efectuou foram até embaraçosos. Segunda: sem Nem, a defesa do Braga aproxima-se muito da manteiga. Nem precisa de estar quente para qualquer faca por lá entrar. Nas bolas aéreas, então, a permeabilidade foi confrangedora. A resposta a tudo isto do Gil Vicente fez-se com consistência no meio-campo, capacidade de penetração pelas alas e apoio da rectaguarda. A equipa funcionou como uma equipa, conseguiu jogar um futebol fluído e penetrante. O golo veio com naturalidade.

Jesualdo teve que mexer ao intervalo e lançou Wooter para o lugar de Vanzini. A entrada do holandês, perito em fazer jogar e dar fluidez ao futebol da equipa, trouxe imediatos resultados. A equipa cresceu, ganhou capacidade de jogar no meio-campo adversário e de fabricar jogadas de perigo. Valeu aí, ao Gil Vicente, a excelente exibição de Paulo Jorge. Corroborando até a noite inspirada de Quim, no outro extremo. Em duas ocasiões o guardião gilista evitou dois golos feitos. Sentido a necessidade de apostar tudo, Jesulado Ferreira acrescentou Foley à frente de ataque. O irlandês meteu-se porém numa escaramuça com Gaspar da qual terminaram os dois expulsos. O prejuízo pareceu ser maior para o Sp. Braga. Até porque Luís Campos respondeu com Braima como terceiro central e a defesa gilista fechou-se a sete trancas. Olegário Benquerença não teve, de resto, uma noite feliz. Exagerou nos cartões e na quantidade de faltas assinaladas. O Sp. Braga queixa-se ainda do golo de Ferreira II, o qual é precedido de uma simulação. Talvez com razão. Era mesmo para amarelo e, nesse caso, a jogada deveria ter sido interrompida.

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