«Tenho uma inveja boa, qualquer jogador quer jogar neste Sporting»

16 fev, 23:45
André Martins (AP)

Entrevista a André Martins – parte III

Para André Martins, tudo começou em Argoncilhe, no clube da terra, em Santa Maria da Feira. Do centro do país para Alcochete – e para a chegada difícil ao Sporting – nem meia-dúzia de anos passaram, com o Feirense pelo meio.

Fez-se homem e atleta nos leões, cumpriu um sonho de leão ao peito e saiu de Portugal para ganhar títulos, já depois de se estrear pela Seleção Nacional.

Olympiakos, Legia de Varsóvia e Hapoel Beer Sheva foram as casas que escolheu, todas com as suas particularidades, mas com uma coisa em comum: títulos.

Deixou Israel no final da época passada, com outra experiência em vista, mas o telefone tocou e nenhuma proposta pareceu suficientemente sedutora para fazer o médio dizer que sim.

Agora, aos 34 anos, os meses em casa começam a pesar-lhe na carreira, e por isso há uma decisão que começa a fazer eco na cabeça de André Martins: o difícil momento de pendurar as botas.

Em entrevista ao Maisfutebol, André Martins revela em que ponto da carreira está, revisita o passado e projeta o futuro. Na parte II, o futebolista relembra os primeiros anos na Academia de Alcochete e aborda o presente do Sporting, um clube hoje em dia diferente daquele que viveu por dentro.

PARTE I: André Martins pondera acabar a carreira: «Se não surgir nada...»

PARTE II: «O Sporting passou a ser a minha cadeira de sonho e acabei por me acomodar»

PARTE IV: «Ficava sempre com a ideia de que Jorge Jesus não dormia»

PARTE V: «Ainda apanhei um ou dois sustos em Israel, tive de dormir no "bunker"»

Maisfutebol – Como começa a ligação ao futebol?

André Martins – Nunca me foi incutido nada, mas os meus pais dizem que já nasci com este gosto. Desde muito pequeno que andava sempre com uma bola atrás, o que mais gostava de fazer era jogar futebol. Aconteceu naturalmente na minha vida, comecei no clube da minha terra e desde cedo perceberam que eu tinha alguma qualidade. A partir daí foi sempre a dar passos em frente. Para mim, o segredo de tudo – e se formos a ver pelos melhores jogadores do mundo –, é a base familiar, e eu tive uma muito forte e que suportou os sacrifícios e todas as coisas que tive de fazer.

Não muito tempo depois de começar a jogar futebol, dá-se a mudança para o Sporting.

Sim, fui com 12 anos para a Academia de Alcochete, era o segundo ano da academia.

Como é que foi esse processo?

Eu era um miúdo que estava muito habituado a casa, a estar com os meus pais, saía muito pouco. Mesmo para dormir em casa de amigos de escola, não tinha muito esse hábito. Foi a parte mais difícil, mudar-me para tão longe dos meus pais e deixar de os ver diariamente. Mesmo assim, tenho a sorte de ter os pais que tenho: todos os fins de semana faziam a viagem para Lisboa para verem o jogo e estarem duas ou três horas comigo. Foi uma parte muito dolorosa, custou-me imenso estar longe deles. O meu irmão também tinha acabado de nascer, tinha cerca de dois anos quando me mudei para a academia, portanto também foi difícil não o ver crescer. Mas lá está, estava a lutar pelos meus sonhos, e acho que hoje, tanto eu como os meus pais, estamos orgulhosos do que conseguimos.

E quanto tempo é que demorou essa adaptação?

Há uma história que é conhecida. Estava mesmo a custar-me imenso, pensei que não ia aguentar as saudades e que não ia conseguir estar longe dos meus pais. E na altura, o Sr. Aurélio Pereira – porque a experiência era muita – lidou com naturalidade com a situação: chamou-me, disse-me que era normal eu estar assim, mas que íamos combinar uma coisa. Estávamos ali em agosto, setembro, e ele disse-me: “Vais ficar até ao Natal e se nessa altura não conseguires, vais para casa dos teus pais e jogas no clube da tua terra. Estás referenciado e não te preocupes que com a tua qualidade, quando for mais fácil, voltas daqui a um, dois anos e tens o lugar à tua espera”. Ele sabia perfeitamente que se eu ultrapassasse aquele primeiro, segundo mês, ia habituar-me, criar amizades e ia acabar por ser mais fácil para mim. Foi o que aconteceu. Os primeiros dois, três meses foram muito difíceis, mas depois disso já me sentia em casa, não me lembrava sequer que tinha passado por isso. Devo muito ao Sr. Aurélio, e ele sabe disso, porque é um amigo.

O que recorda desses tempos na Academia de Alcochete?

Tenho algumas amizades desde dessa altura: o Diogo Viana, o Diogo Amado, o Diogo Rosado, o Luisinho… são pessoas que me acompanharam nestes tempos difíceis e com os quais mantenho uma grande amizade. E depois era uma rotina normal de um miúdo. Íamos para a escola, até à idade de sub-18, sub-19, treinávamos à tarde. A partir dos juniores é que começámos a treinar de manhã. Mas eram rotinas normais. A única coisa que gostávamos de fazer era jogar futebol, mesmo nos tempos livres. Passávamos também muito tempo nos quartos uns dos outros, se calhar era a única regra que quebrávamos, até porque nos esticávamos nas horas. Mas tirando isso, acho que sempre fomos miúdos exemplares.

E como sportinguista que viveu por dentro o Sporting do início da década passada, por exemplo, como é que é ver este Sporting de hoje em dia?

Vejo com bons olhos, sinto-me bastante orgulhoso por ver o Sporting onde acho que o Sporting merece estar. Até um bocadinho com uma inveja boa, qualquer jogador gostava de jogar neste Sporting e de ser treinado pelo Ruben Amorim. É um treinador jovem, que já foi jogador, percebe perfeitamente o que é preciso, é inteligentíssimo. Para quem conhece o Ruben e trabalhou com ele, era difícil não perceber que ele ia chegar a este patamar. Sempre deu essa ideia. O trabalho está à vista de todos, mérito do presidente do Sporting, o Frederico Varandas: entrou num período conturbado e conseguiu atingir o patamar em que está hoje. O Sporting, e digo-o como adepto de futebol, acho que é a equipa mais forte do campeonato: não só porque ganha como tem os melhores jogadores, é a que joga melhor, tem o melhor treinador.

André Martins festeja um golo com Slimani no Estádio da Luz, na temporada de 2014/15

E o presidente manteve o Ruben Amorim mesmo quando o Sporting não foi campeão.

Lá está, voltamos ao tema da estabilidade: mesmo o Ruben não tendo ganho o campeonato – e mérito ao Frederico Varandas e ao Hugo Viana [diretor-desportivo] –, conseguiram manter o treinador, a base da equipa, e os jogadores que trouxeram foram reforços incríveis. Portanto, acho que há três pilares nesta evolução do Sporting: Frederico Varandas, Hugo Viana e Ruben Amorim. Como adepto do Sporting, todo o mérito a estas três pessoas. Elevaram o Sporting ao nível em que merece estar. Como sportinguista, desejo ao clube as maiores felicidades.

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