Será que o «fenómeno coreano» se pode explicar com o... ginseng?

5 jul 2002, 22:53

Produtos naturais só ajudam se houver uma preparação física bem planeada José Augusto, fisiologista do esforço, desmistifica a questão dos produtos utilizados pelos coreanos

Será mesmo que o segredo do sucesso da selecção coreana teve a ver com o... ginseng? Muito se tem debatido sobre a enorme frescura física que uma das organizadoras do mundial-2002 exibiu no grande certame do futebol internacional. O quarto lugar conquistado pela Coreia surpreendeu o Mundo, mas, antes do mais, o que saltou mais à vista na equipa de Guus Hiddink foi mesmo a condição física dos seus jogadores.

Alguns especialistas chamaram a atenção para as propriedades que um combinado de produtos naturais que os coreanos tomavam poderiam ter. Uma junção de «ginseng, carpa, sargo e ervas medicinais», de acordo com o médico da selecção sul-coreana, Kim Hyon-Chul ao diário «Dong-A-Ilbo».

Se é certo que a medicina oriental tem virtualidades que no Ocidente não foram ainda totalmente exploradas, a verdade é que a ideia de uma poção mágica coreana estará bem mais na ordem da mitologia do que, propriamente, da realidade desportiva... «O ginseng pode ter ajudado, mas não tenhamos ilusões, o que contou mesmo foi o bom trabalho realizado pelos coreanos. Tiveram condições para isso, também. Os três meses anteriores ao mundial foram exclusivamente para preparar a prova. Terá havido também a motivação de se ter jogado em casa, alguma ajuda exterior. Mas, essencialmente, houve um excelente trabalho de preparação física», considera José Augusto, fisiologista do esforço e preparador-físico da selecção nacional quando do Euro-2000, era Humberto Coelho o responsável pelo departamento técnico da Federação.

«O ginseng tem algumas propriedades interessantes, mas não faz milagres...»

Para José Augusto, «a questão do ginseng não terá sido o mais importante no sucesso da Coreia». E explica porquê: «Não há nenhum produto que resolva tudo numa equipa. O futebol é um desporto colectivo, há inúmeras variantes que podem ser decisivas. A parte física pode ser fundamental, este mundial mostrou-nos isso, mas não é um produto que vai resolver tudo. A boa condição física decorre de três factores: o treino, o descanso e a alimentação».

Este professor da Faculdade das Ciências do Desporto e da Educação Física (FCDEF) faz notar que «o ginseng terá algumas propriedades interessantes para a prática desportiva», mas chama a atenção para um factor que pode ser crucial: «Há variantes do ginseng. Se se tomar na variante pura, estamos a falar de facto de um produto natural, mas o problema é que, associado à prática desportiva, tenho conhecimento de vários casos em que a coberto de esse tipo de produtos cem por cento naturais estão incluídas substâncias como esteróides anabolisantes. Essas sim, dão uma força extraordinária, mas... são proibidas».

José Augusto ressalva que «não deve ter sido isso que se passou com a Coreia. Primeiro, porque houve controlos que se fizeram no mundial, depois porque, como disse, não vale a pena haver doping se não há um bom trabalho físico prévio. O que ficou nítido na Coreia não foi o ginseng. Foi muito mais importante tere havido um bom trabalho de treino, descanso e alimentação».

O fenómeno coreano fez com que José Augusto referisse casos sócio-culturais semelhantes: «Compara-se com os casos dos trabalhadores andinos, que em jornadas inteiras de dias sem comer, têm produtividades impressionantes comendo folha de coca. Há estudos que mostram isso bem. Neste caso, não há grandes dúvidas que tem a ver com a cocaína, que é um narcótico...»

Sobre o ginseng, José Augusto considera que «faltam estudos mais aprofundados para se perceber melhor as suas propriedades», mas este fisiologista do esforço não tem grandes dúvidas em afirmar que «não se trata de uma substância que deveria ser incluída na lista dos produtos proibidos». «Esses», observa, «estão já devidamente tipificados e reconhecidos pelo Comité Olímpico Internacional».

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