Utilização destas novas armas indiciam que "podemos estar perante uma nova fase" da guerra, com maior destaque para a Ucrânia, segundo os especialistas militares ouvidos pela CNN Portugal
Apesar de não terem sido reivindicados pela Ucrânia, os ataques desta semana a bases aéreas militares russas sugerem que o conflito pode estar a entrar numa nova fase, marcado por ofensivas ucranianas com armas de fabrico próprio.
Tendo em conta que "grande parte do equipamento ucraniano é soviético", e que o apoio militar do Ocidente à Ucrânia não vai além de equipamentos de defesa, como os sistemas lançadores de foguetes HIMARS, o major-general Agostinho Costa acredita que a Ucrânia procedeu a uma adaptação dos drones soviéticos que tinha em stock, transformando-os em autênticos mísseis balísticos de longo alcance.
"A Ucrânia foi buscar equipamentos que tinha do tempo da União Soviética - drones que têm mais de 40 anos, cuja origem era recolher imagens - e terá feito alguma modificação no sistema, carregando-os com uma carga explosiva que lhes permite colocar Moscovo ao alcance destes sistemas", afirma Agostinho Costa, em declarações à CNN Portugal.
Ou seja, a Ucrânia "transformou um drone soviético num míssil balístico com centenas de quilómetros de alcance", sintetiza.
Segundo o especialista militar, resta saber quantos drones soviéticos é que a Ucrânia terá em stock. "Se tiver poucos, usará com parcimónia", observa. Mas a verdade é que esta não é a primeira vez que a Ucrânia procede a "ações em profundidade na Rússia", lembra Agostinho Costa, apontando, por exemplo, as explosões que atingiram uma base aérea russa na Crimeia, em agosto.
Os "primeiros exemplares" de drones ucranianos
Além da adaptação de equipamentos soviéticos, a Ucrânia pode estar mesmo a fabricar as suas próprias armas de longo alcance, analisa o major-general Isidro de Morais Pereira, que acredita que os drones que esta segunda-feira atingiram as bases militares russas podem ser "os primeiros exemplares" de fabrico próprio.
"A própria Ucrânia está a produzir armas através de uma joint venture [operação conjunta] entre a Baykar [uma empresa turca de fabrico de drones e inteligência artificial] e a Motor Sich, uma empresa ucraniana de fabrico de motores de aeronaves", garante o major-general à CNN Portugal.
Ora, os drones que atingiram as bases militares russas "poderão ser os primeiros exemplares dessa produção", sugere Isidro de Morais Pereira, que classifica estas armas como autênticos "aviões não tripulados", com motores produzidos pela Ucrânia, que, lembra, construiu "o maior avião do mundo" - o Antonov An-225 Mriya.
Além disso, a Ucrânia também está a produzir munições de 152mm, que ao contrário dos calibres da NATO, de 165mm, permitem à Ucrânia continuar a usar o equipamento que tinha no tempo da União Soviética, como os obuses, uma artilharia considerada pesada pelo seu elevado poder destrutivo.
Isidro de Morais Pereira não tem dúvidas que estes equipamentos indiciam que "podemos estar perante uma nova fase" da guerra com maior destaque para a Ucrânia. "A Ucrânia está a atacar, é um facto, e ainda bem que está a atacar", salienta o especialista militar, recordando que este é um direito da Ucrânia consagrado no ordenamento jurídico internacional, assente na legítima defesa contra alvos militares.
Mas esta ofensiva ucraniana está a ser levada a cabo sem ajudas do Ocidente, ressalva o major-general, lembrando que os EUA, por exemplo "não forneceram material militar que permita à Ucrânia atacar a Rússia", pelo que qualquer armamento que atinja aquele território é de fabrico próprio.
"É importante frisar isto, porque a Rússia nunca pode dizer que está a ser atacada indiretamente pela NATO", sublinha. Precisamente para evitar esse tipo de alegações, os EUA já fizeram saber que modificaram secretamente os lançadores de foguetes HIMARS que foram enviados para a Ucrânia, de forma a impedir que as tropas de Kiev lançassem mísseis de longo alcance para a Rússia.