opinião
Colunista

A transição energética ainda não começou

11 jul 2023, 09:53

É possível o leitor ler o título e perguntar-se “O tema é discutido há anos, como assim, não começou?”.

Vamos olhar para os dados de forma crítica. Ano após ano as nossas emissões globais continuam a aumentar. Ainda nem sequer estabilizámos as emissões de gases de efeito de estufa, quanto mais diminuí-las. Isto porque não temos apostado no objetivo de descarbonizar. Na UE confunde-se o fim com os meios e definem-se metas de instalação de energias renováveis em vez de metas de descarbonização. Muito em parte pressionados pela ideologia Alemã. Descarbonizar é uma finalidade apenas alcançável tendo uma perspectiva holística e agnóstica das tecnologias existentes e saber onde aplicá-las. 

Ouve-se muito falar em descentralização, renováveis serem baratas, que é condição necessária e suficente instalar painéis solares e aerogeradores. Pergunto ao leitor: se é tão simples, porque não existe uma única localidade que o tenha feito? Uma cidade ou até mesmo aldeia que se alimente exclusivamente de sol e vento. Já se tentou na Índia em Dharnai, uma comunidade de 3200 pessoas, com um reduzido consumo elétrico, que prontamente regressou ao carvão. Em Hangares, no distrito de Faro, uma comunidade de 100 habitantes demonstra que a ideia simplesmente não funciona. Mesmo com investimentos avultados para o cidadão médio, a população local ainda consome gás de botija e vive ao ritmo do clima numa comunidade energeticamente pobre.

O solar e o eólico terão sem dúvida uma contribuição significativa na matriz energética, mas nunca foram supostos ser a espinha dorsal de uma sociedade industrializada. É um erro assumir que garantem uma descarbonização profunda devido à necessidade permanente de backup, quase sempre fóssil. E é também um erro assumir que garantem segurança energética e nos livrem de uma vida austera em energia. E estes erros pagam-se caros. A Alemanha gastou até agora 500 mil milhões de euros na sua Energiewende (a sua transição energética) e os resultados estão à vista, com os preços de eletricidade e as emissões de gases de efeito de estufa ambos a aumentar.

Cortesia Mark Nelson, Radiant Energy Group

A negro vemos a intensidade real das emissões carbónicas alemãs e a amarelo as francesas. A cor vermelha representa um cenário em que as centrais nucleares alemãs permanecem abertas e é o carvão que é removido do mix energético em vez do nuclear. As emissões carbónicas alemãs têm vindo a aumentar desde a pandemia, com a abertura de mais minas de carvão e o encerramento das suas últimas centrais nucleares. As baixas emissões da rede francesa devem-se à sua frota nuclear, responsável por 70% da eletricidade produzida no país. O melhor dia Alemão é pelo menos duas vezes pior que o pior dia Francês. A razão entre as intensidades carbónicas da Alemanha e da França chega a atingir factores de 30. Nem o país mais rico da UE consegue atingir o mix 100% sol + vento. Nem mesmo com baterias, que não existem à escala industrial para cobrir os períodos em que o sol não brilha e o vento não sopra.

O resultado do lado industrial também se nota: as indústrias eletrointensivas alemãs têm um índice de produção de 80% em relação a 2015. Um quinto da indústria eletrointensiva alemã desapareceu! Os preços da eletricidade alemã aumentaram de tal modo que a indústria perdeu competitividade. A UE está a sofrer uma desindustrialização tremenda devido à sua ideologia renovável. 

Perde a indústria, perde o cidadão empregos bem pagos, e perde o clima.

O ser humano nunca viveu em harmonia com a natureza. Desde que somos uma espécie agrícola, desde a pré-história, que temos exercido um impacto substancial no meio ambiente. O nosso impacto é mensurável através de registos históricos e fósseis. É impossível voltar ao que nunca foi. O ambientalista do futuro é agnóstico e optimista em relação à tecnologia. Vivemos mais anos, temos mais saúde, temos tempo para nos dedicar a empreendimentos intelectuais. Desejamos vida mais frutíferas aos nossos semelhantes, não condená-los a regressar ao neolítico.

Parafraseando o escritor Leigh Phillips: “O ambientalista moderno reconhece e compreende a verdadeira dimensão do desafio das alterações climáticas. É também por isso que rejeita as ideias da bolha verde da eco-austeridade.”

O autor agradece as discussões que teve e o que aprendeu com o grupo de amigos com quem discute regularmente. Sem eles este texto não teria nascido.

Colunistas

Mais Colunistas

Patrocinados