Supremo Tribunal mantém o agravamento decretado pela Relação. Suspensão da pena está nas mãos do tribunal de primeira instância
O Supremo Tribunal de Justiça confirmou esta quinta-feira a pena de oito anos de prisão efetiva aplicada a Ricardo Salgado por três crimes de abuso de confiança referentes à apropriação ilícita de 10 milhões de euros, no âmbito do processo extraído da operação Marquês.
A CNN Portugal teve acesso ao acórdão, que, no entanto, abre a possibilidade à suspensão da pena face à situação clínica do antigo patrão do BES, diagnosticado com a doença de Alzheimer.
Em acórdão proferido esta quinta-feira, o Supremo Tribunal rejeitou o recurso de Ricardo Salgado contra a condenação a oito anos de prisão por crimes de abuso de confiança no processo Operação Marquês, mas exige que haja a "aferição do estado e gravidade da evolução da doença e a capacidade de compreensão" pelo arguido "do sentido e finalidade da pena", para "eventual aplicação (ou não) da suspensão da execução" da pena a que foi condenado.
"Não cremos que se deva concluir do texto da norma que a competência para a suspensão da execução da pena deva ser aferida apenas ou necessariamente apenas pelo Tribunal de Execução de Penas mas, antes, nada impede dos textos legais vigentes que a sua avaliação seja ou possa ser efetuada desde o momento em que seja possível e justificado, o que poderá ocorrer bem antes do início de execução da pena", refere o acórdão que teve como relator o conselheiro Agostinho Torres.
Ou seja, o Supremo Tribunal deixa agora nas mãos do tribunal de primeira instância a decisão de suspender ou não o cumprimento da pena por razões de doença do arguido
Recorde-se que Ricardo Salgado fora condenado a seis anos de prisão na primeira instância, mas a Relação agravou para oito, numa pena que agora o Supremo mantém.
O Supremo afasta ainda a hipótese de reclamação desta pena - fazendo com que a mesma transite já em julgado nas próximas semanas, a menos que a defesa do ex-banqueiro recorra para o Tribunal Constitucional.
Resulta assim deste acórdão, que terá de haver uma nova aferição ou avaliação médica prévia ao estado de saúde do arguido para o tribunal de primeira instância verificar se o arguido Ricardo Salgado tem ou não condições de compreender a pena, se tem ou não condições de cumpri-la e se faz algum sentido cumpri-la.
"Se a incapacidade de compreensão, entendimento e adaptação ao sentido e finalidade da pena fosse já de tal modo grave que não colocasse dúvidas relevantes, também não vemos impossibilidade legal direta e decisiva no sentido de declaração suspensiva (...) mesmo antes da fase de execução propriamente dita" da pena, refere o acórdão.
O acórdão reforça ainda que "numa situação clínica em que seja evidente, indubitável, seguro e convincente a inapropriedade de aplicação da pena de prisão, face à doença indicada (ou outro tipo qualquer de anomalia psíquica superveniente ao crime) seria de todo injustificável e desumano sujeitar o condenado (neste caso Ricardo Salgado) à execução da pena ou mesmo a iniciá-la para depois a suspender".
Condenado em março de 2022 a uma pena única de seis anos de prisão por três crimes de abuso de confiança, Ricardo Salgado viu a Relação de Lisboa agravar em maio de 2023 a pena para oito anos e recorreu para o STJ que, agora, apesar do indeferimento quanto à pena, impôs a aferição prévia do seu estado de saúde antes de poder cumprir pena.