Num país com mínimo acesso à Internet, a Bitcoin tornou-se moeda oficial (e a Rússia pode ser uma das razões)

28 abr 2022, 23:00
Bitcoin. Chesnot/Getty Images

República Centro-Africana adotou a Bitcoin como moeda oficial. O país enfrenta, há vários anos, uma guerra civil, onde o governo conta com o apoio de forças russas. Dado o contexto de guerra na Ucrânia, há analistas que veem esta decisão como uma porta aberta para a lavagem de dinheiro russo

A República Centro-Africana (RCA) tornou-se no segundo país do mundo a adotar a Bitcoin como moeda oficial. No país, segundo os estudos disponíveis, apenas 4 a 11% da população tem acesso à Internet, a ferramenta fundamental para negociar esta moeda virtual.

A presidência da RCA defende que esta decisão irá colocar o país “no mapa dos países mais ousados e visionários do mundo”, facilitando a captação de investimento. Contudo, a decisão está a gerar críticas dentro e fora de portas.

Em setembro passado, quando El Salvador se tornou o primeiro país do mundo a adotar a Bitcoin como moeda oficial, foi alvo de fortes reparos, pelos riscos de que seja utilizada como uma forma de lavagem de dinheiro. Uma das críticas veio do próprio Fundo Monetário Internacional, avisando que ter esta criptomoeda como moeda oficial aumentava o risco de instabilidade financeira.

O fator Rússia

No caso da RCA, há um receio adicional, chamado Rússia. Desde 2013 que a RCA está mergulhada numa guerra civil, tendo mercenários russos do Grupo Wagner do lado do governo na luta contra as forças rebeldes.

Ora, a Rússia pode encontrar na Bitcoin uma forma de contornar o bloqueio à sua economia após as sanções ocidentais ditadas pela invasão da Ucrânia – entre elas, o congelamento de contas associadas a empresas e oligarcas russos. A posição é defendida por diferentes especialistas citados pela imprensa internacional.

“ O contexto, dada a corrupção sistémica e um parceiro russo que enfrenta sanções internacionais, encoraja essa suspeita", posiciona o analista francês Thierry Vircoulon à agência AFP. E a reduzida taxa de penetração da Internet nos lares da RCA só vem acentuar estes receios.

A classificação da Bitcoin como moeda oficial é também encarada como parte de um movimento de rejeição à outra moeda usada, o franco CFA, encarado como uma herança do domínio colonial francês em vários países africanos que ainda o utilizam.

Avisos a quem investe

Ao câmbio atual, uma Bitcoin corresponde a 37.793,21 euros. Já um euro corresponde a 653,36 francos CFA. Assim, apenas uma Bitcoin corresponde a mais de 24,7 milhões de francos CFA.

Vários reguladores bancários têm alertado para os riscos das criptomoedas e dos ativos virtuais. O Banco de Portugal, por exemplo, tem deixado vários avisos sobre o tema. Apesar de a Bitcoin não ser ilegal ou proibida, o supervisor bancário alerta que não existem garantias para quem nela investe: não existe qualquer fundo que permita compensar as perdas no caso de uma forte desvalorização. O Banco de Portugal reconhece ainda que estas moedas virtuais poderão ter utilizações indevidas, ligadas ao mundo do crime, “incluindo de branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo”.

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