Nunca foi tão fácil aos russos contornarem as sanções financeiras. Como assim? Bitcoin

Por Allison Morrow, CNN Business
25 fev 2022, 20:35
Vladimir Putin

Nova Iorque (CNN Business) A primeira rajada de sanções financeiras do Ocidente contra a Rússia foi incapaz de impedir o presidente Vladimir Putin de lançar uma invasão da Ucrânia em grande escala. Agora os Estados Unidos estão a adotar uma abordagem sancionatória, anunciando um novo conjunto de sanções destinadas a fazer pressão sobre bancos russos e “bilionários corruptos”.

Mas alguns especialistas dizem que essas medidas, que até agora não visam o próprio Putin, estão a tornar-se cada vez mais fáceis de contornar, graças em parte a uma onda de adesão às criptomoedas na Rússia.

As sanções dos EUA e da UE dependem fortemente dos bancos para imporem as regras. Se uma empresa ou indivíduo alvo de sanções quiser fazer uma transação em unidades monetárias tradicionais, como dólares ou euros, o banco tem a responsabilidade de sinalizar e bloquear essas transações.

Mas as moedas digitais operam fora da esfera global de sistemas bancários convencionais, com as transações a serem registadas num livro-razão público conhecido como blockchain.

“Se os russos decidirem - e estou certo de que já o estão a fazer - não utilizar qualquer moeda que não seja uma criptomoeda, eles podem evitar de forma eficaz praticamente todas as sanções”, disse Ross S. Delston, especialista em normas de conformidade contra o branqueamento de capitais.

O Tesouro dos EUA está bem ciente deste problema. Num relatório de outubro, as autoridades alertaram que as moedas digitais “reduzem potencialmente a eficácia das sanções americanas” ao permitir que agentes mal-intencionados detenham e transfiram fundos para fora do sistema financeiro tradicional. “Estamos conscientes do risco que estes ativos digitais e sistemas de pagamentos, se não forem controlados, podem representar ao nível da eficácia das nossas sanções.”

Tomemos como exemplo a Europa de Leste, que tem uma das maiores taxas de volume de transações de criptomoedas associadas a atividades criminosas, de acordo com uma investigação da Chainalysis. Os sites usados para negócios ilícitos conhecidos como mercados de darknet geraram um recorde de 1,7 mil milhões de dólares em criptomoedas em 2020, a maior parte em Bitcoin.

E quase todo o crescimento no mercado de darknet nesse ano pode ser atribuído a um mercado específico de língua russa chamado Hydra. A Hydra é “de longe o maior mercado de darknet do mundo, representando mais de 75% da receita do mercado de darknet em todo o mundo em 2020”, escreveu a Chainalysis num relatório no início deste mês.

Claro que escapar às sanções não é tão simples como despejar em Bitcoin todos os fundos que se tenha em dólares. É difícil comprar qualquer coisa com criptomoedas, especialmente coisas grandes, diz Delston.

Os alimentos, por exemplo, que historicamente a Rússia sempre importou.

“Um exportador de alimentos algures no mundo vai aceitar criptomoedas cujo valor varia todos os dias, e a toda a hora, ou vão querer a divisa de reserva mundial, os dólares americanos?”

Outro problema é o comércio de petróleo, que representa uma grande parte da economia da Rússia e está indexado aos dólares americanos. Para usar uma criptomoeda para comprar seja o que for, é necessário ter uma via de saída para uma moeda emitida por um governo, como o dólar, diz Delston.

“Não é uma solução perfeita para os oligarcas russos”, porque a Bitcoin e outras criptomoedas podem ser seguidas na blockchain. Por causa da blockchain, é mais difícil, ainda que não seja impossível, branquear esses capitais.

Existem outras formas através das quais a Rússia poderia, pelo menos em teoria, mitigar o peso das sanções, pondo em prática um truque já usado pelo Irão.

Tal como a Rússia, o Irão é um país exportador de petróleo e permanece há décadas sob um embargo económico quase total por parte dos EUA, incluindo restrições a todas as importações e sanções a instituições financeiras iranianas.

Mas mesmo sendo um estado pária, o Irão descobriu uma forma de contornar uma parte das sanções recorrendo à mineração de Bitcoin, de acordo com um relatório da empresa de análise Elliptic.

O Irão tem um excedente energético que não pode exportar, então está a usá-lo para alimentar a mineração de Bitcoin, que consome enormes quantidades de eletricidade, mas compensa os mineradores com pagamentos em Bitcoin.

“O processo de mineração converte efetivamente energia em criptomoeda”, escreve Tom Robinson, cofundador da Elliptic. “Os mineradores do Irão são pagos diretamente em Bitcoin, que pode ser usado para pagar produtos importados” – algo que a Elliptic afirma ter-se tornado quase uma política oficial dentro do governo iraniano.

A Elliptic estima que os mineradores do Irão são responsáveis por aproximadamente 4,5% de toda a mineração de Bitcoin, o que se traduziria numa receita anual de cerca de mil milhões de dólares.

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