Máscaras prejudicam relação entre psicólogo e paciente. Faz sentido manter a obrigatoriedade nas consultas?

7 mai 2022, 18:00
Máscaras

As máscaras são "um entrave" ao estabelecimento de uma relação com o paciente e dificultam a interpretação das emoções, dizem os psicólogos. Está na hora de deixar cair a máscara nestas consultas?

A máscara de proteção contra a covid-19 continua a ser obrigatória nos transportes públicos e “em locais frequentados por pessoas especialmente vulneráveis” - como lares ou Estruturas Residenciais Para Pessoas Idosas (ERPI), assim como nos estabelecimentos e serviços de saúde (incluindo farmácias). Isto significa que nos serviços e consultas de psicologia continua a usar-se máscara. Mas será realmente necessário manter a máscara nestes casos? Será o risco de transmissão da doença neste contexto tão elevado que compense os efeitos negativos do uso da máscara numa terapia? 

"Na psicoterapia nós trabalhamos as emoções e as máscaras são entraves ao estabelecimento de uma relação com o paciente porque permite camuflar emoções. Costuma-se dizer que os olhos dizem tudo, mas não é verdade. Os olhos dizem muito, mas dizem-no no conjunto com o resto da face", explica Margarida Mendes, psicóloga do Hospital Lusíadas Amadora, à CNN Portugal.

"Para mim é muito importante toda a linguagem e toda a informação não verbal. A pessoa verbaliza muito menos do que aquilo que transmite. Portanto, sim, estamos a ser prejudicados", concorda Marta Martins Leite, psicóloga nas Clínicas Leite. "Há muita informação que se perde com a máscara. Perde-se em quantidade (porque a máscara perturba a audição) e perde-se em qualidade." Esta terapeuta chama a atenção, em particular, para as consequências nas crianças - "a terapia da fala, por exemplo, foi bastante afetada".

No entanto, se é claro para estas profissionais que o uso de máscara no contexto das consultas e tratamentos de psicologia é bastante prejudicial, ambas admitem que o levantamento da obrigatoriedade não poderá ser feito de forma cega.

"Antes de mais, temos de ter em conta a preocupação com a saúde pública. Os números da covid-19 diminuíram, mas ainda há uma pandemia e temos de continuar a fazer um esforço, todos nós, sobretudo por causa de todos os profissionais de saúde que estão exaustos após estes dois anos. E nós não podemos pôr isso em causa", alerta a psicóloga Marta Martins Leite.

"Temos de avaliar sempre o contexto. No contexto hospitalar o risco é muito mais elevado, porque os profissionais circulam entre serviços e estão em contacto com muitos doentes diferentes. Nos consultórios ou clínicas especializadas há menos circulação de pessoas e, geralmente, há também possibilidade de manter um maior distanciamento. Portanto, é preciso avaliar cada situação", afirma Margarida Mendes.

"Mas isso leva-nos a outra questão, sublinha Marta Martins Leite. "Existe uma regulamentação própria para gabinetes médicos definida pela Entidade Reguladora da Saúde. O mesmo princípio deveria ser aplicado a consultório de psicologia, quer privados, quer entidades públicas."

Finalmente, diz Margarida Mendes, "também é preciso perceber que cada pessoa é diferente". "A pessoa sente-se mais confortável com ou sem máscara? Há, na verdade, muitas pessoas que não querem ou não conseguem tirar a máscara. Durante estes dois anos, as máscaras serviram não só para nos protegermos da doença, mas também como escudo protetor para quem não quer revelar as suas emoções ou quem tem baixa auto-estima."

O debate acontece entre os profissinais, admitem estas especialistas. Mas o uso obrigatório de máscara não foi ainda debatido pela Ordem dos Psicólogos. "Ninguém levantou essa questão até agora", garante à CNN Portugal Renata Benavente, vice-presidente da Ordem. 

"Sabemos que as máscaras colocam constrangimentos à comunicação e impedem o psicólogo de ter acesso à expressão facial dos pacientes, o que é muito importante, porque através da face nós interpretamos o humor e as emoções das pessoas. Além de que nos impede de fazer a leitura dos lábios, no caso das pessoas que têm problemas de dicção", admite Renata Benavente. "No entanto, sabemos que, nesta altura, temos de cumprir as orientações da DGS porque trabalhamos com pessoas que podem estar numa situação vulnerável ou trabalhamos em contextos vulneráveis", conclui, reconhecendo que, "embora esta não seja a situação ideal", "há necessidade de estarmos protegidos e de proteger os outros".

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